Floresta da Suzano: fortalecimento da temática ESG também ajudaria na captação de recursos (Divulgação/Divulgação)
Graziella Valenti
Publicado em 4 de agosto de 2020 às 13h51.
A Suzano poderia captar dinheiro com uma oferta primária de ações, reduzir sua alavancagem financeira e mais rapidamente retomar sua capacidade de investir em aumento de capacidade. Essa é a percepção de parte dos investidores da companhia. Há uma combinação de motivos, na visão do mercado, que poderia levar a empresa a aproveitar a liquidez e o momento. A companhia está avaliada em 58,5 bilhões na B3. A despeito de muitos entenderem que este não é o preço ideal (pois julgam que o potencial de valorização ainda é elevado), uma oferta seria bem recebida e encontraria demanda.
No tão aclamado indicador valor de empresa (enterprise value), que é a soma do valor de mercado mais a dívida líquida, a Suzano totaliza 124 bilhões. Só que, deste montante, mais da metade está no endividamento. No mundo das finanças, isso significa que a companhia, neste momento, gera mais valor aos credores do que aos acionistas. Como parte dos compromissos financeiros do negócio são em dólar, essa composição ficou afetada pela puxada na moeda. Daí o entendimento de que uma captação em ações poderia reequilibrar a estrutura de capital dessa fotografia.
Conforme o EXAME IN apurou, porém, não há nenhum movimento concreto da empresa nesse sentido agora. Já, no mercado de dívida, a coisa é diferente: não são descartadas emissões que possam ser usadas para recompra de papéis de mais curto prazo. Guardar dinheiro por guardar nem a Suzano nem nenhuma companhia quer nesse momento em que a remuneração dos recursos é tão baixa, com as taxas comprimidas de juros no Brasil e no mundo.
A discussão sobre a Suzano levantar ou não dinheiro novo está em voga porque o BNDES retomou sua agenda de desinvestimentos e a participação na empresa, de 11% no capital, é uma das pretensões de venda. Como se trata de uma posição equivalente a 6,4 bilhões de reais a preços de mercado, a expectativa é que o banco poderia organizar uma oferta de ações — trata-se de uma fatia não tão grande para repartir em fases, nem tão pequena para ‘passar’ por meio de um block trade direto na bolsa, considerando a liquidez dos papéis.
Diante de uma eventual necessidade de um road show e todo o trabalho envolvido em uma oferta, os investidores acreditam que poderia ser feita uma captação primária ao mesmo tempo — embora isso elevaria o total de ações da Suzano a ser absorvido pelo mercado de uma só vez. Mesmo assim: há uma lista de incentivos, na avaliação de investidores importantes, para a Suzano voltar a investir, seja em capacidade, seja em novas tecnologias e pesquisas para a celulose.
A companhia encerrou março com uma dívida bruta de 75,8 bilhões de reais e uma posição de caixa de 9,7 bilhões de reais. Neste ano, os vencimentos somam 6,3 bilhões de reais, conforme balanço de março. A relação entre a dívida líquida e o Ebitda da companhia, acumulado em 12 meses, terminou o primeiro trimestre em 6 vezes, para o balanço em reais, e em 4,8 vezes, para as contas em dólares. A empresa tem sinalizado aos investidores que só voltaria a pensar em aumento de capacidade quando a alavancagem retornar ao patamar de 3 vezes.
A administração também tem se dedicado a deixar claro que a valorização do dólar frente ao real acelera a redução da alavancagem, pois a geração de caixa aumenta em um cenário duradouro da moeda nacional desvalorizada. Além disso, há a captura de sinergias relacionada à aquisição da Fibria, estimada em até 1,2 bilhão de reais ao ano, em bases permanentes, a partir de 2021. Ainda assim, melhorar todos esses números é algo que agradaria, e bastante, o público investidor.
Embora os indicadores financeios estejam salgados, não existe uma preocupação com a capacidade de pagamento da empresa. O que os investidores gostariam é que a Suzano recuperasse mais rapidamente condições de gastar mais — isso, sim! Faria sentido, na visão deles, que a Suzano aproveitasse enquanto a Eldorado está com o futuro paralisado em função da arbitragem entre os sócios, na disputa pelo controle entre a Paper Excellence e a família Batista.
A alguns acionistas, a empresa tem respondido que o ambiente atual é de muita incerteza para novos investimentos e que não há nenhum projeto que julgue importante e que não esteja recebendo recursos suficientes. De um lado, abre-se um leque cada vez maior de novos usos para a celulose. Mas, de outro, o futuro do mercado de papel enfrenta questionamentos diante do movimento global a favor do home office e do aumento das preocupações dos consumidores com questões ligadas à sustentabilidade.
Havia expectativa de que os preços da celulose pudessem começar a se recuperar no começo de 2020, mas não foi o que se viu. A pandemia jogou um balde de água fria nessa perspectiva. Alguns analistas começam a apostar em melhoria da situação no fim deste ano, mas não há consenso.
Mas, para essas preocupações de curto e longo prazo, os investidores têm argumento na ponta da língua: antes de a Suzano quebrar por redução de venda de papel, quebra muito mais gente. O cenário do exagero serve apenas para ilustrar o raciocínio de que o custo de produção da empresa é um dos mais baixos do mundo e que, até em um cenário negativo, ela poderia se beneficiar pela redução da oferta. Ninguém tem medo que a Suzano quebre realmente. Por isso, muitos veem sentido em ampliar a capacidade no ciclo de baixa do preço e ganhar cada vez mais participação no mercado internacional.
O dilema para uma oferta de ações que todos veem é que, para realmente mudar o quadro atual de forma relevante, seria necessário levantar de 5 bilhões de reais a 10 bilhões de reais. Uma operação desse tamanho seria difícil de ser acompanhada por qualquer controlador. A família Feffer tem 45% da empresa, depois da compra da Fibria: o que demandaria, portanto, até 4,5 bilhões de reais para manutenção da participação, sem diluição.
Outro motivo a favor de uma oferta de ações, na visão de investidores, é que a Suzano tem se destacado cada vez mais como um expoente de um mundo que atribui mais valor aos fatores ESG, sigla em inglês para ambiental, social e governança. Os diferenciais nessa frente para a empresa estão tanto no fato de ser uma geradora líquida de créditos de carbono — mais do que compensa suas próprias emissões —como na perspectiva de expansão de uso da celulose com o desenvolvimento de novas tecnologias, em substituição ao plástico. Para além disso, a administração e os donos do negócio têm se mostrado comprometidos com a causa. Tudo isso ajudaria na boa receptividade dos investidores — e a companhia poderia levantar recursos para acelerar inovações nessa área.
Pelo menos, até que a operação do BNDES saia, o debate nesse sentido deve continuar.