(Eduardo Frazão/Exame)
Repórter Exame IN
Publicado em 24 de fevereiro de 2024 às 11h04.
Última atualização em 26 de fevereiro de 2024 às 11h51.
Aumento das plataformas de investimento, oscilação dos juros, democratização dos aportes mínimos e a popularização de conteúdo na mídia formam o combo de motivos responsáveis por trazer mais pessoas físicas para a bolsa ao longo dos últimos três anos. O público é cada vez mais diversificado, de acordo com um levantamento recente realizado pela B3.
De acordo com os dados, referentes ao período de 2020 a 2023 e que contemplam investidores de renda variável, os maiores aumentos percentuais de novos investidores na bolsa vieram do Norte e do Nordeste, com incrementos de 150% e de 112%, respectivamente.
O volume absoluto ainda é muito menor do que o do Sudeste, região que ocupa o primeiro lugar. Hoje, são 2,8 milhões de investidores, ante 192 mil no Norte e 658 mil no Nordeste. O número reflete a própria concentração de renda do país, evidentemente, mas não ofusca o crescimento das demais localidades fora do tradicional eixo Rio-São Paulo.
O investidor pessoa física é também cada vez mais jovem. Em 2023, as pessoas de 19 a 24 anos respondem por 18% do total de investidores de renda variável. Dez anos antes, esse percentual era irrisório o suficiente pra não ser contabilizado. Em uma visão mais ampla, os investidores de 25 a 39 anos também aumentaram sua participação, passando de 33% para 49% no mesmo intervalo. E desfazendo o estigma de que investir era coisa de gente mais velha.
Um dos motivos que impulsiona esse aumento de investidores é o próprio crescimento das plataformas de investimento, por meio dos agentes autônomos em diferentes regiões do Brasil. “Temos quatro mil assessores de investimento pelo Brasil. No Nordeste, temos escritórios em Feira de Santana, Aracaju e Salvador. São quase 30 assessores, mais de 1 bilhão de reais investidos”, diz Marcelo Flora, head de plataformas do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame).
Outro ponto importante, ainda nesse sentido, tem a ver com o aumento das discussões na mídia a respeito de investimentos, diz Felipe Paiva, diretor de relacionamento com clientes, educação e pessoa física da B3. Isso, somado ao comportamento desse novo investidor — mais familiarizado a testar e errar — tem ajudado a desmistificar a ideia de que, para entrar na bolsa, era necessário ter muito dinheiro.
Hoje, investidores entram na bolsa com valores cada vez mais baixos. Em dezembro do ano passado, a mediana de primeiro investimento das 83 mil pessoas que entraram foi de R$ 128. Mais da metade (57%) entrou com investimentos de até R$ 200.
“Dá para começar a investir com R$ 40, uma cifra que era de R$ 5 mil há cinco anos. Antes, as pessoas achavam que era necessário ter uma quantia enorme de dinheiro guardada e pensavam em investimentos esporadicamente. Hoje, isso já está muito mais disseminado, junto com uma ampla gama de produtos, indo muito além das ações, mas englobando ETFs, BDRs e por aí vai”, afirma Paiva.
Um dos lançamentos de novos produtos que se comprovou um sucesso em pouco tempo foi o Fiagro. Hoje, essa categoria já concentra 500 mil investidores, consolidando a ideia de uma porta de entrada para um dos setores mais representativos da economia brasileira.
“O brasileiro tem duas grandes preferências. Uma é o setor imobiliário, vinculado à cultura do imóvel, e a outra é o agronegócio, para o qual o Fiagro caiu como uma luva”, diz Paiva.
Hoje, na categoria de agro como um todo, são 2,3 milhões de investidores em produtos como CRA e LCA, além do Fiagro. O número de pessoas físicas que investem em produtos vinculados ao agronegócio cresceu mais de 184% na comparação com dezembro de 2021.
Apesar do sucesso dos fundos de investimento, mais da metade (63% dos investidores de agro) têm alocações apenas em LCAs, que contavam com um incentivo fiscal que acaba de ser restringido com uma mudança implementada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Dialogar com esse público depende de um mix de presença local e digital. Em um Brasil cada vez mais conectado — e um país heavy user de mídias sociais, especialmente vídeos — o BTG tem um canal no YouTube com 622 mil inscritos. A XP Investimentos, também referência no mercado de plataformas digitais, tem 393 mil inscritos no canal do YouTube. Isso sem falar no impacto de outras redes, como o Instagram. Essa aproximação tem rendido resultados, principalmente com a população mais jovem.
Daqui para frente, a perspectiva das plataformas é de que a quantidade de pessoas investindo na bolsa aumente cada vez mais, especialmente diante das perspectivas de queda na taxa de juros, que devem terminar o ano abaixo de dois dígitos. Hoje, no Brasil, são 5 milhões de pessoas investindo em renda variável, ante 2,7 milhões em 2020. Ainda assim, o número do último ano se mantém estável desde o quarto trimestre de 2022.
“Há um potencial enorme a ser desbloqueado. Hoje, com base em dados do FGC, há R$ 900 bilhões de reais na poupança, considerando apenas quem tem mais de R$ 10 mil guardados. São pessoas que, sem dúvida, podem ir para outros produtos financeiros”, diz Paiva.
Os saltos mais significativos para a entrada de pessoas físicas na bolsa, olhando para o negócio de plataforma, vieram primeiro no governo Dilma, com os juros a 7,25% ao ano (ainda que depois eles tenham subido para mais de 14% ao ano).
A esse período, se seguiu os juros de 2% praticados durante a pandemia (de novo, sucedidos por juros de 13,75%). Em 2020, o mercado mudou de patamar. Desde esse ano, a média de investidores que fazem ao menos um negócio ao mês está acima de um milhão. No último ano, 1,6 milhão de investidores fez ao menos uma operação no segmento de equities por mês, respondendo por 14% do volume da B3.
“Acredito que a gente está próximo de testar um ambiente nunca visto antes no Brasil, de um período minimamente longo com juros relativamente estáveis. Isso pode produzir um efeito muito positivo para nós como sociedade e de fato mudar hábitos de investidores, que reagem a estímulos de forma imediata. Imagine que fantástico seria ter um período, por exemplo, de quatro anos com juros a 8% e 9%? Seria mais poderoso do que o voo de galinha que vivemos no passado”, diz Flora.