Sede da Linx: Stone começa a demonstrar preocupação com duração da disputa e futuro dos resultados (Linx/Divulgação)
Graziella Valenti
Publicado em 18 de outubro de 2020 às 18h34.
Última atualização em 19 de outubro de 2020 às 23h13.
Falta um mês para a assembleia da Linx que vai avaliar a proposta de aquisição da Stone, por 6,28 bilhões de reais, e foi dada definitivamente a largada em busca dos votos para aprovação do negócio. O encontro está marcado para dia 17 de novembro. A Stone prepara uma série de iniciativas para tentar garantir que a operação, que prevê a incorporação da empresa de software, tenha apoio da maioria dos acionistas, segundo fontes a par do tema. Os primeiros movimentos já começam a ser percebido pelos investidores no mercado.
A lista inclui desde um tradicional road show até possíveis medidas mais ousadas como uma solicitação ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para que a gestora do Itaú não possa votar com mais do que 4,99% do capital da Linx. O argumento? A instituição é dona da rival Rede, a empresa de maquininhas de pagamento do conglomerado financeiro que é parceira comercial da Linx e pode perder esse contrato. Portanto, na visão da Stone, pode ter interesse direto no insucesso da operação. O debate começa a ganhar corpo entre investidores da Linx, que querem saber como tudo isso pode afetar o desfecho dessa novela.
O Itaú também é o assessor financeiro da Totvs, que fez proposta concorrente pela Linx, no valor de 6,1 bilhões de reais. A companhia de software fundada por Laércio Cosentino disse estar disposta a partir para estratégias mais hostis para vencer a disputa, diante do que alega ser a falta de independência pelo lado da Linx para avaliar sua oferta. O aumento do preço estaria em análise — justamente o que os investidores da Linx mais querem fomentar. Mas até agora não houve novidade sobre as condições de nenhum dos participantes. Por enquanto, uma guerra sem tiros de ambas as partes.
Vale lembrar que quem detém a participação na Linx são fundos geridos pelo Itaú. Ou seja, não é o banco dono da Rede, mas sim investidores, cotistas das carteiras da Itaú Asset Management — que possui sua própria política de voto e governança. É uma área separada e cujo posicionamento deve seguir o melhor interesse para seus investidores. Nos documentos da proposta da Totvs, o Itaú informa que os fundos da casa detinham, no começo deste mês, 6,6% do capital da Linx e 4% das ações da Totvs.
Também no começo de outubro, a Stone anunciou ter 5,8% do capital da Linx e solicitou ao órgão da concorrência a possibilidade para que possa votar com todas as ações que possui. Esse foi o pedido inicial: respeitar o teto de 4,99%, a menos que órgão libere participação extra. A novidade, conforme o EXAME IN apurou, é que a empresa agora está debruçada sobre a questão do Itaú. A disposição da companhia é respeitar o limite inferior a 5% para a votação apenas se o Itaú também ficar restrito a essa fatia. Do contrário, a Stone poderia avaliar a compra de uma participação na Linx de até 20% (dentro dos limites do estatuto da empresa) e buscar o direito de votar com todas as ações. Por enquanto, porém, nenhuma medida prática foi adota no Cade a respeito do Itaú, o que pode ocorrer nos próximos dias ou semanas.
A temporada de busca por votos foi definitivamente inaugurada após a decisão da área técnica da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de impedir que o trio de fundadores da Linx — Nércio Fernandes, Alberto Menache e Alon Dayan — possa votar no encontro. Como o EXAME IN apontou o risco desde o início, a autarquia entendeu que o contrato de não competição oferecido ao trio, um pagamento equivalente a 185 milhões de reais em ações da Stone, pode ser entendido como um benefício particular. A Lei das Sociedades por Ações determina expressamente a proibição do voto nessas circunstâncias. O contrato equivale a um adicional de 20% em relação ao que os sócios terão a direito a receber pela venda de sua participação, que conjuntamente soma 14% da empresa.
A xerife de mercado se manifestou após consulta realizada pelos próprios fundadores. O trio vai recorrer ao colegiado da CVM a respeito da questão. Os sócios querem assegurar, no mínimo, que possam participar da composição do quórum. Há disposição para acompanhar o que a maioria, antes deles, decidir.
