Israel Salmen, presidente da Méliuz: serviços financeiros vão garantir a melhor picareta para varejistas, na corrida do ouro do e-commerce (Méliuz/Divulgação)
Graziella Valenti
Publicado em 16 de agosto de 2021 às 20h00.
Última atualização em 17 de agosto de 2021 às 15h52.
Uma das novatas de tecnologia da bolsa brasileira, a Méliuz mostrou com seu resultado divulgado nesta segunda-feira, 16, que continua tendo sucesso em uma das métricas mais importantes para o mercado em que atua: crescimento. Em um ano, a empresa quase dobrou sua base de usuários, passando de 10 milhões no segundo trimestre de 2020 para 18,8 milhões em 2021. Em relação ao primeiro trimestre do ano, o aumento foi de 14,6% — cerca de 2,3 milhões de novos usuários entre abril, maio e junho de 2021. Considerando as aquisições das empresas Picodi, Promobit e Melhor Plano, o GMV (vendas totais) também deu um salto de 128% na comparação com o segundo trimestre do ano passado, totalizando R$ 1,1 bilhão.
O mercado, no entanto, reagiu a outro número apresentado no balanço: a companhia saiu de um lucro de R$ 6,5 milhões no segundo trimestre de 2020 para um prejuízo de R$ 6,7 milhões de abril a junho deste ano. O Ebitda, indicador que busca emular a capacidade de geração de caixa das empresas, saiu de R$ 19 milhões positivos no primeiro semestre de 2020 para R$ 2,3 milhões negativos nos seis primeiros meses deste ano. Isso porque no segundo trimestre a linha ficou negativa em R$ 7,2 milhões. Resumo da ópera: o mercado está achando a conta do crescimento muito salgada.
As ações, que começaram o dia valendo R$ 55,49, chegaram a bater R$ 47,47 ao longo da manhã e terminaram o pregão a R$ 48,9, queda de 12,6%. A companhia terminou o dia avaliada em R$ 6,5 bilhões. Desde a semana passada, após a divulgação do balanço do Banco Inter, os investidores ficaram de mal humor, ao perceberem o custo do cashback para o banco digital dos Menin e como o mercado está concorrido — quanto mais acirrada a briga, mais caro custa o cliente. No início de agosto, o papel chegou a R$ 71, com a empresa valendo R$ 9,5 bilhões na bolsa.
Em entrevista ao EXAME IN, Israel Salmen, fundador e presidente da Méliuz, diz que o aumento de gastos operacionais é natural devido ao novo patamar em que a empresa está, que exige investimentos em pessoas. Ele também reforça que o esforço de aquisição de clientes faz parte do negócio. "Estamos aqui para jogar esse jogo no longo prazo, não no curto prazo."
Desde novembro do ano passado, quando abriu capital, o quadro de funcionários da Méliuz passou de 142 para 671 pessoas. A maior parte das contratações é voltada para os times de tecnologia e produto, que somam juntos quase 280 empregados. "Esses investimentos serão colhidos a médio e longo prazo. Muitas pessoas entraram em projetos que estão iniciando, vamos ver o resultado daqui para frente”, voltou a reforçar o executivo, sobre a visão de longevidade. Com isso, a despesa de pessoal saiu de R$ 9,5 milhões para R$ 24,6 milhões, na comparação anual do segundo trimestre.
Salmen costuma explicar que a Méliuz “vende a picareta para a corrida do ouro”. O ouro é a receita, as vendas das varejistas. A picareta é o consumidor. E é isso que a Méliuz é: uma piscina de consumidores. A companhia é, de maneira simplista, definida como um negócio de cashback. Mas não é dessa forma que os fundadores entendem o negócio. Por meio de seu site e seu aplicativo, pluga diversos varejistas e empresas de serviços com milhões de consumidores. O objetivo é que os usuários cheguem ao Magazine Luiza, Adidas, Submarino, Carrefour passando antes por sua solução. Como? Devolvendo parte do valor gasto na compra.
