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Novo fundo da Valor Capital poderá investir 20% em ativos digitais

Quarto potfólio da casa está perto de fechar captação da ordem de US$ 500 milhões

Graziella Valenti
Graziella Valenti

Editora Exame IN

Publicado em 23 de março de 2022 às 14h08.

Última atualização em 24 de janeiro de 2024 às 15h05.

A Valor Capital, gestora de venture capital fundada pelo ex-embaixador americano Cliff Sobel, está perto de concluir a captação de seu quarto fundo. No total, deve levantar US$ 500 milhões entre a carteira dedicada a empresas em estágio inicial e a 'opportunity', que pode acompanhar os negócios até sua listagem em bolsa. Criada em 2014, a casa tinha captado até então, aproximadamente US$ 450 milhões, em toda sua história.

Como a captação ainda não foi encerrada, a gestora não comenta os planos. Aliás, é quase assunto tabu falar do novo fundo. Mas a carteira, cujos investimentos já começaram a ser feitos, está causando barulho no mercado de capital de risco. E o motivo vai além do valor, sem trocadilhos.

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O novo portfólio vai poder dedicar até 20% de seus investimentos para o ecossistema de criptomoedas e mais a tecnologia blockchain e tokenização — e diretamente em ativos digitais. Isso significa poder adquirir tokens de startups, no lugar de ações. Nas demais carteiras, esse limite estava em 5%. E para passar de 20%, a Valor teria de obter uma autorização regulatória semelhante a de uma corretora, como fez a gigante Sequoia Capital.

É essa vanguarda que está chamando atenção e causando burburinho. Investir em tokens de empresas, no lugar de ações, é uma novidade para a qual muitas gestoras de capital de risco não estão prontas ou, no melhor cenário, começaram agora a avaliar. E muitas startups desse universo já não querem mais fragmentar seu capital em ações, mas sim em tokens. Estar aberto a essa realidade, portanto, coloca a casa alguns passos à frente, nesse ambiente cada vez mais competitivo.

O gosto pela inovação — quase uma obrigação para a gestão de venture capital — está na raiz da Valor. Apesar de ser conhecido como ex-embaixador americano no Brasil, antes de partir para a carreira de serviços públicos, Sobel foi empreendedor e teve sua própria startup, de tecnologia de voz sobre IP. Tudo isso num tempo em que os computadores nem estavam preparados para VoIP e as startups eram, no máximo, chamadas de empresas de garagem.

Nessa época, a tecnologia de VoIP de Sobel foi parar na Netscape. E o que isso tudo tem a ver com o mundo cripto? Tudo.

Marc Andreensen, um dos fundadores da Netscape e depois da empresa de venture capital Andreessen Horowitz, foi quem levou até Sobel a oportunidade na Coinbase e a percepção de que o Brasil seria um terreno fértil para as novidades na frente de criptoativos. Só por curiosidade, vale lembrar que o país tem mais investidores em criptomoedas do que em ações na bolsa de valores.

valor capital michael niklas

Michael Niklas, sócio gestor da Valor Capital: descentralização vai mudar, e muito, modelos de negócios (Valor Capital/Divulgação)

O investimento da Valor na Coinbase ocorreu em 2014, mesmo ano em que o até então familly office de Sobel se transformou em uma gestora com capital de terceiros.  A Coinbase fez sua oferta pública inicial (IPO) no ano passado e hoje é avaliada em pouco menos de US$ 50 bilhões.

Apesar de ser uma das investidas mais conhecidas da casa, a Valor tem um lista de unicórnios em sua carteira, como Gympass, Loft, Merama, Olist, CloudWalk, entre outros. Foi também uma das primeiras a ver valor no projeto de André Street, com a Stone. Os ativos sob gestão hoje somam US$ 2,4 bilhõe, montante que representa os aportes realizados e mais a valorização das empresas — e não inclui os recursos novos.

