Exame IN

O apetite da Stone para outras Linx e todas as curiosidades da assembleia

Trio de fundadores da Linx sai com R$ 1,25 bi no bolso, mesmo saldo do modelo polêmico original

Apetite para compras: Stone diz que sonha grande e que Linx é só o começo da jornada (Burak Karademir/Reuters)

Apetite para compras: Stone diz que sonha grande e que Linx é só o começo da jornada (Burak Karademir/Reuters)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 18 de novembro de 2020 às 02h44.

Última atualização em 18 de novembro de 2020 às 13h53.

“Esse é só o começo da nossa primeira jornada”, resumiu Thiago Piau, presidente da Stone, em uma mini-coletiva à imprensa após a aprovação dos acionistas da Linx à aquisição pela companhia. Ele respondia, então, sobre o apetite para novas compras. Não titubeou: “a gente pensa grande, sonha grande”. Sem hesitações, nem mesmo na sequência de uma transação de 6,7 bilhões de reais e 100 dias de polêmicas.

Piau continuou sem querer falar de sinergias. Quando questionado sobre elas, comentou sobre tudo que pode oferecer agora ao seu cliente, com a iniciativa de verticalização mais agressiva já feita pela companhia. Nada de números. Nada de projeções. “Não gostamos de falar desse dado e tomamos muito cuidado com isso porque conduzimos a empresa pensando no longo prazo e não no próximo trimestre.”

O discurso de vencedor da batalha foi quase todo voltado ao próximo desafio da operação: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A transação, que na largada parecia imune a esse tipo de questionamento, acabou atraindo preocupações de rivais do mercado de adquirência, mesmo os muito maiores que a Stone. “O cliente escolhe. Essa é nossa forma de empreender. Não acreditamos em venda casada. Sempre fomos abertos aos parceiros e vamos continuar assim”, diz Piau. A expectativa da Stone, segundo ele, é que o processo de análise leve de três a seis meses.

O executivo também quis passar calma aos funcionários da Linx, após mais de três meses de futuro em aberto. “Os times são muito complementares”, afirma, logo após usar a expressão “abraçar” as pessoas que chegariam. Vamos trabalhar nessa transformação e no planejamento da integração.

Para ele, o negócio vai ser uma grande oportunidade de "contribuir com a digitalização do varejo brasileiro". Além disso, deixa a companhia que sempre foi muito voltada à pequena e média empresa pronta para atender negócios de qualquer tamanho, na avaliação de Piau.

Nos primeiros nove meses de 2020, mesmo com a pandemia, a Stone teve receita líquida de 2,3 bilhões de reais, um crescimento superior a 29%. A base ativa de clientes da companhia aumentou mais de 40% na comparação anual, para 583 mil. O terceiro trimestre teve diversos marcos históricos: volume total de pagamentos, receita consolidada e fluxo de caixa livre gerado, entre outros. Já a Linx, nesse mesmo período, houve aumento de 13,5% na receita líquida, para 643 milhões de reais.

Juntas, portanto, as companhias somariam, de imediato, uma receita líquida da ordem quase 3 bilhões de reais de janeiro a setembro. Em valor de mercado, a Stone encerrou essa terça-feira avaliada em 110 bilhões de reais. Com a Linx, esse total seria de 117 bilhões de reais. Contudo, a empresa adquirida vai passar a se beneficiar dos múltiplos normalmente mais elevados pagos na Nasdaq.

Contudo, essa transação não se trata de uma adição pura simples. O negócio tem caráter estratégico para o posicionamento de futuro da Stone. Não por acaso, Piau falou sobre as transformações do varejo brasileiro e como a união com a Linx prepara a empresa para esse futuro. Quando anunciou o negócio, a ação da Stone era negociada por 50 dólares. Ontem, fechou o after-market em 67,10 dólares — uma valorização de 34%.

Sobre todas as discussões a respeito do formato e a governança da transação, Piau não se ateve a detalhes específicos, limitou-se a tratar de forma geral. “Ao longo do tempo, soubemos ouvir o mercado e tivemos humildade para ajustar a transação conforme as demandas que recebemos. O resultado da assembleia agora fala por si.”

Os números da assembleia envolvem diversas curiosidades sobre o negócio e seu resultado final. Para não cansar o leitor, o EXAME IN optou por destacar em tópicos.

  • O trio de fundadores da Linx Nércio Fernandes, Alberto Menache e Alon Dayan sai da operação com 1,05 bilhão de reais pela venda de suas ações, mais 185 milhões pelo acordo de não competição. Menache recebe ainda 5 milhões de reais por um ano para contribuir na integração. Soma de tudo isso: 1,24 bilhão de reais. *
  • O total final que o trio receberá é rigorosamente o mesmo da operação em seu formato original, mas com uma distribuição diversa. Antes, o total embolsado com a venda das ações seria de 935 milhões. A esse valor somavam-se 225 milhões de reais pela não competição e mais 90 milhões de reais de um acordo de trabalho de Menache como conselheiro da Stone para a área de software por três anos. Soma: 1,25 bilhão de reais*
  • Os dois itens acima significam que, depois de tanta polêmica, a operação caminhou na direção que o mercado queria: o valor no bolso do acionista aumentou e o extra proporcional dos fundadores da Linx caiu.
  • A assembleia contou com a presença de detentores de 138,8 milhões de ações da Linx, o equivalente a cerca de 79,5% do capital. Descontados os acionistas fundadores da Linx e a fatia da Stone, o quórum de mercado foi de 57% do capital total, ou pouco mais de 100 milhões de ações.
  •  Os votos a favor da união das empresas somaram 97,4 milhões de ações, o que equivale a 55,6% do capital total da Linx — e nesse total estão 27,7 milhões de ações dos fundadores e 9,4 milhões de ações da Stone. Considerando apenas os votos de mercado exclusivamente sobre esse quórum, a aprovação foi de 60%.
  • A operação poderia ter sido aprovada sem os votos da Stone, mas em nenhuma hipótese sem os votos do trio de fundadores. O mínimo obrigatório era o 'sim' vindo de 87,5 milhões de ações ou de 73,6 milhões se os fundadores estivessem impedidos.
  • Como os fundadores foram essenciais à aprovação do negócio, a decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de liberar o voto do trio foi decisiva para o resultado
  • A transação, portanto, faz história e jurisprudência
  • A soma de todos os aumentos feitos pela Stone em sua oferta é de 598 milhões de reais. Esse valor é mais do que a multa imposta à Linx caso ocorresse uma transação com a Totvs e mais de três vezes o valor do benefício adicional que os fundadores receberão por um acordo de não competição de cinco anos (185 milhões de reais).
  • Quem tinha 1.000 reais em ações da Linx no dia 10 de agosto, tem agora 1.510 reais

*Os valores de venda contém o preço atualizado da ação da Stone e dos contratos com os fundadores, o preço da ação em torno de 50 dólares - data do anúncio original e do ajuste. Mas a conclusão é basicamente a mesma.

Acompanhe tudo sobre:CVMGovernançaLinxStoneTotvs

Mais de Exame IN

Fim da guerra da cerveja? Pelas vendas de setembro, a estratégia da Petrópolis está mudando

“Equilíbrio fiscal não existe, mas estamos longe de uma crise”, diz Felipe Salto

Mais Porto, menos Seguro: Diversificação leva companhia a novo patamar na bolsa

Na Natura &Co, leilão garantido e uma semana decisiva para o futuro da Avon