BYD e Bahia: foco é tornar região um polo de tecnologia, diz governador (Karina Souza/Exame)
Repórter Exame IN
Publicado em 5 de julho de 2023 às 10h37.
Última atualização em 5 de julho de 2023 às 10h56.
A BYD quer fabricar carros elétricos no Brasil a partir do fim de 2024 -- ou, no limite, no início de 2025. Nesta terça-feira, poucos dias depois de anunciar um novo modelo no país -- e de vender 1.000 unidades em quatro dias -- a empresa deu mais indícios a respeito de como deve construir sua presença local, em evento realizado em Salvador em parceria com o governo da Bahia. O objetivo final, cada vez mais claro, é o de estabelecer uma cadeia de suprimentos completa no Brasil para a produção dos veículos, contemplando iniciativas de capacitação de profissionais, a nova fábrica em Camaçari e até mesmo a atração de outras empresas chinesas especializadas na produção de elétricos para cá.
É um plano de longo prazo, sem dúvidas. Como parte dos primeiros passos, a montadora anunciou uma iniciativa conjunta de trabalho com o governo baiano para desenvolver projetos de pesquisa ligados ao lítio na região. De acordo com Tyler Li, presidente da BYD no Brasil, o foco não é, ao menos por enquanto, focar em exploração do minério. “Queremos trazer para o Brasil a tecnologia capaz de transformar o lítio ‘cru’ em material para baterias”, afirmou o executivo ao EXAME IN.
Por enquanto, segundo a empresa, não há contratos firmados com nenhuma mineradora no Brasil para a extração do material – uma vez que a BYD já mantém fornecedores fora do país. Como de costume, mais dados a respeito de quando o trabalho começa efetivamente não foram dados, com as respostas sobre o tema sempre culminando em uma mesma expressão: “o mais rápido possível”. Hoje, no Brasil, quem se destaca na exploração desse minério é a Sigma Lithium. A empresa, que abriu capital no Canadá, já investiu mais de R$ 2,3 bilhões no país e deve investir pelo menos outros R$ 6 bilhões em produção de lítio ESG por aqui. Em breve, a companhia deve fazer a primeira exportação do minério justamente para a China.
Os planos de pesquisa não foram a única novidade trazida no evento, realizado neste 4 de julho. A inauguração da fábrica de Camaçari, principal motivo para a ocasião, foi ponto presente tanto no discurso tanto de Stella Li, VP Global da BYD, quanto do governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT). O tom de otimismo preservado em outros eventos da montadora também foi repetido nessa ocasião, com dados também já reforçados anteriormente: a BYD pretende investir pelo menos R$ 3 bilhões no país – sendo R$ 1 bilhão já sendo destinado até 2024 – e a geração de 5 mil empregos diretos e indiretos a partir da nova planta estabelecida no estado. Esse montante, vale ressaltar, é apenas o primeiro passo da montadora chinesa no Brasil, com uma capacidade de investimento muito maior do que as cifras já divulgadas.
Em relação à produção propriamente dita, que faz parte do aporte já anunciado, fontes próximas à empresa confirmaram ao EXAME IN que a BYD, de fato, vai ocupar o lugar que pertencia antes à Ford. O contrato, que ainda está em fase final de aprovação, está pendente, hoje, do lado da montadora norte-americana, por causa de negociações envolvendo o montante final da indenização pela saída da empresa do estado -- não custa lembrar, a planta em vias de ser vendida para a BYD é o último ativo da Ford no Brasil.
Além da planta em si, a concessão do porto de Aratu também está sendo discutida pela empresa com o governo baiano, com executivos da empresa chinesa já visitando o local. "É intenção do governo desenvolver esse ponto e estamos aguardando a decisão final sobre como o processo será conduzido", diz um executivo próximo às negociações.
