Julio Brito, CEO da Swile Brasil: ambição é grande e empresa está disposta a acelerar no país em ritmo superior ao das metas estabelecidas por sócios (Swile/Divulgação)
Karina Souza
Publicado em 13 de janeiro de 2023 às 09h01.
Última atualização em 13 de janeiro de 2023 às 22h03.
O mundo dos benefícios está mudando — e cada vez mais se transforma em uma ‘mina de ouro’ para startups interessadas em explorá-lo. Com o decreto 10.854, que entra em vigor neste ano e prevê, entre outras coisas, o fim do ‘rebate’, o mercado se abre cada vez mais para players novos no setor, dando continuidade às mudanças na CLT desde 2017 que permitiram a novas empresas entrarem nesse segmento. Empresas brasileiras, como a Flash Benefícios e Caju já são nomes conhecidos no mercado, mas a oportunidade é tanta que até mesmo quem vem de fora do país quer seu quinhão por aqui. Exemplo disso está na francesa Swile, primeiro centauro (startup que chegou ao faturamento de US$ 100 milhões) do setor de benefícios no mundo. Com sócios de peso, como Softbank e Eurazeo, a empresa está no país desde 2021, ano em que comprou a brasileira Vee para viabilizar sua entrada no país. Desde então, conquista resultados ano após ano: triplicou de tamanho em 2022, somando 400 mil usuários por aqui, e pretende chegar a um milhão já no fim de 2023. Entre os clientes, estão grandes empresas de diferentes setores, como Ambev, Fiat e Whirlpool.
O porte por aqui pode parecer tímido, mas é necessário lembrar que, no Brasil, cerca de 16 milhões de trabalhadores CLT recebem algum tipo de auxílio alimentação, em um mercado de receita anual de R$ 150 bilhões. Para referência, em 2020, a Alelo atendia 8 milhões de usuários em mais de 100 mil empresas clientes. As quatro gigantes do setor (VR, Ticket Restaurantes, Sodexo e Alelo), juntas, dominam mais de 80% desse segmento.
Para a Swile, mais do que tirar mercado das grandes empresas, o cenário atual abre espaço para permitir que mais companhias possam oferecer benefícios variados aos seus colaboradores. O universo todo de empregados que poderiam receber benefícios é de 40 milhões de pessoas, nas estimativas da empresa. “Tem uma oportunidade enorme no mercado, não só de rouba-monte, mas também de levar uma mensagem de muito mais facilidade, de que podemos ser parceiros do RH e também colaborar para trazer mais felicidade ao dia a dia do trabalhador”, diz Julio Brito, general manager da empresa, ao EXAME IN.
A possibilidade de começar com uma porcentagem pequena desse 'bolo' não amedronta a startup. Ao contrário. Os resultados obtidos na França motivam a companhia a seguir uma trajetória de crescimento por aqui.
Fundada há cinco anos por Loïc Soubeyrand, que já acompanhava o mercado de benefícios de perto (a França é o segundo maior no segmento globalmente, ficando atrás somente do Brasil), a startup viu o negócio crescer de vez durante a pandemia. A razão é clara, ainda que bastante distante da realidade daqui: por lá, a maior parte dos pagamentos desse benefício ainda é feita via papel — hoje, o total de trabalhadores que ainda recebe um voucher desse tipo corresponde a 40% do mercado local. Isso se tornou um problema e tanto na época dos lockdowns, em que colaboradores não conseguiam usar o benefício nas poucas saídas de casa e ainda enfrentavam contratempos, por exemplo, a forma como era feita o ‘troco’, caso o gasto em um estabelecimento não compreendesse o valor todo de cada folha do tíquete.
