Renault: Janela de oportunidade em um dos setores com maior déficit no Brasil (Opy/Divulgação)
Editora do EXAME IN
Publicado em 6 de dezembro de 2024 às 15h55.
Nunca antes na história desse país os projetos de infraestrutura se financiaram tanto via mercado de capitais. Impulsionados pela Selic em alta e por instrumentos isentos, títulos de dívida e fundos estruturados estão atraindo valores recordes e contribuindo para fechar o gap nacional em setores como energia, água, saneamento e transportes.
Fundada em 2020 pela gestora IG4 – especializada em infra e em special sits, de empresas em dificuldades financeiras –, a Opy Health está desbravando um mercado novo dentro do segmento e menos concorrido: o de infraestrutura hospitalar.
A proposta é ser a responsável pelos ativos fixos, como imóveis e maquinários, além da gestão de serviços chamados de ‘bata cinza’, do atendimento à limpeza, deixando para os operadores – seja o SUS ou um operador privado – apenas a parte médica.
“O SUS [Sistema Único de Saúde] sofre tanto quanto o paciente com a falta de infraestrutura hospitalar”, afirma Paulo Mattos, CEO da IG4.
Depois de provar seu modelo com parcerias público-privadas (PPPs) para hospitais em Belo Horizonte e em Manaus, comprados há quatro anos respectivamente das endividadas Andrade Gutierrez e Abengoa, a empresa entrou numa nova fase.
No ano passado, a operação foi vendida para um continuation fund do BTG (do mesmo grupo de controle da Exame), que capitalizou o negócio para uma segunda fase, de expansão.
“Saímos do modo de reestruturação, que era o mandato do fundo da IG4, e passamos para a fase de crescimento”, afirma o empresário. Mesmo com a venda, a IG4 segue como gestora da empresa, agora recebendo um fee pelo serviço.
O plano é investir R$ 1 bilhão entre 12 e 24 meses, seja conquistando novas PPPs e ou contratos no mercado privado. Esse valor diz respeito apenas capital próprio que deve ser aportado, vindos tanto de recursos levantados no fundo quanto de reciclagem de capital reinvestindo os dividendos da carteira atual.
A maior parte dos recursos necessários em cada investida é levantada no nível do projeto, via títulos de dívida. Na prática, R$ 1 em capital proprietário permite uma alavancagem num múltiplo de dois dígitos via estruturas de project finance.
Para crescer, a companhia está trazendo um novo executivo para tocar a operação. Mateus Renault, que fez uma carreira de seis anos na Iguá – holding de saneamento que botou a IG4 no mapa e se tornou uma das principais operadoras do setor no país – está chegando como CEO da Opy.
Nos últimos três anos, Renault tocou a área de novos negócios da Iguá, responsável por projetos importantes para a expansão da companhia, como a vitória no Bloco 2 da Cedae, no Rio de Janeiro, a concessão de Sergipe e a PPP com a Sanepar.
O CFO Rogério Caldas, que tinha assumido interinamente no primeiro semestre, volta à vice-presidência financeira.
“O setor está num novo momento de maturidade”, diz Renault. Se antes as PPPs em hospitais pipocavam aqui e ali, agora já há uma esteira maior de projetos para virem a público nos próximos meses.
Em agosto, a Opy já levou a PPP para construção e operação de um novo hospital e maternidade com 210 leitos em Palmas, no Tocantins, que deve demandar R$ 460 milhões em investimentos.
No radar da companhia, estão ainda PPPs em Porto Alegre, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina já para o próximo ano, além do projeto ambicioso do federal para o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Nas PPPs, as concessões normalmente são contratos de longo prazo em que vence quem oferecer o menor valor de receita a ser recebida ao longo do contrato. No caso de Palmas, serão R$ 2,3 bilhões a serem recebidos ao longo de 30 anos – o que, de cara, aumenta em 30% o EBITDA anual da Opy.
É um modelo parecido com de outros setores de infraestrutura, como o de geração e transmissão de energia, mas com retornos potencialmente maiores. A empresa não crava um patamar de taxa interna de retorno (TIR), mas afirma que elas são maiores do que nos segmentos já mais concorridos.
“É uma janela de oportunidade muito boa. São poucos players que sabem operar bem esse mercado e estamos ganhando cada vez mais escala, em nível nacional, o que nos dá margem para entregar mais rentabilidade”, diz Renault.
“Além disso, são muitas linhas de receita envolvidas nas quais conseguimos injetar mais eficiência, das obras aos contratos de manutenção e limpeza.”
Se os contratos com o setor público, especialmente nas esferas municipal e estadual, costumam levantar algumas sobrancelhas, a Opy diz ter uma estrutura robusta de garantias: os recursos vem sempre os SUS e são garantidos como repasse pelo governo federal. “Essa foi uma educação que fizemos com o mercado, mas hoje estrutura de garantias nos permite captar a valores atrativos”, diz Mattos.
Projetos de saúde ainda não estão entre os setores com isenção fiscal dentro das debêntures da infraestrutura, mas essa é uma discussão que está em andamento no Congresso. “É algo que faz muito sentido”, diz o empresário.
Além das PPPs, a Opy também vê espaço para crescer no setor privado – servindo como provedora de capital para uma gama de mais de 4.500 hospitais em todo o país.
A companhia já tem dois contratos com o Einstein, no Hospital de Urgências de Goiás (Hugo), em Goiânia, com 388 leitos, e no Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia (HMAP), com 236 leitos.
Em ambos os casos, trata-se da vertical de gestão pública do Einstein, em que a rede de hospitais fica responsável pela operação, em contratos como o governo. A Opy, neste caso, atua como prestadora de serviços de bata cinza. “Estamos em conversas para aprofundar essa parceira com o Einstein”, diz Mattos.
Mas a oportunidade vai muito além, especialmente num momento de prestadores de serviço com rentabilidade pressionadas pelas operadoras de saúde.
“Podemos tanto ser provedores de capital para quem quer se desalavancar, por meio de operações de sale and leaseback, quanto quem quer expandir sem colocar muito peso no balanço”, diz Renault.
Aqui, há algumas conversas já em andamento – mas é um modelo novo, que ainda encontra alguma resistência, especialmente de terceirizar a operação.
“Mas é uma curva de evolução. Me lembra muito quando criamos a BR Towers, ainda na GP Investimentos, para ficar com a infraestrutura de torres de telecom: as empresas viam isso como um serviço core, essencial, mas com o tempo viram que podiam liberar capital para ser eficientes em outras áreas que faziam mais sentido para a qualidade e a competitividade.”
Além disso, alguns hospitais já estão em movimentos de M&A e querem vender toda a operação, diz Mattos. Por isso, a Opy não descarta comprar hospitais na integralidade para depois repassar a operação médica para algum player especialista no setor.
Ainda que o modelo da Opy seja novo no Brasil, a empresa não inventou a roda. A inspiração para veio do modelo adotado no Canadá e Reino Unido, que contam com sistemas de saúde que guardam similaridade com o SUS, com financiamento público da Saúde. Mattos fica baseado em Londres.
Nesses países, já há empresas listadas em bolsa que seguem o modelo de propriedade de hospitais como a PHP, que vale 2 bilhoes de libras na Bolsa de Londres, e a Northwestern, avaliada em US$ 1,2 bilhão na Bolsa de Toronto.
A ideia é, em algum momento, também levar a Opy para um IPO. “É um negócio de bons retornos e receita recorrente, com muito crescimento a ser captado, ideal para o investidor de bolsa”, diz Mattos.