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Raízen inicia apresentação no Brasil do mega-IPO da bioenergia

Companhia, que pode valer de R$ 80 bilhões a R$ 100 bilhões na B3, apresenta identidade de energia renovável

Cana-de-Açúcar: Raízen diz ter capacidade de dobrar capacidade produtiva com as mesmas unidades (Getty Images/Getty Images)

Cana-de-Açúcar: Raízen diz ter capacidade de dobrar capacidade produtiva com as mesmas unidades (Getty Images/Getty Images)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 6 de maio de 2021 às 20h13.

Última atualização em 10 de maio de 2021 às 00h08.

Começaram nesta quinta-feira, dia 6, as primeiras apresentações no Brasil para a oferta pública inicial (IPO) mais esperada de 2021: da Raízen, a joint-venture entre o grupo Cosan e a anglo-holandesa Shell. Essa ainda é a fase chamada de “investor education”. É nesse momento que a companhia faz seu début como tese de investimento. É quando cria a identidade do negócio.

A Raízen já se apresentou para grandes fundos internacionais. Levou na bagagem para os encontros (ainda que virtuais), um RG de companhia de bioenergia, com todos os indicadores que já possui para tal e os planos para os próximos dez anos. Portanto, um negócio predominantemente de energia renovável. Nas letrinhas da moda: ESG — sigla para os fatores ambiental, social e de governança.

Fundos internacionais estão mais habituados a ler essa operação como de bioenergia e não como simples sucroalcooleira, como ainda muitos gestores locais entendem o negócio. Daí a escolha de começar pelo mercado externo. Mas enfrentar o atual desinteresse dos investidores internacionais pelo Brasil nesse momento não será pouca coisa.

Ainda que o valor da Raízen não seja a questão central da discussão nesse momento, o mercado trabalha com parâmetros comentados aqui e acolá de uma avaliação entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões. Há quem fale que pode chegar a R$ 100 bilhões. Tudo que o mercado sabe, porém, é que nenhuma avaliação foi sequer submetida ao conselho de administração. A expectativa é de uma oferta de R$ 10 bilhões. Mas tampouco isso está definido.

A companhia, ao que tudo indica, tem flexibilidade para fazer uma operação do tamanho do apetite dos investidores, se nesse momento dois dígitos for muito para os investidores absorverem. De qualquer forma, há uma certeza: os acionistas não venderão suas ações.

De qualquer forma, não há dúvida. A Raízen é para 2021 o que Rede D’Or foi para 2020, com sua oferta de R$ 11 bilhões e a estreia de uma companhia de R$ 115 bilhões na B3.

Dez anos

O pedido de registro para a oferta na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é esperado para junho, que é exatamente o mês em que a joint-venture entre Cosan e Shell completa dez anos. Nessa primeira década, os sócios construíram a parceria. A companhia, que nasceu com opções recíprocas de compra e venda de participação caso algo desse errado na convivência, já cancelou esses mecanismos e ficou acordado que Rubens Ometto, acionista de referência do grupo Cosan, tem a posição de chairman vitalício do negócio.

Os sócios mais do que duplicaram a operação nesse período. O Ebitda passou de R$ 3,7 bilhões, em 2011, para os R$ 10 bilhões esperados para este ano, considerando a aquisição da Biosev. Com a transação, o grupo tem 15% do mercado sucroalcooleiro do país — disparado o maior. Além disso, a sociedade também abriga a operação de distribuição de combustíveis, com a gestão da bandeira Shell no Brasil, com um market-share da ordem de 30%. Os valores cogitados pelo mercado, portanto, indicam uma avaliação entre 8x e 10x o Ebitda de 2021.

O reforço de sua imagem como uma companhia de energia renovável foi o motivo para a Raízen ter decidido iniciar as apresentações de seu negócio para o público investidor internacional. Com o IPO, a empresa deixa de depender de recursos de seus dois sócios, e de suas estruturas de capital, para se financiar. Ganha independência. É quase como alcançar a maioridade.