Nesse cenário, caiu como uma luva a solução da Swile. Totalmente digital, a companhia começou a conquistar contas importantes, como Spotify, Carrefour, Red Bull e Le Monde e evoluiu na própria oferta, sendo uma das pioneiras no uso de pagamentos por NFC. O modelo de negócio é bastante similar ao das novas empresas brasileiras dedicadas a esse mercado: em vez de ganhar dinheiro com antecipação de recebíveis (como fazem as empresas tradicionais), elas lucram ao terem contratos com bandeiras de cartões e ganham receita com a bandeira repassando uma porcentagem correspondente a cada transação realizada no cartão. Hoje, a bandeira com que a startup francesa tem contrato é a Mastercard.
Essa lógica funciona, na prática, porque há um universo muito maior de estabelecimentos a ser explorado. "A empresa líder no mercado tradicional tem 300 mil estabelecimentos afiliados que aceitam o cartão dela. Ao optar por um cartão Master, são mais de quatro milhões de locais que aceitam o cartão", diz Brito. Além disso, ao optar por um cartão de crédito, a companhia ganha a 'simpatia' de restaurantes, que estão sujeitos a taxas menores cobradas pelas adquirentes na comparação com as cobradas por empresas de benefícios tradicionais (que variam de 5% a 8%).
A estratégia já provou que dá certo: na França, mercado em que está presente há mais tempo, a Swile soma 5,1 milhões de usuários e 81 mil clientes corporativos. Dada a percepção da facilidade que conseguia gerar para as empresas clientes, a startup buscou alçar ‘voos maiores’ fora da região. Da pesquisa de mercado, veio o insight relacionado ao mercado brasileiro. A presença consolidada de concorrentes franceses, como a Edenred, por aqui, ajudou a consolidar a importância de que seria necessário trazer o produto para o país latino-americano.
Desde que chegou, a Swile mantém o pé no acelerador. A companhia dobrou o número de funcionários ao longo do último ano, totalizando 200 por aqui em uma lógica que acompanha o crescimento de receita: a empresa triplicou de tamanho em relação ao seu primeiro ano de operação no Brasil, com 6.000 empresas atendidas e 400 mil usuários. Ao todo, a empresa tem 1.000 colaboradores. E, ao que tudo indica, as contratações devem continuar, acompanhando o apetite da empresa para crescer.
Hoje, a Swile já disponibiliza sete categorias de benefícios: alimentação, refeição, mobilidade, premiação, saúde, home-office e por aí vai. Em breve, a companhia deve trazer mais opções para o mercado brasileiro, inspiradas no que já oferece no mercado francês. Brito não entrega exatamente o que será o novo produto, mas afirma que a divisão local já está trabalhando na adaptação desse novo benefício, lidando com questões como tradução, usabilidade dos brasileiros e moeda.
Para ganhar cada vez mais corpo e escala para atender aos dois mercados, a empresa finalizou recentemente a aquisição da Bimpli, empresa tradicional do setor que concentra 20% do mercado local francês de benefícios. Com a compra, o BPCE, segundo maior grupo bancário da França, fica hoje com 22% da startup.
O valor da transação não foi revelado. "Essa união de forças vai ser importantíssima para alavancar muito mais negócios lá e no Brasil, porque vamos ganhar um porte diferente, o que afeta tanto o apetite por investimentos quanto a segurança para futuros clientes. Hoje, já temos uma estrutura de capital extremamente sólida em um momento de fragilidade para startups”, diz Brito.
Desenvolver e adaptar as soluções da empresa adquirida deve ocupar praticamente todo o ano da Swile, o que faz com que a empresa — em meio ao momento amargo para captações — não esteja pensando em uma nova rodada. Lembrando que, além da transação concluída neste ano, a empresa captou, no fim de 2021, outros US$ 200 milhões com o Softbank. “Deixa a gente fechar essa integração, concluir os projetos que temos no Brasil. Isso deve ficar para depois”, diz o CEO da divisão brasileira. O mundo dos benefícios está ficando cada vez mais interessante e, em meio à batalha pela melhor experiência dentro do setor, quem ganha são os RHs e trabalhadores. A disputa está só começando.