(Fernando Dias/Divulgação)
Karina Souza
Publicado em 3 de outubro de 2022 às 10h14.
Última atualização em 3 de outubro de 2022 às 10h34.
Três meses depois de o Cade aprovar a aquisição de parte da Unidas e menos de uma semana após o fim dos 60 dias de ‘troca de bastão’ oficial, a Brookfield Asset Management começa a comunicar os planos que tem para tocar o negócio combinado entre Ouro Verde e a locadora adquirida. A locadora controlada pela Brookfield anunciou nesta segunda-feira (3) que decidiu unir as duas marcas sob a marca do Grupo Unidas, uma espécie de holding que passará a existir para olhar o desempenho de cada uma das empresas e garantir que sinergias sejam capturadas entre elas. Para lembrar, a aquisição marca a entrada da Ouro Verde no segmento de Rent-a-Car (RAC), o principal em receita dentro de concorrentes como a Movida. Além disso, a locadora também passará a atuar na venda de veículos para o consumidor final, um ramo também novo. Com o objetivo de tocar tudo isso e de entender de perto como funciona a operação da empresa comprada, a ideia de estruturar um grupo tomou forma.
Na prática, segundo Cláudio Zattar, CEO da Ouro Verde, isso não deve adicionar complexidade à operação. “É importante fazer com que a Unidas tenha uma continuidade operacional plena antes de fazer qualquer coisa. Queremos olhar standalone a empresa para entender e conhecer de perto os resultados. Na prática, a estrutura de gestão do grupo será uma só e a marca, unificada, para que a gente tenha os dois times unidos em uma só estratégia”, afirma, ao EXAME IN. Será ele mesmo o CEO do grupo, por exemplo.
A gestão não será a única área integrada para todas as empresas. A estrutura de despesas gerais e administrativas, ao contrário do que uma primeira impressão pode sugerir, não será duplicada. Para entender isso, é necessário contexto (ou boa memória). A Unidas veio para as mãos da Ouro Verde depois de um remédio do Cade aplicado à Localiza, quando esta decidiu comprar uma de suas principais rivais. Na ‘divisão de bens’, a fatia que veio para a locadora controlada pela Brookfield trouxe toda a estrutura comercial de lojas, logística e operações, mas outras áreas não vieram junto no pacote. Logo, áreas como tecnologia, RH, jurídico etc serão compartilhadas com a nova empresa a partir do que já existe na Ouro Verde, colaborando para diluir despesas.
Do ponto de vista operacional, há também uma sinergia importante a ser capturada, a de relacionamento com fornecedores. Com a aquisição, há uma mudança brutal no nível de capacidade da empresa. Tomando como base os dados do segundo trimestre deste ano, a Ouro Verde sozinha tinha 38,6 mil ativos (entre veículos leves e pesados). Agora, esse número vai para 90 mil ativos. A ideia é que o portfólio mais robusto possibilite melhores condições com fornecedores, especialmente em termos de condições comerciais.
Em relação às trocas ‘dentro de casa’, Zattar menciona alguns pontos. O aprendizado de como funciona o canal de venda para o varejo é um deles, especialmente relacionado à venda de veículos para o consumidor final. “É algo importantíssimo porque bate direto no balanço. Vender com qualidade para o cliente final significa menor depreciação dele”, diz.
Outro ponto a ser explorado em conjunto é o uso de tecnologia. Hoje, a Ouro Verde tem aplicativos maduros com os quais já lida com os clientes e pretende usar isso na hora de olhar para a experiência do cliente dentro da Unidas. O foco, no fim das contas, é trazer uma ideia de diferenciação e inovação para os consumidores.
O fato de a operação ter sido concluída há pouquíssimo tempo ainda impede o executivo de divulgar metas claras no quanto todas essas trocas devem influenciar o saldo final em dinheiro. O que afirma, entretanto, é que em 2021, a fatia comprada da Unidas, somada à Ouro Verde, gerou um faturamento de R$ 3,3 bilhões. Em 2022, ele se limita a dizer que não houve perda, mas que “não há ainda uma precisão nos números a serem divulgados”.
