Porto Seguro: com maior diversificação de receita, empresa vem sendo negociada perto das máximas na bolsa (Porto Seguro/Divulgação)
Publicado em 21 de novembro de 2024 às 11h39.
Última atualização em 21 de novembro de 2024 às 11h43.
Após uma alta de 35% no ano e praticamente o dobro da cotação do piso mais recente, em 2022, há quem tenha preferido tirar o pé das ações da Porto Seguro. Recuperada de uma forte queda no pós-pandemia, a companhia negocia hoje no seu maior valor histórico na bolsa, com valor de mercado de R$ 25 bilhões.
Os resultados do terceiro trimestre, contudo, reforçaram o otimismo dos comprados, e levaram uma revisão para cima na previsão de lucro pelos analistas do sell-side – muitos dos quais já tinham elevado sua recomendação para compra nos últimos meses.
Para coroar o bom momento, ainda há a expectativa de que as ações entrem para o Ibovespa, o que tende a aumentar o fluxo para os papéis.
De julho a setembro, a Porto Seguro registrou R$ 739 milhões em lucro, alta de 32,3% na comparação anual e quase o dobro dos níveis registrados durante a pandemia.
Longe de ser uma melhora pontual, o resultado é reflexo de um processo de transformação, com uma melhora além do segmento de seguro automotivo, o carro-chefe da empresa, mas principalmente a diversificação nas linhas de negócio em direção a verticais como planos de saúde e de banco.
Ambas crescem a taxas de mais de 20% ao ano, com bons níveis de rentabilidade.
Essa nova Porto caiu nas graças de analistas, que passaram a recomendar a compra da ação, com BBI, Goldman Sachs e BTG Pactual (do mesmo grupo controlador da Exame) adotando perspectivas mais otimistas para o papel.
“A Porto Seguro sempre foi vista como uma empresa cíclica, muito sensível às variações no mercado automotivo, flutuando de acordo com os preços dos veículos”, avalia Christian Keleti, CEO da gestora Alpha Key, que tem a Porto Seguro como uma de suas principais posições.
“Com a diversificação em outras áreas, a empresa está superando essa dependência e entregando um crescimento mais robusto e previsível.”
A reestruturação da empresa, em quatro verticais – seguros, saúde, banco e serviços – aconteceu ainda em 2023. A lógica foi transformar a Porto numa holding, com mais liberdade para alocação de capital se alavancando na marca forte e na carteira de clientes que construiu como seguradora.
Boa parte do bom desempenho da ação no ano passado veio da melhora na divisão automotivo, com recuperação dos níveis de sinistralidade e melhora de rentabilidade.
A grande mudança, contudo, veio a partir deste ano. Com a nomeação de Paulo Kakinoff, ex-CEO da Gol e da Audi, como principal executivo da companhia, fazer uma boa execução, vencendo o ceticismo do mercado e entregando crescimento nas verticais além de seguro para automóveis.
Além de mais resiliência, a diversificação tem suportado um crescimento do retorno sobre capital investido, que tem ficado acima dos 20% – em linha com o de bancos como o Itaú.
“No curto prazo, esperamos o crescimento do ROE devido a melhoras no mix de seguros, crescimento em saúde e maior rentabilidade em bancos e serviços”, escreveu a equipe do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame) em relatório.
O banco tem recomendação de compra desde junho do ano passado, quando elevou seu preço-alvo para R$ 30 por ação.
Desde então, foram várias revisões positivas, a mais recente levando a expectativa para a cotação ao fim de 2025 em R$ 44 – potencial de alta de 15% em relação à cotação atual. Após o resultado do terceiro trimestre, o analista Thiago Paura já sinalizou potencial para mais altas.
Um dos principais destaques da Porto tem ficado por conta da área de saúde – um segmento ainda subpenetrado e que ainda tem bastante potencial de crescimento, de acordo com o próprio Kakinoff, em entrevista à repórter Raquel Brandão.
No terceiro trimestre, as receitas cresceram 41,5%, impulsionadas pelo aumento de 26% de beneficiários no Seguro Saúde, chegando a 641 mil vidas seguradas. Em Seguro Odonto, o aumento de vidas foi de 28,4%, chegando a 946 mil.
O lucro da área mais que dobrou, atingindo R$ 76,7 milhões. A sinistralidade, por sua vez, recuou, levando a companhia a revisar sua projeção para o indicador do patamar de 77% a 82% para 75% a 79%. (O índice mede o quanto dos prêmios pagos pelos segurados são efetivamente gastos com despesas médicas – quanto menor, melhor.)
A expansão do modelo é sustentada por parcerias regionais com médicos e hospitais, além de um foco planos coletivos para pequenas e médias empresas, com 3 a 99 vidas. A vertical ainda se aproveita de um sistema robusto contra fraudes e uma rede de 6 mil corretores vendendo o produto.
“No segmento de Saúde, o momento tem se mostrado favorável, com a aceleração da carteira enquanto os concorrentes ainda estão focados em aumentos de preços e busca por lucratividade”, avaliam analistas do BTG em relatório.
Aqui, a empresa não descarta buscar um parceiro estratégico para financiar o crescimento – o que, em teoria, pode destravar valor para o acionista ao precificar de maneira mais acertada o negócio dentro do balanço.
