Rodrigo Abreu, presidente da Oi: fibra virou item de primeira necessidade, não é mais artigo de luxo (Omar Paixão/Exame)
Graziella Valenti
Publicado em 19 de agosto de 2020 às 13h57.
Última atualização em 19 de agosto de 2020 às 14h39.
A cobiçada InfraCo, a companhia de infraestrutura e rede que a Oi vai vender o controle e para a qual já recebeu mais de dez propostas, vem junto com um agressivo plano de investimentos da ordem de 20 bilhões de reais e que representará quase uma “universalização privada” da cobertura de fibra no Brasil. Quando o comprador tiver alcançado as metas que a Oi colocou no plano atualizado de recuperação judicial, para 2025, só a InfraCo terá 32 milhões de residências com fibra passada. Para quem comprar, vai ser um ritmo alucinante de 5,5 milhões de novas coberturas a cada ano, consecutivamente, até lá.
Esses 32 milhões de casas equivalem a mais de 40% dos domicílios existentes no Brasil. É quase o mesmo percentual de lares que em 2018 contavam com um microcomputador (e nem todos com conexão à internet), de acordo com a última Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (Pnad). É dar acesso a todos eles sozinha e em altíssima velocidade de navegação.
Mas, para ser mais exato, é preciso tirar São Paulo, região onde a Oi não possui rede para conversão em fibra dessa base. Quando se soma o plano da Oi ao da Telefônica Vivo, o Brasil terá mais de 55 milhões de casas cobertas com fibra dentro dos próximos cinco anos — supondo sucesso de execução de ambos os projetos. Sobre a quantidade atual de domicílios do país, a cobertura será superior a 75%.
“A fibra vai viver um fenômeno semelhante ao do celular no Brasil. O telefone móvel universalizou o indivíduo e a fibra, universaliza a residência”, afirma Rodrigo Abreu, em entrevista ao EXAME In.
Os 20 bilhões de reais de investimento necessários para execução desse projeto não têm nenhuma relação com os 20 bilhões de reais de preço mínimo para o ativo que a Oi estabeleceu na semana passada. Na verdade, trata-se apenas de uma coincidência numérica. Então, na prática: quem comprar tem de pagar 6,5 bilhões de reais pelo controle à Oi e mais uma dívida de 2,5 bilhões de reais e ainda ser dono de uma empresa que terá de encarar 20 bilhões de investimentos em quatro anos — e que não vai vir com caixa.
A Oi diz no plano que aceita uma capitalização de até 5 bilhões de reais no negócio. Excluída a obrigação com a dívida, ficam faltando apenas 17 bilhões para ser resolvidos entre fluxo de caixa e dívida, em quatro anos. O valor de compra dá direito a 51% do capital votante e, no máximo, 37% do negócio — o restante será da própria Oi, que vai se manter minoritária — e cliente, como principal geradora de receita. Quem pagar mais, pode ficar com uma parcela maior do negócio todo.
A expectativa da Oi é que a InfraCo terá 10 milhões de domicílios conectados, ou seja, clientes efetivos, sendo que 7 milhões deles serão da própria Oi, até o fim de 2025. Antes de qualquer coisa, cabe esclarecer que há duas medidas para fibra: casas passadas (clientes potenciais, com rede na calçada) e casas conectadas (clientes contratados). Resumindo até aqui: até 2025, a InfraCo precisa ter 32 milhões de domicílios atendidos e 10 milhões contratados.
O comprador terá quatro anos para executar esse projeto e poderá, com isso, tirar o atraso de décadas de subinvestimento da companhia. Pelos cálculos da Oi, apenas quando alcançar os 10 milhões de casas conectadas, o Ebitda anual da InfraCo será superior a 3 bilhões de reais. Para chegar lá, será uma corrida e um gasto e tanto. A estimativa de analistas é que a conversão do cobre para fibra custe cerca de 1.000 reais por domicílio, com base nos dados do balanço da tele.
Segundo Abreu, da Oi, o custo cai com o ganho de escala. "Quando anunciamos nosso plano para fibra em 2019, a estimativa era de 1.300 reais por casa conectada e hoje já está bem abaixo disso." Além disso, o investimento que acontece de largada é o da passagem da fibra, que é de cerca de 30% do total. A conexão, que tem o custo superior pois envolve os aparelhos que ficam na casa do cliente mais o atendimento e instalação, responde por 70% do total e só ocorre junto com o início da geração de receita, pois depende da venda do serviço.
