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Na reestruturação da Natura&Co, o problema é o timing – e a falta de confiança

Em mais uma surpresa, momento da saída do CFO faz mercado se questionar sobre futuro da venda da Avon Internacional, principal ralo de caixa da companhia

Natura: João Paulo Ferreira, hoje CEO da operação latino-americana, será o principal executivo do grupo (Germano Lüders/Exame)

Natura: João Paulo Ferreira, hoje CEO da operação latino-americana, será o principal executivo do grupo (Germano Lüders/Exame)

Natalia Viri
Natalia Viri

Editora do EXAME IN

Publicado em 21 de março de 2025 às 14h52.

Última atualização em 21 de março de 2025 às 16h37.

No que tem se mostrado uma constante que já cobra um preço alto nos múltiplos de avaliação, a Natura&Co pegou o mercado de surpresa mais uma vez.

Com a empresa voltando atrás no seu plano frustrado de internacionalização nos últimos anos, os investidores já esperavam a dissolução da holding baseada em Londres – um movimento que potencialmente traz eficiências tanto de custos quanto tributárias.

Era para ser uma boa notícia. Mas a questão foi o timing: a saída do CEO Fabio Barbosa e principalmente do CFO Guilherme Castellan era esperada somente quando a companhia conseguisse uma solução para a Avon Internacional, o ativo mais encrencado do grupo e que se tornou um ralo de caixa.

Como consequência, o anúncio não empolgou, mesmo depois do tombo de mais de 30% nos papéis desde um balanço frustrante na semana passada.

Hoje, as ações chegaram a cair 2,10%, batendo mínima a R$ 9,44, e por volta das 14h, são cotados a R$ 9,68, próximos da estabilidade.

A sinalização da companhia é que uma solução para a Avon Internacional deve ser anunciada “muito em breve”. Ninguém entendeu a ordem dos fatores.

“Enquanto alguns podem interpretar essa afirmação como um sinal encorajador, acreditamos que a sequência de eventos é muito relevante”, escreveu o analista Rodrigo Gastim, do Itaú BBA.

“Preferíamos uma resolução na Avon Internacional antes da implementação da reestruturação corporativa, principalmente dada a saída do CFO, que estava amplamente engajado em navegar esse assunto estratégico.”

A equipe do JP Morgan vai na mesma linha, mas aponta um fator adicional.

“Depois das surpresas negativas dos resultados do quarto trimestre, os investidores estão questionando mais uma vez a capacidade de execução da companhia, e estão sendo empoderados como CEO e CFO do grupo as pessoas que foram as principais responsáveis pela grande frustração”, escreveu Joseph Giordano.

Com a explosão da holding, João Paulo Ferreira e Silvia Vilas Boas, CEO e CFO da operação na América Latina, serão os principais executivos do grupo.

Sem benefício da dúvida

Nas contas dos BBA, a desmontagem da estrutura de holding tem o potencial reduzir de R$ 100 milhões a R$ 150 milhões por ano em custos ligados a corte de custos, equivalentes a algo entre 2,8% e 4,3% do EBITDA previsto este ano para as operações da América Latina.

Além disso, a transferência de uma emissão de bonds de R$ 4,5 bilhões para a subsidiária latino americana pode destravar eficiências tributárias. Outro ponto, sublinhado pela companhia no comunicado, é que a operação aumenta a flexibilidade para distribuição de dividendos, já que a holding tem um prejuízo acumulado relevante, que reduz os payouts.

Ninguém, no entanto, está colocando na conta um aumento da remuneração dos acionistas.

“Dada a persistente volatilidade de lucros na América Latina e a questão não resolvida da Avon Internacional, um aumento no pagamento de dividendos parece pouco provável – uma visão que foi ecoada pela direção durante a teleconferência de resultados”, disse Gastim.

Na ocasião, Guilherme Castellan afirmou que um crescimento da remuneração viria do aumento do EBITDA – uma grande incerteza – mais do que um aumento do payout.

Para um investidor que tinha ações da companhia e se desfez depois dos resultados do quarto trimestre, a grande questão na Natura é que a confiança na execução e nos sinais passados pela companhia se quebrou.

“Em teoria, essa mudança mostra um senso de urgência importante em reduzir custos, se tornar mais eficiente num ambiente mais hostil. A questão é que sempre vem algo diferente do que eles vinham sinalizando”, diz.

“Há três anos, os números vêm poluídos, a empresa não entrega o que promete. Isso parecia ter mudado mais recentemente, mas o balanço do quarto trimestre jogou isso por terra. Esse anúncio foi uma surpresa outra vez. Nunca tem uma história limpa.”

A quebra de confiança fica clara nas expectativas do sell-side. Mesmo após o tombo de 30%, os analistas não veem espaço para compra, em grande parte porque a queda refletiu a revisão para baixo dos lucros. O JP Morgan chegou a rebaixar a ação para neutro – citando um desconto pela “desancoragem” das expectativas.

Nessa altura do campeonato, os investidores só querem saber de resultado – e a Natura&Co vai precisar trabalhar muito para voltar a ter o benefício da dúvida.

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