Tony Volpon, ex-diretor do BC: "Tecnicamente, é uma decisão correta e também se alinha à lógica política de ter uma economia forte no ano eleitoral" (WHG/Divulgação)
Repórter
Publicado em 22 de agosto de 2024 às 11h36.
Última atualização em 22 de agosto de 2024 às 15h45.
Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central e professor da Universidade de Georgetown, vê motivos "sólidos" para o Comitê de Política Monetária (Copom) voltar a subir a taxa Selic na próxima reunião, em setembro.
Em entrevista à EXAME, o economista afirma que as justificativas para a alta de juros passam pela valorização do dólar, que chegou a subir 18% no ano, e pela falta de credibilidade dos diretores indicados pelo atual governo.
A divisão na decisão de maio, em que a nova ala de diretores votou por uma queda de juros mais agressiva diante do aumento dos riscos inflacionários, "foi um erro", segundo Volpon, e o discurso mais duro que o BC vem adotando seria uma forma de "corrigir" isso.
O Banco Central vai subir juros na próxima reunião do Copom?
Os argumentos para aumentar os juros são sólidos. As expectativas estavam desancoradas em todos os prazos, a economia operando claramente acima do potencial e o câmbio depreciando, além de haver um déficit primário estrutural e uma incerteza sobre a credibilidade do Banco Central. E a inflação corrente está no topo da banda.
Então, a probabilidade de atingir a meta em seis trimestres é muito pequena. Todos os indicadores sugerem que continuaremos com a inflação em um patamar elevado, com poucos elementos forçando a convergência.
Se a taxa de juros fosse alta o suficiente, teríamos expectativas ancoradas, um câmbio mais apreciado e a economia desacelerando, convergindo para o potencial.
O mercado já vinha precificando alguma chance de os juros voltarem a subir, mas a discussão ganhou nova proporção em agosto. O que mudou?
O aumento de juros estava precificado na curva, mas não no Focus, porque o discurso do BC era de manter os juros no patamar atual. Porém, a comunicação mudou a partir da ata do Copom.
Agora, o Galípolo tem feito várias intervenções, assumindo uma postura conservadora, afirmando que “a alta de juros está na mesa” e que ele não está constrangido pelo governo.
Essa mudança de postura fez o "gato subir no telhado" em relação à alta de juros já na próxima reunião. O mercado está lentamente se posicionando, embora ainda haja sensibilidade aos dados.
A provável queda de juros em setembro nos Estados Unidos pode impedir a alta no Brasil?
Muitos esperam que o corte de juros pelo Fed, também precificado para setembro, ajude na apreciação do câmbio, evitando a necessidade de uma alta de juros pelo BC.
No entanto, esse raciocínio é equivocado. O câmbio só apreciou devido à possibilidade de alta de juros. Se o BC não entregar essa alta, o câmbio vai depreciar, talvez não para R$ 5,70, mas voltaremos a ter uma perspectiva muito pequena de atingir a meta de inflação.
A postura mais dura de Galípolo é uma tentativa de conquistar a confiança do mercado?
Galípolo sabe que será presidente do BC, não é segredo. Ele vê uma oportunidade de se firmar como alguém comprometido com a meta de inflação.
Então, quer aproveitar o momento em que o cenário para subir os juros é claro para enviar uma mensagem ao mercado de que é uma pessoa séria.
Isso é muito bom para ele e sua gestão. Tendo credibilidade, será muito mais fácil para ele, quando esses fatores reverterem, permitir a queda dos juros.
E como fica a questão política?
Pensando na reeleição [de Lula], o importante é agir em 2025 para impactar 2026. Tecnicamente, é uma decisão correta e também se alinha à lógica política de ter uma economia forte no ano eleitoral.
O eleitor tem memória curta. É preciso agir agora para ter uma ferramenta anticíclica em 2025 que ajude em 2026.
Seria inteligente da parte deles ganhar credibilidade agora, eliminar a falta de confiança em Galípolo, e permitir que, a partir de um patamar mais alto, o ciclo de queda de juros seja reiniciado em 2025.
Se ele não conquistar essa credibilidade e tentar fazer algo em 2025, pode ocorrer o mesmo que aconteceu com Alexandre Tombini [presidente do BC entre 2011 e 2016]: ele reduziu demais os juros e o resultado foi uma inflação maior.
Para que a queda de juros tenha mais impacto na atividade do que na inflação, é preciso ter credibilidade.
Galípolo foi um dos diretores indicados por Lula que, em maio, foi contra a maioria do Copom e votou por um corte mais agressivo. O que fez ele mudar de postura?
Em parte, ele está fazendo isso para corrigir o erro de maio, que foi um erro. Com exceção de maio, ele sempre votou com o Copom, elogiando Roberto Campos Neto, tentando adotar um discurso mais ortodoxo.
Só que isso não estava funcionando e ainda teve o mês de maio. Vale lembrar que maio foi um dos fatores que ajudaram o câmbio a chegar em R$ 5,70.
O câmbio em R$ 5,70 assustou o BC e, com os outros fatores, a decisão foi: ou fazemos algo ou teremos uma inflação bem mais alta nos próximos trimestres.
Acredito que estão fazendo a escolha certa de eliminar essa dúvida. Sabemos que inflação não é algo popular. Então, decidiram adotar uma postura claramente hawkish e ganhar a credibilidade do mercado.
Com credibilidade e uma inflação menor em 2025, fazendo esse movimento agora, será possível reduzir os juros. Essa é a mágica da política monetária: o mesmo tipo de ação tem efeitos distintos sobre a atividade e a inflação.
Quanto à magnitude da alta de juros, algumas casas falam em 12%. Isso é factível?
É por aí, não pode ser 0,25% e parar. Tecnicamente, é preciso olhar para os modelos e fazer o necessário para gerar uma margem de confiança de que de fato atingirá a meta. O pessoal que está vindo com esses números está fazendo esse tipo de exercício.
O Focus desta semana revisou para baixo o IPCA de 2025, de 3,97% para 3,91%. É um sinal de que o BC está ganhando credibilidade?
Sim. O primeiro efeito é no câmbio. Nessas últimas semanas, o real tem performado melhor que seus pares emergentes. O spread em relação a uma cesta de moedas emergentes é claramente uma expressão desse novo discurso vindo do Galípolo, impactando positivamente o câmbio.
O Focus sempre está atrasado por natureza. O economista é avesso ao risco, vê o movimento acontecer e depois entra. Não gosta de antecipar nem ficar sozinho, gostam de ir em grupo. Então, agora, começamos a ver os efeitos [desse novo cenário] no Focus.