Hoje, a locadora é uma empresa aberta (ainda que não listada), o que permite acompanhar a evolução ao longo dos últimos anos e ver o crescimento da empresa. Olhando para o pré-pandemia, a receita da empresa era de R$ 697 milhões em 2019, número que passou para R$ 815 milhões no ano seguinte, impulsionado pelo aumento da receita de venda de ativos para renovação de frota. Em 2021, outro crescimento, para R$ 917 milhões, apoiada no aumento do faturamento com os serviços de aluguel e gestão de frota.
A Unidas teve seu capital fechado depois da compra pela Localiza, o que dificulta uma comparação do desempenho do segmento adquirido pela Ouro Verde neste ano. Em 2021, a companhia conseguiu dobrar o lucro líquido, chegando à inédita marca de R$ 1 bilhão, impulsionada principalmente por locação e pela operação de seminovos. As margens foram impactadas, tendo em vista a idade mais elevada da frota. Esse é, aliás, um dos pontos mencionados pelo executivo como investimento na Unidas daqui para frente: compra de veículos.
De todo modo, daqui para frente, deve ficar mais claro entender qual é o papel da Unidas dentro da estrutura do Grupo. Isso porque Zattar afirma que tem a pretensão de tornar a companhia também aberta – ainda que não listada – nos moldes da governança que a Ouro Verde tem hoje. Isso deve, é claro, colaborar para que a empresa possa emitir debêntures no mercado, nos moldes do que a empresa compradora já faz.
Questionado a respeito da pretensão de levar o grupo todo à B3, o executivo afirma que “ainda é cedo” para pensar nisso e que não há nenhuma decisão madura a respeito do tema. “É importante esclarecer que o endividamento da Ouro Verde é alocação e captação de recursos para gestão de frotas. Temos um padrão, temos covenants e uma disciplina gigantesca de compromisso. Não vamos precisar levantar recursos tão cedo. Além disso, a Unidas tem a robustez capaz de captar para poder continuar fazendo investimentos. Ou seja, temos condições de continuar seguindo nosso plano dentro dessa estrutura que estamos começando”, diz.
É um começo e tanto. Do lado da Ouro Verde, são 1.600 colaboradores dentro do grupo e, na Unidas, outros 2.000. O fato de a marca de locação ser tão conhecida do público final foi o que levou, no fim, o grupo a ter o nome dela – e não da empresa compradora. Também foi um sinal de união para os colaboradores. Ficou mais fácil dessa forma, segundo o executivo, explicar aos clientes que estão investindo numa marca poderosa sem perder qualidade.
“Nosso cliente de agro vai ter a entrega, o serviço que sempre prestamos e que nos credenciou. Apenas o nome vai mudar, porque estamos investindo numa nova marca. Foi essa a decisão estratégica”, diz.
Do lado da Ouro Verde, o foco em expansão segue a todo vapor. A penetração do mercado de aluguel de caminhões no Brasil é a principal oportunidade, já que representa menos de 1% no mercado brasileiro, ante 26% nos Estados Unidos e 22% na Europa.
Do lado da Unidas, como apenas uma parte das lojas, a maior parte – das 240 que a empresa tinha, vieram 182 – a meta é recuperar esse gap, recolocar lojas onde não tinha e recuperar o market share, de olho em ter, dentro de casa, a totalidade do que a empresa tinha quando atuava de forma independente.
Todo o apetite para colocar tudo isso de pé deixa quase óbvia a questão: afinal, a aquisição da Unidas foi o fim das compras para a Ouro Verde? Ao que tudo indica, não. “No curto prazo estamos focados em arrumar a casa, mas o fundo tem um apetite grande para investir. Eventuais oportunidades, um pouco mais à frente, serão estudadas. Até porque o setor de pesados tem oportunidades de crescimento inorgânico que vamos voltar a analisar. É a natureza do private equity olhar as aquisições como oportunidade, estamos no timming certo”, diz Zattar.
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