O universo cripto e a disrupção que o blockchain vai causar é uma das principais teses da Valor. Se a web 1.0 representou a era do consumo da informação pelos usuários, a web 2.0 foi a da geração de conteúdo por aqueles que utilizam a rede. Agora, a web 3.0 será a era em que os usuários se tornarão os donos das redes. “E isso vai mudar muito todos os modelos de negócios”, comenta Michael Niklas, sócio gestor da Valor, em entrevista ao EXAME IN sobre como a casa vê essa nova fronteira de oportunidades.

A gestora tem perto de 20 investimentos em startups relacionadas à disrupção que o blockchain promete causar. Com o novo fundo, esse conhecimento e a inserção nesse ecossistema vão se aprofundar. Para exemplificar o que é essa mudança de paradigma causada pela descentralização, Niklas gosta de citar o exemplo da Filecoin, uma rede de armazenamento de dados feita a partir e para usuários espalhados em qualquer lugar do mundo.

Quando alguém usa o Google Drive ou o Dropbox, guarda informações em um sistema proprietário, por exemplo. O conceito por trás da Filecoin é que qualquer pessoa pode aderir à rede e fornecer a ela um espaço em seus hardwares e softwares não utilizado. Quando faz isso, o usuário recebe filecoins e, se quiser contratar espaço para armazenar dados, paga com essa moeda. “Por que no futuro será necessário a Uber para organizar motoristas e usuários? Os motoristas poderão se organizar e criar sua moeda para esses serviços, uma carcoin, ou algo semelhante”, imagina ele.

São exemplos e possibilidades desse tipo que Niklas gosta de adotar para explicar como a confiança hoje depositada em empresas e prestadores de serviços poderá, no futuro, simplesmente ser transferida à eficiência de algoritmos.

Porte

A criação do quarto fundo é um marco relevante para a Valor Capital e para a indústria brasileira do capital de risco. Nesse mercado, uma gestora ganha credibilidade adicional após concluir a alocação do terceiro fundo. Essa fronteira, uma espécie de indicador de maturidade, abre as portas para uma gama de investidores institucionais parrudos, como endowments e alguns fundos de pensão. Mais capital e mais parceiros à vista.

Com escritórios em São Paulo, Nova York e no Vale do Silício, outra novidade na Valor é a presença no México. Em breve, o novo escritório deve ser inaugurado. É a primeira presença fora do Brasil na América Latina. Sobre essa novidade, Niklas fala com tranquilidade. O Brasil sempre foi visto pela gestora como centro gravitacional da inovação na região, em boa medida, por causa do tamanho do seu próprio mercado doméstico. "A Argentina tem bons empreendedores, mas um mercado pequeno. Chile e Colômbia, a mesma coisa. Mas o México tem um mercado interessante. Já temos três investimentos lá e entendemos que está na hora de uma presença local mais ativa."

Questionado sobre se, além do mercado interno relevante e com uma população que adora novidades, o Brasil pode se destacar em inovação, Niklas demonstra uma certeza que carrega quase indiferença em relação aos céticos. "A capacidade da inovação está globalizada hoje. Essa é uma cultura que já está disseminada pelo mundo", comenta ele.

E, nesse sentido, além de o mercado consumidor ser sim um diferencial relevante como fomento à inovação, Niklas destaca que o Brasil está à frente no processo de digitalização e que isso gera uma enorme riqueza em dados e informação para serem "mineradas".

"Quando decidimos investir na Stone, por exemplo, alguns disseram que éramos loucos para brigar em um mercado dominado por Rede e Cielo. Mas o que a gente via é que se a Stone tivesse 10% do mercado que existia naquela época (muito menor que o atual), já seria um unicórnio", relembra Niklas. O caso deixa para lá de claro porque tamanho de país importa. "No passado, unicórnio era coisa para Estados Unidos e China. Mas há uma explosão deles na Europa, América Latina, Nigéria, Indonésia, África do Sul."

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