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No IPO da Arm, um teste de fogo para o Softbank

Oferta vai colocar à prova a credibilidade de Masayoshi Son e o apetite dos investidores por uma empresa que terá de se reinventar

Arm: monopólio na indústria de chips para smartphones sustenta crescimento baixo ao longo dos próximos anos (mailsonpignata / 500px/Getty Images)

Arm: monopólio na indústria de chips para smartphones sustenta crescimento baixo ao longo dos próximos anos (mailsonpignata / 500px/Getty Images)

Karina Souza
Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 25 de agosto de 2023 às 15h33.

Última atualização em 25 de agosto de 2023 às 15h52.

A Arm, empresa inglesa de design de processadores que domina o mercado de smartphones, deu início ao seu processo de IPO, numa das ofertas de ações mais aguardadas do ano na Nasdaq. Mas o Softbank deve encontrar resistência no mercado para justificar o valuation pretendido na transação.  

A empresa de Masayoshi Son espera algo entre US$ 60 bilhões a US$ 70 bilhões, o que posicionaria a companhia nos mesmos múltiplos da Nvidia, a empresa de chips que vem crescendo em velocidade exponencial em meio ao avanço da inteligência artificial.  

É o dobro dos US$ 32 bilhões pelos quais a Arm foi avaliada em 2016, quando o Softbank comprou a companhia – que vem se expandindo a taxas bem menos impressionantes nos últimos anos.   

Com uma certa crise de imagem depois de perdas multibilionárias no seu flagship, o Vision Fund, a gestora japonesa pode enfrentar algum ceticismo do mercado – e convocou um exército de bancos para ajudar a enfrentá-lo. A oferta está sendo assessora por uma lista impressionante de 28 bancos, com Goldman Sachs, Barclays, JP Morgan Chase e Mizuho sendo os principais.  

Os chips da Arm são amplamente utilizados pelos fabricantes de celulares, principalmente porque eles contam com uma arquitetura inovadora que alia alto desempenho com baixo consumo de energia – ou seja, economia de bateria.  

Hoje, 99% dos smartphones têm a tecnologia de processadores da empresa, que estima que 70% da população global tem acesso a um produto com suas ferramentas embarcadas. O ponto é que o mercado de smartphones, já há algum tempo, não tem crescido no mesmo ritmo. 

A Apple, que concentra 20,5% do market share global dos produtos, tem mostrado vendas de iPhones estáveis desde 2020. Nos três meses encerrados em junho, a receita total da companhia caiu 1%, para US$ 81,8 bilhões, com indicações de que o próximo trimestre mostre um resultado similar. 

Caso a expectativa se confirme, será o maior período de quedas em sequência em duas décadas para a companhia. Mais do que um fato recente, a dependência da Apple smartphones e uma guinada em direção a serviços é discutida pelo menos há cinco anos. 

Esse cenário vem se refletindo na Arm. A receita total no ano fiscal de 2023 (encerrado em março) foi de US$ 2,6 bilhões, queda de 1% em relação ao mesmo período do ano anterior. Na última linha, o lucro líquido encolheu 5%, para US$ 524 milhões. 

É um contexto bem diferente do observado há alguns anos. Em 2015, ano que antecede a compra pelo Softbank e a saída da bolsa de Londres, a companhia reportou receita de US$ 1,4 bilhão, aumento de 15% sobre o ano anterior. Em 2013, o salto havia sido de 22%, para US$ 1 bilhão. 

No prospecto enviado à SEC, a empresa ressalta que nos últimos sete anos vem expandindo sua atuação para setores como cloud, Automotivo e de IoT, em uma economia cada vez mais conectada. 

Porém, ainda pairam dúvidas sobre o valor a ser extraído em cada um deles. Primeiro, é improvável que a Arm consiga a dominância que tem nos smartphones em outros setores. Outro ponto é a rentabilidade. A Arm tem hoje um market share de 65% para IoT e ‘outros semicondutores’, um setor que vem se mostrando menos lucrativo ao longo do tempo.  

A companhia quer justificar boa parte dos múltiplos com sua investida em direção a inteligência artificial. O ponto é que a arquitetura de chips da companhia não é dedicada aos GPUs, que são processadores mais adaptados ao avanço da IA. 

Além da concorrência em menor grau do modelo x86, usado por players como a Intel para desenvolvimento de processadores -- e de certa forma superada na era dos smartphones -- a Arm terá de lidar com um novo desafio nos próximos anos: uma arquitetura open-source (que, portanto, não exige pagamento de royalties) chamada Risc-V. 

Desde 2020, empresas como o Google vêm anunciando investimentos nessa nova arquitetura, fortalecendo a compatibilidade entre o Android e outros processadores de laptops com esse modelo.  

O foco é, justamente, reduzir a dependência de players como Arm e Intel ao longo dos próximos anos. “Risc-V continua perdendo de dez a zero, mas está num estágio inicial, parece promissor. Pelo fato de muitos desenvolvedores já estarem acostumados a trabalhar com Arm, acredito que a empresa ainda deve dominar o mercado pelos próximos dez anos", diz um profissional que atua nesse mercado, ouvido pelo EXAME IN. 

A expectativa de investidores, por ora, é de que a companhia cresça em um dígito ao longo dos próximos anos -- com esforço, chegando aos dois dígitos.  A justificativa, aqui, está ligada ao diferencial competitivo: hoje, usar a tecnologia da empresa traz como efeito menos bugs e menor tempo de desenvolvimento, o que se transforma em eficiência também financeira, no fim das contas.  

No prospecto, a companhia lista o desenvolvimento de novos concorrentes como um dos fatores de risco ao longo dos próximos anos. 

O roadshow com investidores deve começar em setembro, depois do feriado de Dia do Trabalho nos Estados Unidos.  

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