Exame IN

Pércio de Souza: "nada indica segunda onda de coronavírus"

Engenheiro de formação, Souza construiu sua carreira em fusões e aquisições e está dedicado a estudar pandemia desde o início da crise

Para Pércio de Souza, do Instituto Estáter, nem surto em Pequim pode ser considerado segunda onda (Kyodo News/Getty Images)

Para Pércio de Souza, do Instituto Estáter, nem surto em Pequim pode ser considerado segunda onda (Kyodo News/Getty Images)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 6 de julho de 2020 às 21h53.

Última atualização em 6 de julho de 2020 às 22h32.

O mundo vive ou não uma segunda onda de contaminação do coronavírus? Essa é a pergunta do milhão para muitos investidores. Ou, do bilhão. A resposta diz respeito à saúde e à economia de todo o planeta. As dúvidas e os temores quanto a isso cresceram nas últimas semanas. Mas as análises são tão ou mais voláteis que as bolsas de valores. Entre os que se preocupam com os preços do mercado, não são poucos os que dizem que a superação da barreira dos 100 mil pontos do Índice Bovespa só depende dessa certeza.

Pércio de Souza, conhecido pelas complexas operações de fusões e aquisições que fez em diversos setores, segue firme em seu propósito de medir e estudar as estatísticas da Covid-19 para conseguir esse tipo de resposta — entre tantas outras. E está determinado em dar visibilidade aos números que, em sua opinião, apontam que não há "nenhum sinal de segunda onda" de contaminação pelo mundo até o momento — ainda que muitos digam e temam o contrário, incluídos aí médicos e cientistas.

O Brasil registra hoje mais de 65 mil mortes por coronavírus e 1,6 milhão de contaminados, desde o início da pandemia. É atualmente o país com segundo maior número de óbitos e positivos do planeta, atrás apenas dos Estados Unidos.

O monitoramento minucioso dos dados tem sido feito por meio do Instituto Estáter, que tem firmado parcerias com empresas e associações de comunidades para conscientização a respeito da pandemia. O que existe, segundo Souza, são áreas que se fecharam rapidamente e que não passaram sequer pela primeira fase de contágio e que só entraram nela mais recentemente, após a retomada do convívio social.

“A curva de contágio consolidada de países continentais, como Estados Unidos e Brasil, é uma ilusão”, enfatizou ao EXAME IN. Isso porque ela unifica tendências diversas em áreas em estágios muito diferentes de disseminação da doença. “Não se pode comparar o que está acontecendo em Nova York com o momento da Flórida, Texas e outros estados onde os números são crescentes agora. Os gráficos mostram direções opostas quando visualizados separadamente. O mesmo vale para Brasil, quando se fala das cidades de São Paulo e Florianópolis, por exemplo”.

Os comentários de Souza são acompanhados de dados e tabelas apontando a queda nos óbitos e novos positivos para a Covid-19 nos lugares que já passaram pelo pico da curva e experimentam a reabertura. Na China, por exemplo, onde houve a discussão sobre uma nova contaminação a partir de um surto em Pequim, foram registrados entre 131 e 271 novos casos por semana em junho e julho. “Não é certo chamar isso de segunda onda, quando no auge do contágio, em fevereiro, os números semanais registravam dezenas de milhares de novos casos.”

“Nem mesmo depois das manifestações por conta do assassinato de George Floyd a curva de Nova York voltou a subir”, enfatizou ele. Na Big Apple, há quatro semanas os números de positivos estão abaixo de 5 mil a cada sete dias — um décimo do que era verificado no pico de abril. As mortes são decrescentes também nos países da Europa que foram fortemente atingidos. Na França, há cinco semanas consecutivas o acumulado a cada sete dias traz perto de 3,5 mil novos casos, ante o pico de 53 mil em março. A Itália, que foi o centro de atenção do mundo durante quase dois meses, registra entre 1,4 mil e 2,0 mil novos positivos semanais —  comparado aos 38 mil do fim de março.

Diante desses dados, Souza é enfático. “Não há evidências de segunda onda. Nós deveríamos olhar para os países que estão seis semanas na nossa frente para fazer política pública.”

O isolamento em muitos locais começou tão cedo que simplesmente atrasou a primeira onda, mas é muito difícil impedir pura e simplesmente o contágio, segundo ele. “É brincar de esconde-esconde. Tem data de validade. Quando essas regiões abrem, a disseminação ocorre. O vírus não some. Não sou eu quem digo: é o que está ocorrendo nos países que já passaram pelo pico.”

Engenheiro de formação, Souza diz que os números “saltam” na sua frente. “Tem muita gente falando em ciência mas que não está olhando os dados. São eles [os dados] que devem nortear a política pública.” Na opinião dele, surtos locais vão existir e não devem ser confundidos com a força da primeira onda.

A estratégia do isolamento, na opinião dele, é importante para dar aos governos tempo de organização e reação, mas não deve ser a única política. Longe disso, inclusive. Agora, visando a reabertura onde é possível, ou seja, onde o pico ficou para trás, o trabalho deveria ser de conscientização e preparo da população a respeito dos cuidados com a higiene pessoal e das aglomerações, que devem ser evitadas. “Assim como existem os trabalhos com a dengue e a zika.”

Souza tem também defendido que a estrutura para retomada não envolve apenas ampliar leitos de UTIs. Já escreveu artigos e deu entrevistas apontando, há meses, para as mortes que ocorrem fora dos hospitais. Para ele, os dados indicam que a população chega em estado muito grave aos hospitais e, portanto, tardiamente — ou nem chegam. A atuação pública também deveria, segundo ele, olhar para esse desafio. “Mais uma frente para se trabalhar com informação, para que as pessoas procurem os hospitais.”

Acompanhe tudo sobre:Coronavírus

Mais de Exame IN

A temperatura da venda da Linx pela Stone

Do conserto ao concerto: “Vamos dobrar a Ânima de tamanho”, diz CEO

Unipar capta R$ 673 milhões com BNDES para modernização de Cubatão

Fim da guerra da cerveja? Pelas vendas de setembro, a estratégia da Petrópolis está mudando