Para a Cosan, a listagem da Raízen também será um evento e tanto. Atualmente, a estimativa de analistas é que a empresa esteja avaliada entre R$ 45 bilhões e R$ 50 bilhões dentro da holding. Ainda que os montantes comentados para o IPO não sejam exatos, o potencial é evidente.

O plano de Ometto é listar todos os negócios controlados. Com sucesso na oferta de Raízen, faltará retomar o processo da Compass (dona da Comgás) e iniciar o da Movee, de lubrificantes. A Rumo Logística já é negociada na bolsa.

O futuro

O plano da Raízen é dobrar de tamanho em 10 anos. E, nesse futuro, 70% do Ebitda do negócio vai vir de produtos renováveis. Embora hoje já seja uma produtora de etanol, a Raízen está levando ao investidor o que chama de “parque de bioenergia”, o que inclui etanol de 2ª geração, cogeração, biomassa e biogás.

Quem já ouviu as apresentações destaca que a Raízen defende o etanol e a cana-de-açúcar como parte da matriz energética de futuro, não só do Brasil, mas do mundo. Para os defensores do setor, essa fonte de energia tem grande vantagem até mesmo sobre o planejamento elétrico — que é totalmente dependente de um universo movido a base de baterias e, portanto, de lítio.

Ar puro

A cada megajoule de energia produzida a partir do etanol, são emitidas 23 toneladas de carbono (CO²). Se for etanol de segunda geração, a emissão cai para 16 toneladas. Esses números se comparam 101 toneladas da gasolina americana, 87 toneladas da brasileira (misturada com etanol) e até mesmo com as 56 toneladas do etanol de milho.

No Cosan Day, realizado em março, o grupo já jogava o tapete vermelho para a identidade de energia renovável da Raízen. E em uma das páginas trazia uma comparação com ninguém menos do que a Tesla, a queridinha global de Elon Musk, com seus carros elétricos e foguetes. A Raízen evita a emissão de 5,2 milhões de toneladas de carbono ao ano, enquanto a Tesla precisaria de 11 anos para evitar 3,7 milhões de toneladas.

Tudo isso é o E, do ESG. Mas essa identidade é possível porque o grupo colocou o G, da governança, na rota certa, após a ampla reestruturação societária que elimiou a estrutura de holdings e a Cosan Limited, que desde 2007 havia deixado um gosto amargo no mercado.

Mais sexy

Para não escapar dos temas preferidos da temporada global pós-pandemia para além do ESG, a Raízen ainda vem destacando a capacidade de geração de valor dentro do segmento de distribuição com a operação de varejo, pelas lojas de conveniência — que a empresa vê potencial de quintuplicar, de 1.100 unidades para 5.000 — , e pela digitalização dos pagamentos com o Shell Box. O aplicativo da rede movimentou R$ 215 milhões em janeiro deste ano, ante R$ 29 milhões em abril de 2019, quando foi lançado. A expectativa é que o potencial é um TPV, total transacionado, de R$ 10 bilhões ao mês.

E o ciclo?

Quem conhece de perto a estrutura planejada para o IPO da Raízen, conforme a empresa tem falado com os investidores, aponta que os fundos domésticos também serão relevantes na oferta. O grupo tem sócios importantes no país, como as gestoras Dynamo e Atmos. A percepção dessas casas será relevante para construção da narrativa.

No Brasil, a Raízen enfrentará o olhar mais viciado da comparação com outras sucroalcooleiras, ainda que elas concentrem sua produção em açúcar (mais do que etanol). Os investidores domésticos, de fato, antes mesmo de ouvir a empresa estavam se questionando sobre o valor apontado para o negócio. O argumento? A exposição ainda a um setor cíclico, com altos e baixos.

Muitos já foram e continuarão sendo também os questionamentos sobre como a companhia vai dobrar de tamanho em dez anos e quanto de aquisições tem nessa conta. Já no Cosan Day, a empresa apontava a capacidade de dobrar a produção apenas com as plantas atuais.

Mas o que investidor quer — e vai querer cada vez mais, quanto mais se aproximar a discussão de valores — são detalhes. Eles são o segredo que permitirão que a companhia tenha potencial, na prática, para dobrar de valor, em relação à percepção atual, dentro da holding Cosan.

 

 

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