O interesse na infraestrutura já construída em Camaçari pela Ford é óbvio, mas, um ponto menos evidente é a necessidade de adaptações pela qual a estrutura deve passar com a chegada da montadora chinesa. De acordo com uma fonte próxima à negociação, ouvida pelo EXAME IN, o maquinário mais pesado da BYD deve fazer com que pelo menos 75% da fundação da fábrica tenha de ser refeita. Um ponto que reforça a ânsia da empresa chinesa por querer assumir o local em breve – e ajuda a entender melhor o evento desta terça-feira.
Os planos da BYD são de fabricar pelo menos dois modelos de carros na nova instalação, sem confirmação a respeito de quais devem ser. Fato é que o lançamento mais recente, o BYD Dolphin, vendeu 1.000 unidades em quatro dias – o que pode elegê-lo como um candidato para a manufatura local. Mesmo sem a definição de quais modelos serão fabricados por aqui, a BYD já tem uma clara noção a respeito de quanto quer fabricar no país: 150 mil carros por ano nesta “primeira etapa” de investimentos de R$ 3 bilhões, chegando a 300 mil veículos.
Questionado a respeito de como a produção deve acontecer -- se somente com a importação das peças e montagem por aqui ou com a manufatura propriamente dita no Brasil -- Tyler Li reforça que a companhia está focada na segunda opção. "Queremos desenvolver toda a cadeia de suprimentos ligada à produção de carros elétricos no Brasil. Vamos trazer para cá toda a tecnologia necessária para cumprir essa tarefa", afirma.
Enquanto a nova fábrica não vem, a companhia continua aumentando sua presença no Brasil por meio de importações. Além dos cinco modelos já comercializados atualmente por aqui aos consumidores finais, a BYD anunciou nesta quarta-feira que vai mandar 300 veículos elétricos por aplicativo para São Paulo, como parte da parceria iniciada no ano passado com a 99. De novo, trata-se de mais uma ponta atacada pela empresa estrangeira por aqui, mirando uma atuação completa na mobilidade do país. No transporte público, a BYD já tem 20 ônibus elétricos circulando em Salvador, sem falar no VLT baiano e no monotrilho, em São Paulo.
De olho na demanda, o governo baiano anunciou nesta terça-feira algumas medidas para estimular a produção local. Além da isenção do ICMS, prevista em lei até 2032, segundo o governador Jerônimo Rodrigues (PT), uma outra iniciativa também foi anunciada: a isenção completa de IPVA para carros elétricos fabricados na Bahia e que rodem no estado. É um subsídio que vem na linha do que o governo federal já tem feito para estimular o setor. Recentemente, o anúncio de que carros novos que custem até R$ 120 mil possam ter descontos teve alta procura por parte das montadoras que atuam no Brasil.
Para além de estimular o mercado local, esse é um ponto que estava na pauta da montadora chinesa recentemente, com Stella Li, VP global da BYD, afirmando que o governo brasileiro precisava conceder mais subsídios aos consumidores que queiram comprar um carro elétrico.
O Brasil segue sendo um país altamente estratégico para a maior montadora de carros elétricos do mundo. Fontes próximas à companhia afirmam que o país tem uma das transferências de tecnologia mais abrangentes entre todos nos quais a empresa está presente. Hoje, a montadora vende carros em 70 países de todos os continentes.
A BYD segue em destaque, globalmente, desde a pandemia, quando a concorrência com a Tesla ficou mais acirrada e a empresa conseguiu, mês a mês, ultrapassar as vendas da empresa de Elon Musk. Em junho, de acordo com os dados mais recentes, a norte-americana vendeu 466.140 unidades dos veículos em todo o mundo, enquanto a chinesa vendeu 700.244, incluindo os totalmente elétricos e os híbridos plug-in.
Na China, o segundo maior mercado da empresa de Elon Musk, a empresa ficou bem atrás da BYD. Na semana passada, a Tesla anunciou que estava cortando os preços de seus modelos de carros premium no país em mais de 4,5%, após a decisão de distribuir subsídios em dinheiro a alguns compradores de seu sedã Modelo 3.