Quanto mais usuários, mais interessante fica como plataforma para seu cliente que são as redes varejistas. Segundo o fundador, a empresa desembolsa investimentos em marketing para atrair o usuário para seu ecossistema, mas depois eles se mantêm ativos sem a necessidade de novas campanhas. “A gente não subsidia compras futuras dos clientes, queremos ter margem em todas as transações”, diz Salmen. O maior esforço de cashback, segundo ele, está na aquisição desse usuário.
Ao longo do segundo trimestre, a Méliuz teve em média 39.000 contas abertas por dia na sua plataforma, com um custo de aquisição de clientes de, em média, R$ 5,65, considerando os R$ 10,2 milhões investidos em marketing e mais R$ 2,8 milhões de gasto extra em cashback para além do padrão. No total, a empresa tem 8,8 milhões de usuários ativos — quase quatro vezes o total do mesmo período do ano passado, quando eram 2,4 milhões. As despesas com cashback subiram de R$ 9,5 milhões para R$ 24,6 milhões, na comparação anual do segundo trimestre — de 38% para 45% como percentual da receita líquida.
Pesou no resultado do Ebitda não apenas o aumento do gasto com pessoal e o cashback , mas especialmente o marketing, que antes da abertura de capital era quase nada. Essa linha registra uma despesa de R$ 181 mil no segundo trimestre de 2020. A decisão de uma startup de listar ações e ir para a Bolsa é justamente conquistar fôlego para acelerar brutalmente o crescimento. É o que a Méliuz está fazendo. Recursos para marketing, seja ele aplicado em propaganda, seja ele usado como cashback, é a meta de dez entre dez novatas com esse perfil que estreiam na B3.
A nova fronteira que a empresa está desbravando é a de serviços financeiros. A receita líquida com essa frente alcançou R$ 8,4 milhões no segundo trimestre, ante a R$ 2 milhões um ano antes. O plano é aumentar o engajamento dos usuários com a plataforma indo além das soluções de compras. A Méliuz oferece desde 2019, em parceria com o Banco Pan (do mesmo grupo de controle da Exame), um cartão de crédito com cashback, que já soma mais de 6 milhões de solicitações por parte dos clientes. Mas desde maio, quando comprou a fintech Acesso, a companhia trabalha para ampliar seus produtos bancários.
Em janeiro de 2022, a empresa vai lançar um novo aplicativo que condensa as frentes de compras e finanças. Para isso, vai se dedicar a oferecer um cartão 100% Méliuz, que dará aos clientes a opção de comprar no débito e no crédito, conforme a evolução da relação com o cliente. “Não vamos oferecer somente o cartão e uma conta digital. Temos estudado a vertical de investimentos, seguros, cripto, temos muitas capacidades”, diz o presidente.
Questionado se considera aceitar pagamento em criptomoedas, Salmen não respondeu - afinal, o pagamento não é para ele - , mas disse que no futuro pode sim, se essa for a vontade do usuário, fornecer o cashback em cripto. Mas não se trata de nada para o curto prazo.
Só o tempo dirá se a frente de serviços financeiros irá ultrapassar a de shopping, mas hoje Salmen vê a área de banking como um meio para ajudar os clientes a converter mais vendas. "Não só levamos os usuários até as lojas, mas vamos dar o que o usuário precisa para finalizar a transação", afirma o fundador.
A percepção de Salmen é que o maior valor para a Méliuz está e vai continuar no segmento de shopping, ou seja, nessa estrutura de ser uma plataforma que facilita a jornada do consumidor. Da receita líquida de R$ 54,5 milhões do segundo trimestre, R$ 46,1 milhões vieram do serviço de shopping. A tese dele é que serviços financeiros terão custo muito baixo no futuro e, assim, pouco valor agregado. A frente de banking, portanto, servirá para garantir que as varejistas tenham sempre a melhor picareta do mercado, oferecida pela empresa.
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