Havaianas: planos ambiciosos para ampliar participação de mercado no Brasil e em seis países eleitos para liderar avanço internacional (Havaianas/Divulgação)
Graziella Valenti
Publicado em 15 de dezembro de 2021 às 18h48.
Última atualização em 17 de dezembro de 2021 às 11h06.
Quando anunciou o resultado do terceiro trimestre, a Alpargatas, dona da marca Havaianas, contou que estava prestes a iniciar um novo ciclo de expansão. Nesta quarta-feira, dia 15, o presidente da companhia, Roberto Funari, apresentou em mais detalhes aos investidores quais são esses objetivos. A companhia pretende, nos próximo cinco a dez anos, elevar sua participação de mercado em chinelos no Brasil – flip flop (a havaiana propriamente dita) e em sliders – de 13% para 20%, medidos por receita. E quer levar as sandálias para o atual patamar dos chinelos, de 13%. Em volume, o mercado brasileiro de calçados é de 420 milhões de pares.
Nos planos domésticos, será essencial a capacidade da companhia de gerenciar o tíquete médio. A execução do planejamento prevê um ganho de alavancagem operacional com aumento de volume e adequação de preços.
Atualmente, os flip flops da Havaianas tem uma gama bastante ampla de preços para contemplar os mais diferentes consumidores. O valor do par pode variar de R$ 20 a quase R$ 250. A companhia diz saber que os tempos vizinhos serão difíceis, mas que está confiante de que poderá atravessá-lo bem. As razões para isso estão no portfólio, com ampla gama de preços, e no projeto mais recente em andamento.
Para o mercado internacional, os planos são igualmente – ou até mais – ambiciosos. A meta é ampliar a participação, em volume, dos atuais 3% (que não inclui Brasil no cômputo geral) para um percentual de dois dígitos. Em sandálias e sliders, o projeto é levar o share de 0,4% para 3%.
Desde que chegou ao grupo há três anos, Roberto Funari, elegeu como foco para expansão o que chamava de “big bets”: Europa, Estados Unidos e Ásia. Hoje, a companhia detalhou que serão seis os países foco, em um primeiro momento: Itália, Espanha, Reino Unido e França, Estados Unidos e China.
Aos investidores, a companhia fez uma apresentação detalhada de como vai trabalhar desde as vendas e posicionamento até a parte industrial. “Foi um trabalho muito profundo, em squads, que durou cerca de um ano e meio”, completou Funari, em entrevista ao EXAME IN, sobre esse planejamento.
Na Europa, onde a marca já possui uma força muito grande, a Alpargatas conseguirá avançar em produtos fora do core business com mais velocidade. A expectativa, por exemplo, é que os snickers, uma nova aposta da empresa, possam chegar à Itália já em 2023.
Nos dois gigantescos mercados que são Estados Unidos e China, o projeto estará focado, em um primeiro momento, nos flip flops e sliders. Fred Levy, que está à frente da operação internacional, foi bastante entáfico em sua apresentação: “A China, não tenham dúvida, é o futuro da companhia. Mas é o mercado mais fragmentado que conhecemos e vemos isso como oportunidade.”
A tarefa de Levy? Melhorar o desempenho na Europa, onde a Havaianas, já é líder nas pesquisas sobre awareness para flip flops, com aprofundando nas vendas fora do core ao longo tempo, e levar a empresa à liderança de awareness nos Estados Unidos e China.
Para a estratégia nos Estados Unidos, o executivo disse que serão necessários investimentos em marketing e collabs - parcerias com outras marcas. Já para a China, o objetivo é, desde a largada, construir uma marca muito focada em "free lifestyle".
Um a um, os executivos da companhia foram apresentando suas frentes e seus projetos. Aos poucos, as falas foram deixando clara a profundidade da compreensão que a companhia alcançou a respeito de seus mercados-alvos, com a preferência de cada um deles. “Sabemos que nos Estados Unidos os consumidores dão muito valor à ergonomia dos produtos” ou “Na China, está clara a força que os produtos com brilho possuem”, foram algumas das frases que tornaram evidente o esforço da empresa.
A Alpargatas também deu mais informações sobre o projeto de aumento da capacidade. A companhia vendeu, nos 12 meses até setembro de 2021, 265 milhões de pares. O projeto prevê que em 2022 a empresa eleve a produção em 5 milhões de pares ao mês, o que equivale a uma expansão de 60 milhões de pares em um período de um ano. O investimento já anunciado para esse esforço, que inclui um novo centro de distribuição no Nordeste, é de R$ 600 milhões em 2022, além de R$ 30 milhões que foram executados já neste ano.
