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Será a fusão Lame e B2W um caminho para a AB Inbev do varejo?

Falta saber qual papel da Lojas Americanas na Nyse ou Nasdaq: dinheiro para Amer ou porta para fundadores no varejo global

Amer, a nova B2W combinada: 1.707 lojas físicas e catálogo com 46 milhões de clientes unificado (Lia Lubambo/Reuters)

Amer, a nova B2W combinada: 1.707 lojas físicas e catálogo com 46 milhões de clientes unificado (Lia Lubambo/Reuters)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 29 de abril de 2021 às 10h15.

Última atualização em 29 de abril de 2021 às 11h22.

Todo leitor de negócios já deve ter ouvido Jorge Paulo Lemann falar sobre o fato de o trio do 3G não ter se modernizado e os ativos controlados — AB Inbev e Kraft-Heinz — terem sofrido por isso. Pois bem, Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles acabam de criar um caminho para o que parece haver de mais quente e tecnológico no mundo dos negócios: o varejo. É hoje onde estão todas as notícias mais badaladas e as maiores transformações.

O modelo anunciado para combinação entre Lojas Americanas e B2W lembra a estrutura AB Inbev e Ambev. Aqui, a AB Inbev seria a Lojas Americanas (Lame), que será listada nos Estados Unidos, e a Ambev é a B2W, que vai juntar mundo físico e digital de varejo no Brasil. Com a Lame, o trio vai poder ter contato com tudo que é de novo e voltar a aquecer os motores para aquisições mundo a fora – que é o que eles gostam mesmo de fazer.

Pode ser cedo ainda para afirmar. Mas eles são os pais desse modelo, afinal. Tudo indica que nasce uma potência para o varejo global. Dado que o varejo é uma operação com tantas características regionais, não há muitas razões outras para se ter um veículo global, que não seja pensar em usá-lo. Por enquanto, o único ativo da Lame é AMER — americanas. Esse é o novo nome da companhia brasileira que será resultado da incorporação dos ativos físicas da Lojas Americanas pela B2W.

Mas, ser global no varejo atual é encarar gigantes como a Amazon, com seu US$ 1,7 trilhão de valor de mercado e seus US$ 386 bilhões de receita. E mais tudo que vem bem antes disso. O horizonte, portanto, é bem diferente do que era o mercado de cerveja dos anos 1990 e 2000.

Ou então, será que nasce uma Cosan Limited, a holding que Rubens Ometto criou em 2007 para seu conglomerado, na crença de financiamento infinito, mas que só gerou descontos na empresa operacional brasileira? A vocação do trio deveria estar mais para AB Inbev do que para Ometto.

Mas, por todas essas dúvidas, o modelo anunciado ontem é a solução dos problemas operacionais que empatava o grupo no Brasil há anos, só que é também, por enquanto, um salto no escuro para os acionistas.

Falta ainda clareza para o papel da Lame, que será global, no futuro da AMER e também sobre as condições para sua criação e migração da base acionária. A Lame vai ser — ou no caso, tentar ser — a AB Inbev do varejo ou vai ser o “banco” da operação brasileira?

Listar ações na Nyse ou na Nasdaq dá aos controladores a perspectiva de mandar no negócio mesmo se tiverem pouco menos de 10% do capital total. Isso porque lá existente as ações supervotantes, cada uma dá direito a 10 votos. Aqui no Brasil, fora do Novo Mercado, o mínimo que um controlador que queria ser senhor das decisões precisa ter é 25% do capital (numa estrutura com ações preferenciais). Por isso, a moeda lá fora permite muitas mais emissões.

De forma resumida, o que se tem, por enquanto, é que os atuais acionistas da Lojas Americanas, além de se manterem sócios dessa empresa que vai mudar para os Estados Unidos no futuro, vão ter direta e indiretamente 76,6% da AMER. Ao fim de tudo, o minoritário de Lojas Americanas terá: ações nos Estados Unidos na holding e no Brasil, da empresa operacional.

Dessa fatia, 38,9% será por meio ainda da Lojas Americanas e 37,7% diretamente, com ações que vão receber quando a B2W incorporar as lojas da Lojas Americanas.

Na Lojas Americanas, os controladores ficam com 60% das ações votantes e 38% do capital total, tal qual como é hoje. Por enquanto, até a migração para a Nyse ou a Nasdaq. Nos comunicados de ontem, o grupo afirma que é prematura exercitar qualquer estrutura futura, com a listagem nos Estados Unidos.

Mas, no meio de tanto juridiquês, deixam claro que ir para a bolsa americana busca: “maior acesso a investidores estrangeiros, aumento das fontes de financiamento, redução do custo de capital, aumento da liquidez das ações, alinhamento estratégico de longo prazo, exposição a novas coberturas de analistas, aumentando a visibilidade, e adequação da governança e compliance a padrões internacionais.”

Se aqui, o objetivo é ser o banco da Amer — única e exclusivamente uma porta para entrada de recursos — há um ponto de interrogação importante: o dinheiro que entrar por lá tem que chegar aqui. O que isso significa? Novas diluições? Mútuos? Como será essa relação?

Ometto, como lembrado acima, já tentou esse modelo com a Cosan Limited e já desfez. Não trouxe liquidez e trouxe conflito. É preciso ficar clara a vocação de Lame, pois uma anima e outra desanima.

Mais uma vez, o trio Lemann, Sicupira e Telles têm, no Brasil, um passaporte para o mundo, agora no varejo. Eles partem agora de um negócio que pode valer R$ 77 bilhões na bolsa (soma simples das duas) e nasce com 46 milhões de clientes ativos e 1.707 lojas físicas. Enquanto estão todos vendo a concorrência com Magazine Luiza e Via Varejo, o trio pode estar olhando além das fronteiras. Afinal, uma das frases mais célebres de Lemann é: “sonhar grande e sonhar pequeno dá o mesmo trabalho”.

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