Pode ser desde uma parceria com hospitais em determinados bairros, por exemplo, ou algo como a joint venture com a Oncoclínicas, explica o Kakinoff.
“Pode ir desde o mais simples até, eventualmente, uma parceria que envolva aporte de capital para que um estratégico participe de uma maneira mais relevante ainda da geração de valor que a Porto Saúde tem apresentado.”
Nas projeções do BBI, a quantidade de beneficiários deve passar de 540 mil em 2023 para 900 mil pessoas até o fim do próximo ano, impulsionando os ganhos da empresa, que detém apenas 1,2% do número total de beneficiários no país.
O que atrai alguns investidores é exatamente o que espanta alguns outros mais próximos do setor de saúde.
“Tenho medo dessa expansão em saúde. Enquanto a carteira cresce, a sinistralidade cai, por conta das carências e do perfil de uso. O problema é o que acontece quando essa máquina de adição de vidas para de funcionar. Há um risco grande de aumento de custos contratado para frente”, diz o analista de uma grande casa de ações.
Ele já teve posição em Porto Seguro – “uma excelente companhia e bem tocada”, nas suas próprias palavras –, mas encerrou há alguns meses.
Outro segmento que tem ganhado relevância dentro da Porto é o Bank, que tem apresentado o maior crescimento nominal dentro da companhia e chegou a um lucro de R$ 165,4 milhões no último trimestre.
A companhia segue colocando no mercado a oferta de conta digital do Porto Bank para clientes pessoa física e pretende passar a oferecer o serviço a empresas (contas PJ) até o segundo trimestre de 2025.
O foco é, além dos 18 milhões de clientes do grupo, parceiros comuns ao negócio, como corretores e oficinas de reparos de carros, por exemplo.
“Através do Porto Bank, eles podem oferecer antecipação de recebíveis e explorar esse mercado de maneira rentável e com risco controlado”, diz Keleti, da Alpha Key.
Nessa divisão, a empresa conta com a parceria do Itaú, um de seus acionistas, aproveitando sua plataforma para oferecer serviços financeiros de forma integrada.
A colaboração permite à Porto Bank operar em um modelo de "bank as a service", fornecendo produtos financeiros sem a necessidade de uma estrutura própria para competir no mercado de crédito de alto risco.
O ROE foi de 29%, 2,2 pontos percentuais abaixo do registrado no mesmo período de 2023, mas bem acima do patamar de grandes bancos, que trabalham com um balanço mais pesado. O Bradesco, que vive um momento adverso, terminou o último trimestre com um ROE de 12,4%.
Outra vertical fora do sistema de seguros que segue em crescimento é a de Serviços, que registrou um lucro de R$ 52,5 milhões no terceiro trimestre, uma alta de 8,7%.
A divisão oferece serviços de assistência em mobilidade, como guincho e troca de pneus, além de serviços para residências e empresas, incluindo instalação e manutenção de eletrodomésticos e assistência hidráulica e elétrica.
A área atende tanto segurados da Porto quanto clientes do varejo e de empresas.
"À medida que aumentam os contratos com terceiros, o potencial de crescimento dessa vertical cresce, reduzindo a dependência da receita e do lucro da própria Porto," afirmam analistas do BTG.
Com o crescimento das demais verticais, a queda no lucro da operação principal passou quase despercebida. No trimestre, o lucro em seguros caiu 24%, para R$ 429,9 milhões, impactado pelo aumento da sinistralidade devido às enchentes no Rio Grande do Sul.
Na divisão, a sinistralidade vem melhorando, o que deve contribuir para o resultado. Na visão do BBI, um dos mais animados com a divisão, a expectativa é de resiliência.
Um fator importante para calcular o aumento de sinistros é a inflação de veículos. No momento, essa inflação está próxima da média histórica, o que significa que o custo da Porto não deve subir muito. A previsão do banco é de um crescimento modesto nos prêmios da área em 2025.
Diante do melhor momento operacional, a Porto Seguro vê espaço para retomar uma distribuição de dividendos na casa dos 50% do lucro. A companhia tem um excesso de capital de R$ 3 bilhões no balanço, que também pode ser parcialmente equacionado, melhorando o nível de rentabilidade.
“Não damos guidance, mas a tendência que olhamos com naturalidade, dada essa geração de valor, é que nos próximos anos voltemos a ter a nossa distribuição de 50% de dividendos”, diz Celso Damadi, vice-presidente financeiro e de controladoria, investimento e planejamento na Porto.
"Acreditamos que o conjunto positivo de resultados operacionais reforça a perspectiva de crescimento sequencial do lucro líquido, especialmente nas verticais fora do setor de seguros," destacam analistas do Goldman Sachs em relatório.
Embora parte dos ganhos com a diversificação já estejam refletidos nos preços, o sell-side tem um consenso de recomendação de compra.
No mês passado, o Goldman Sachs, por exemplo, revisou o preço-alvo para as ações da Porto Seguro de R$ 43 para R$ 47, passando a incorporar um potencial de alta de mais de 20%.
Keleti também vê espaço para uma reprecificação. "Acredito que a Porto Seguro está em um processo de reprecificação, passando de um múltiplo de 8x para 10x preço/lucro. Em um cenário de juros elevados, a Porto, com seu perfil mais diversificado, tem tudo para ser vista como um ativo ainda mais interessante no setor."