No dia 8 deste mês, a Stone esteve na autarquia, segundo consta da agenda pública do presidente da casa, Marcelo Barbosa. Participaram do encontro o presidente da empresa, Thiago Piau, e mais dois executivos. Eles foram acompanhados de Alexandre Scheinkman, economista e professor da Columbia University, e mais os assessores jurídicos da transação, os advogados Sérgio Spinelli e Hiram Pagano Filho, mais Pedro Dias. Também estavam presentes outros representantes do regulador.
A Itaú Asset, assim como diversos outros investidores, gostaria de ver um processo competitivo pela Linx, para ter certeza de que a venda será pelo melhor preço. Logo após as ofertas feitas pela Stone e pela Totvs — em 11 e 14 de agosto, respectivamente —, a instituição enviou uma carta aos conselheiros independentes da Linx atentando para a importância da busca por competição. Contudo, o Itaú não manifestou preferência por nenhuma das propostas, nem a da Stone, nem da Totvs. Tampouco condicionou seu voto, que ainda não está decidido, a qualquer iniciativa, conforme fontes ouvidas pelo EXAME IN. A instituição tem dito a pares de mercado que foi importante para a governança da operação todo processo de análise feito e documentado pelos conselheiros independentes da Linx.
Desde então, não houve nenhuma comunicação formal à Linx, tampouco a contratação de pareceres de especialistas. O Itaú tem cada vez mais se engajado com aumento da participação nas assembleias das empresas investidas. No ano passado, foram cerca de 90, conforme relatório anual da gestora. Contudo, a casa ainda está distante de uma estratégia ativista e agressiva. De qualquer forma, a Stone está disposta a ir ao Cade para limitar o poder de fogo do banco.
Até o momento, com as duas ofertas conhecidas na mesa, a da Stone é considerada a financeiramente mais interessante. Os investidores apontam que é difícil recusar o prêmio implícito no negócio, da ordem de 35%. Porém, muitos avaliam que o modelo assinado pelos fundadores da Linx vai descer quadrado, pois pode gerar um precedente negativo para o mercado.
O veneno apontado é a mistura do pagamento adicional aos fundadores — pela não competição — ao contrato de exclusividade do trio, mais compromisso de voto a favor da Stone e ainda uma multa de 453 milhões de reais caso a assembleia rejeite a operação e faça negócio com a Totvs pelos próximos 12 meses. A CVM não se manifestou sobre a multa, nem sobre o conjunto da operação.
Ao mercado, a Stone sempre que pode tem procurado argumentar que foi justamente a presença dessa multa que lhe permitiu, logo de cara, apresentar o melhor preço e buscar fundos imediatos. Na mesma semana que assinou o acordo com fundadores, levantou 1 bilhão de dólares com uma oferta de ações na Nasdaq. Além disso, afirma que essa estrutura é corrente nos Estados Unidos. A Totvs alega que o contrato é ilegal e aponta que equivale a dois anos da geração de caixa da Linx, o que configuraria uma penalidade excessiva.
Nos diálogos com a Stone, os investidores da Linx estão solicitando que, ao menos, seja retirada a multa, o que poderia angariar mais votos a favor do negócio pela eliminação de um conflito interno das gestoras entre governança e vantagem econômica.
Mas nem todos estão de acordo com esse pleito. Isso porque a Totvs esticou sua oferta até o dia 17 de novembro, ou seja, o dia da assembleia da Stone. Caso a operação seja rejeitada, no dia seguinte, há espaço para que tenha início uma nova rodada de negociação, mas com risco de ter afastado por completo a empresa de maquininhas fundada por André Street — ou para que se comece uma briga, mas com bases inferiores na largada.
A Totvs tem estimulado aos investidores para que, no encontro do dia 17, peçam a suspensão da análise até que ela obtenha o registro da SEC, a CVM americana, e sua oferta também possa ser votada. Os documentos para análise do regulador americano foram encaminhados na quinta-feira, dia 15. O prazo de análise costuma durar entre quatro e seis semanas. Já a Stone está disposta a tudo que for possível para garantir que o próximo dia 17 seja o fim da novela, com um final feliz para sua oferta. A companhia já começa a deixar claro que está preocupada com a duração da indefinição — com os resultados da Linx, a dedicação dos funcionários (que costumam ficar temerosos nessas circunstâncias) e eventuais dúvidas entre os clientes.