Carro autônomo da Cruise: Startup controlada pela GM perdeu licença após acidente (GM/Divulgação)
Publicado em 30 de novembro de 2023 às 00h11.
Última atualização em 11 de dezembro de 2023 às 16h14.
A GM anunciou ontem um programa de recompra de US$ 10 bilhões para o próximo ano, o maior da sua história recente, redirecionando para a remuneração de acionistas dos recursos que estavam reservados para o desenvolvimento de carros elétricos e autônomos.
O anúncio é um ponto de inflexão na agenda da CEO Mary Barra, que vem tentando posicionar a GM como uma empresa de tecnologia e foi interpretado pelo mercado como uma tentativa de reassegurar os investidores da força de seu negócio principal.
A iniciativa deu fôlego às ações, que negociavam a quatro vezes seu lucro por ação – o mesmo patamar anterior à pandemia. Só ontem, os papéis subiram quase 10%.
Trata-se de um ajuste quase aritmético. Pelo novo plano anunciado ontem, US$ 6,8 bilhões de ações da empresa – cerca de 17% do seu valor de mercado de US$ 40 bilhões anterior ao anúncio – serão canceladas imediatamente, com o restante previsto para o próximo ano.
Numa conta simples, só isso deve aumentar as projeções de lucro por ação dos analistas em cerca de 20%, aponta o WSJ.
Os recursos devem vir da forte geração de caixa da empresa. A GM aumentou em 38% a previsão de fluxo de caixa livre para 2023 no ponto médio do guidance, que passou para US$ 11 bilhões.
Não ficou exatamente claro como a companhia conseguiu esse feito em meio à uma greve histórica dos trabalhadores de montadoras que custou pelo menos US$ 1,1 bilhão em produção perdida no último trimestre e resultou num acordo que deve pesar sobre os salários nos próximos anos.
Mas o plano passa por uma redução nos investimentos. A GM vinha com dificuldades de aumentar sua produção de carros elétricos neste ano por conta de problemas com a linha de montagem de baterias.
Ontem, Barra afirmou que a companhia deve postergar a inauguração de uma fábrica de caminhões elétricos para o fim de 2025, reforçando a mensagem de que será necessário ir mais devagar rumo a essas tecnologias daqui para frente.
Sinais dessa postura mais conservadora já haviam sido dados no mês passado. Em outubro, a GM encerrou uma parceria de US$ 5 bilhões firmada com a Honda para desenvolver veículos elétricos de baixo custo — apenas um ano depois de começar essa união.
Mais recentemente, a grande aposta da companhia em carros autônomos, a startup californiana Cruise, da qual a GM tem 80% do capital, também desviou da rota, com a perda de licença para operar na Califórnia e uma debandada de executivos, após um acidente que envolveu o atropelamento de uma mulher.
Para além dos desafios próprios da transição da GM, a estratégia vem num momento de dúvidas sobre o quão exponencial será a demanda por carros elétricos. Se ninguém tem dúvidas do avanço da tecnologia, especialmente nos países desenvolvidos, o ritmo de adoção é um ponto de interrogação.
Em outubro, a CATL, uma das principais fabricantes de baterias para veículos elétricos, reportou o trimestre mais fraco desde o início do ano, na esteira de uma demanda mais fraca, resultado principalmente do patamar elevado de juros globalmente. Até a Tesla decidiu adiar os planos para uma fábrica no México.
E a Ford cortou um dos três turnos da fábrica que produz pickups elétricas.
Fato é que o negócio principal da companhia, a fabricação de carros à combustão, ainda vem rendendo bons resultados – que, nos últimos anos, acabaram não se traduzindo no preço das ações na Bolsa.
O programa “acelerado” de recompra, como batizou a própria companhia, pode chamar atenção para a companhia no curto prazo. Mas a dúvida para o longo permanece: como prepará-la para um futuro pautado na energia limpa e ao mesmo tempo conseguir manter bons resultados? É uma equação que Mary Barra ainda não conseguiu resolver.