Os sócios fundadores da Welbe Care: os brasileiros Marcus Paiva (à esquerda) e Eduardo Medeiros (Welbe Care/Divulgação)
Graziella Valenti
Publicado em 13 de dezembro de 2022 às 07h56.
Última atualização em 13 de dezembro de 2022 às 08h19.
Na era digital, da telemedicina, o maior desafio do setor de saúde — e global — é a integração dos dados da população. Alcançar esse objetivo é uma provocação para os empreendedores da inovação de todo o mundo, como um quebra-cabeças com peças espalhadas em diferentes caixas. É justamente por isso que uma startup, fundada pela dupla de brasileiros Eduardo Medeiros e Marcus Paiva, só que no México, atraiu recursos de lá, daqui e além. A Welbe Care acaba de levantar R$ 25 milhões em uma rodada de capital semente, em um aporte liderado pela gestora brasileira Volpe Capital, seguido pela mexicana Nazca, e mais os fundos brasileiros dedicados a healthtechs Kortex, que tem Bradesco Seguros e Fleury entre os patrocinadores, e GreenRock, e ainda o SVLC, com sede no Vale do Silício. Para as três gestoras de capital de risco brasileiras foi o primeiro aporte internacional.
A Welbe não reúne os dados de uma nação, mas consegue gerir, organizar e medir 'populações corporativas'. Medeiros se deu conta da oportunidade quando a empresa em que estava, uma das grandes varejistas mexicanas, queria organizar o trabalho de seus funcionários na pandemia e precisava de um mapeamento da saúde deles, conforme os grupos de risco. A companhia não tinha nenhuma ferramente para isso. Pior: fazer o levantamento, para dezenas de milhares de pessoas, poderia ser um esforço custoso e demorar meses. A deficiência de dados ficou evidente.
Foi então que Medeiros se uniu a Paiva para juntos e muito rapidamente desenvolverem uma plataforma para o setor de Recursos Humanos das companhias, com três frentes de acessos separados, mas integradas: uma para as vidas atendidas (funcionários), outra para o setor de saúde (médicos, clínicas e laboratórios) e, obviamente, também a das companhias clientes. O objetivo é que todos saiam ganhando. Os dois se conheceram na fundação da ClickBus, quando foram chamados pela gestora Rocket, para desenvolver novos mercados. Medeiros ficou com a parte das Américas e Paiva, com a Ásia.
"Funcionamos como um agregador. Nós não tocamos nos pacientes. Quem faz isso são os profissionais de saúde. Somos um booster para o setor", afirma Medeiros. Esse é o tal do conceito full service. A Welbe oferece os médicos e laboratórios em regime de parceria, com seus horários disponíveis, centraliza os pagamentos e a organização dos dados para cada público aproveitá-los, com a devida privacidade, da melhor forma possível.
Algumas características do mercado mexicano, que os sócios conhecem por morarem lá há anos, tornaram a largada da empreitada mais economicamente racional. Agora, com a máquina montada, ficará muito mais fácil pensar em aplicações fora do México, para uma dor (a integração) que é global.
Mas que fique claro: o objetivo da rodada atual é fortalecer a operação local e terminar 2023 com 200 mil vidas sob cuidados. A Welbe fez uma rodada pré-seed de cerca de R$ 15 milhões em junho do ano passado, liderada pela Nazca, que agora voltou a investir. No total, portanto, já levantou perto de R$ 40 milhões. "Na época, a gente não tinha nada, só um power point", lembra Medeiros.
Hoje, apenas 18 meses depois, a startup não abre o total de usuários, mas conta que são mais de 200 clientes (as empresas), com nomes como Henkel, RedBull, Engie e Enel, entre outras. Os alvos são médias e grandes corporações. Os investidores têm bem mapeado o potencial para México e mais. Paiva explica que seria possível expandir, por exemplo, para o Brasil, mantendo as mesmas bases de custo e despesa em aproximadamente 80%. A companhia, que começou a operar efetivamente em janeiro deste ano, já tem inclusive escritório em São Paulo. "No Brasil, iremos por etapas, funcionando primeiro como software", explica Paiva.
O México tem duas características essenciais diferentes do Brasil que foram importantes para a Welbe: lá, não existe o Sistema Único de Saúde (SUS), com atendimento gratuito, e os planos de saúde, quando contratados, não cobrem a rotina, só emergências e casos mais complexos. Dessa forma, o cuidado com a saúde dos funcionários com os exames períodos obrigatórios das empresas têm um valor mais significativo, já que qualquer consulta ou teste mais rotineiro são pagos pela população. Só que isso não quer dizer falta de oportunidades por aqui. "Só 25% da população brasileira tem convênio médico", diz Paiva.
Pelo aplicativo da Welbe, os funcionários das empresas podem fazer um número programado de consultas e exames e um check-up anual. O serviço claramente se transforma em um benefício. Cada médico pode fazer o encaminhamento necessário. Todos os dados, desde o motivo do atendimento até os resultados dos exames, ficam dentro da plataforma, com acesso para médicos e pacientes. Já a empresa recebe o mapeamento, um agregado com inúmeros dados sobre saúde e riscos de sua base de funcionários, com toda proteção dos dados particulares.
A ferramenta tem várias camadas de profundidade e cada companhia pode customizar o tanto de serviços que quer ter acesso, com preços diferentes. "Digitalizamos toda uma burocracia e cumprimento de serviços normativos para as companhias", enfatiza Medeiros. Quase em jogral, Paiva completa que, na média, 82% da base de funcionários realizam o acompanhamento médico já na primeira semana de adesão. O mapeamento não é apenas de resultados dos funcionários, mas também da saúde da família, dependentes, cônjuges e de riscos hereditários, com pais e irmãos.
Os sócios contam que, mesmo em pouco tempo de operação, já ficou claro o ganho para todos os públicos. Houve casos de clientes que melhoraram a sinistralidade dos planos de saúde oferecidos, gerando economia de recursos, e até mudança de procedimento de trabalho, para redução de acidentes. Já para os funcionários, há muitos casos de detecção de problemas crônicos de saúde desconhecidos, como diabetes e hipertensão.
A Welbe tem várias avenidas de crescimento, para além da pretendida expansão da operação no México e potencialmente em outros países. A companhia pode ampliar parcerias que sejam funcionais para os objetivos ligados à saúde das “populações” atendidas. "Por que não colocar um market-place de comida saudável para quem tem problemas com obesidade", exemplifica Marcus. O dinheiro novo chega justamente para tornar mais robusta a tecnologia da startup, ampliar as soluções oferecidas e, claro, acelerar vendas.