O plano desenvolvido pela Oi para a rede de fibra da InfraCo prevê duas fontes principais de receita: a venda da capacidade para a própria Oi e ainda para os provedores regionais. Estimativas de especialistas de mercado é que esses pequenos operadores locais respondam por algo entre 50% e 60% das adições líquidas de clientes de banda larga. O Brasil tem cerca de 5.600 municípios e a maioria da expansão hoje ocorre fora das metrópoles.
“Nosso projeto passa por recuperar parte desse mercado, nos locais onde temos presença forte. E hoje já estamos fazendo isso", diz Abreu. Para quem duvida da capacidade de absorção desse volume de infraestrutura, o executivo alega que a realidade mudou muito rapidamente nos últimos anos. “A fibra hoje entra no orçamento em um pacote que inclui conexão, educação e entretenimento. Há um deslocamento de renda. Antes, era artigo de luxo. Agora, é item de primeira necessidade. Antes, eu acreditava nisso. Agora, conforme fazemos nosso investimento, eu vejo isso empiricamente acontecer.” De acordo com o presidente da Oi, o plano foi montado já levando em conta a capacidade de absorção do serviço. “Quando mapeamos o país, encontramos, na verdade, 40 milhões de domicílios onde podemos passar a fibra, por termos condições técnicas já hoje para isso. Mas ficamos em 32 milhões como meta para ser economicamente factível.”
Entre os interessados conhecidos para InfraCo estão a companhia de origem italiana Enel, com seu braço de telecom, o Canada Pension Plan (CPPIB), a Highline e fundos de infraestrutura geridos pelo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME).
Após investimentos de 3,5 bilhões de reais nos seis primeiros meses deste ano (62% dele em fibra), a Oi alcançou 6,7 milhões de domicílios passados com fibra e 1,3 milhão conectados — ou seja, clientes efetivos. Portanto, considerando os números de dezembro, custou para a empresa 2,2 bilhões de reais ampliar em 2 milhões o total de domicílios passados com a fibra. “Se for considerar que a cada ano de crescimento os melhores mercados são atendidos primeiro, ficará cada vez mais difícil a execução do plano com o passar do tempo, já que estamos falando de todo o Brasil, menos São Paulo. Sem contar que a rede de transporte e capacidade também vai precisar de investimentos para suportar essa expansão de clientes”, comentou um analista.
E será necessário combinar tudo isso — mesmo avançando cada vez mais no tal do Brasil profundo — a uma grande eficiência em vendas. Ter 10 milhões de clientes para 30 milhões de casas com a infraestrutura é um índice superior a 30% da infraestrutura ‘vendida’. Hoje, esse índice da Oi é de 19,4%.
A companhia estima que chegará ao fim de 2019 com 8,6 milhões de casas passadas. Como a venda da InfraCo só deve ocorrer no primeiro trimestre de 2022, até lá, serão 10 milhões, na visão de Abreu. Para o comprador, restarão 22 milhões de lares para executar.
O plano da Oi é mais agressivo do que o da Telefônica Vivo, que também criou uma “InfraCo” para vender. O grupo espanhol busca um sócio para assumir 50% da infraestrutura fora do estado de São Paulo. A companhia prevê chegar ao fim de 2020 com 14 milhões de residências passadas com fibra, mas a nova empresa receberá apenas 1,1 milhão delas (as que estão fora do estado). A da Oi, portanto, nascerá dez vezes maior em tamanho e seis vezes maior em desafio de execução.
O plano é fazer com que esse 1 milhão se torne 5,5 milhões de casas cobertas ao fim de 2024 — o que significa pouco mais de 4 milhões de novas residências em três anos, ou perto de 1,5 milhão ao ano, ou ainda 25% do que a InfraCo tem de fazer. Por um lado, o projeto da Telefônica já deixa evidente que a empresa não tem planos — pelo menos, não em cinco anos — de construir rede país adentro, muito distante de seu polo paulista de origem.