Esse aumento de capacidade não será apenas produzir mais. Vai incluir também um profundo processo de digitalização, com informação e dados sobre produção desde a ponta. Faz parte do esforço da empresa de melhorar o desempenho do atendimento do varejo e seus canais que hoje ainda enfrentam elevado índice de ruptura – falta de tamanho ou cores que atendam aos pedidos. De cada 100 pedidos que a companhia receber, a meta é atender 95 com excelência.
“A este ponto, já está muito claro para nós que uma empresa que cuida do ponto de venda melhora a fidelidade do cliente e a percepção da marca”, disse Funari. “Não há nenhuma companhia que cresça que não cuide bem de seu core business.” Essa foi uma fala que se ouviu mais de uma vez do executivo durante a apresentação. “Eu garanto que vocês vão se surpreender com o que vamos fazer nessa frente”, afirmou ele.
A companhia deve começar em breve, por exemplo, os testes para que os clientes possam, pelo e-commerce, customizar sua própria havaiana. Fazer um flip flop com suas cores e sua cara, como quiserem. Depois do Brasil, essa tecnologia também — é claro! — será levada para os mercados que podem valorizar esse tipo de posicionamento.
Os desafios de execução estão surgindo para a Alpargatas — e já foram mapeados e têm plano em andamento — porque a companhia, cada vez mais, atua tanto na venda direta ao cliente, seja por meio do varejo próprio e franqueado, como do comércio eletrônico, como em canais especializados. A marca, que tem 60 anos de história, teve seu crescimento marcado pela capilaridade e força de vendas junto a canais do varejo de suprimentos como mercados, super e hipermercados, além de farmácias mais recentemente.
Não é por acaso que a Alpargatas vai levar para dentro de casa o aprendizado dos deliveries de comida. Vai criar diversas "dark stores" para conseguir fazer suas entregas, tanto de e-commerce nos grandes centros, quanto para os pequenos varejistas, em um prazo de 24 horas. Vai unir, nesse atendimento, os microfranqueados e o varejo individual direto.
Funari completa três anos à frente da Alpargatas e aproveitou o momento para colocar em números o que a companhia entregou nesse período — com uma pandemia no meio, que tomou mais da metade disso. Nesse intervalo, o volume vendido pela empresa cresceu 12% e a participação de mercado em receita teve uma expansão de 10 pontos percentuais. Melhor do que isso, foi mostrar que a expansão veio com receita e rentabilidade maiores: a receita teve expansão de 39% e o Ebitda, em torno de 60%.
O valor de mercado de Alpargatas, que girava entre R$ 5 bilhões e R$ 5,5 bilhões, antes do Joesley Day, em 2017, está hoje acima de R$ 20 bilhões. E por que a data de 17 de maio de 2017 é relevante? Porque logo após esse evento, o grupo J&F, da família Batista (dona da JBS), teve de vender o ativo para reorganizar suas finanças. Desde então, o grupo é controlado pela Itaúsa e pela Cambuhy Investimentos, respectivamente a holding dona do Itaú e a gestora de investimentos da família Salles Moreira (Unibanco).
Uma “powerhouse global de marcas ícones e hiperconectadas”. Essa foi outra expressão muito ouvida pelos investidores que acompanharam a apresentação de Funari e de seu time de executivos na empresa. A empresa acaba de concluir um processo de venda de marcas de tudo aquilo que entendia não ser parte do seu projeto. O mais recente movimento foi sair Osklen. Ao todo, esse processo trouxe uma liquidez extra de R$ 700 milhões à empresa.
“Depois de vendermos, agora podemos nos dedicar a olhar o que podemos comprar”, disse Funari. Sem querer dar pistas sobre em qual velocidade anda esse projeto, o executivo disse que foi feito um mapeamento do mercado global de calçados. Agora, a empresa está na fase, segundo ele, de construir relacionamento e ver onde pode haver oportunidades que possam ir além dos números. As transações, segundo Funari, também devem agregar talentos ao negócio. Ele frisou que não há nenhuma pressão para compras e que a companhia vai executar esse projeto com cuidado e disciplina financeira.
A Alpargatas fechou setembro com nada menos do que R$ 678 milhões de caixa líquido, ou seja, recursos extra além dos compromissos financeiros — R$ 320 milhões a mais do que setembro de 2020.
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