Maquininha da Stone: soluções da Linx casam bem com base de 520 mil clientes da empresa (Leandro Fonseca/Exame)
Graziella Valenti
Publicado em 27 de agosto de 2020 às 16h22.
Última atualização em 27 de agosto de 2020 às 17h55.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) pode até estar preocupado com a concentração horizontal de mercado em uma eventual transação entre Totvs e Linx, já que ambas são empresas de softwares de gestão — e a Totvs já tem cerca de 50% do mercado, de forma geral. Mas quem tem negócio no ramo está mesmo tenso é com o efeito da verticalização Linx e Stone, em especial no setor de varejo. É nessa dobradinha que o produto fica muito apelativo para o cliente nesse segmento. Afinal, varejo é feito com cliente e consumidor é sinônimo de pagamento.
Com receita líquida da ordem de 800 milhões de reais no ano passado, a Linx é alvo de uma disputa entre Stone e Totvs que avaliou o negócio em 6 bilhões de reais. Na B3, a empresa segue com valor de 6,3 bilhões de reais, ainda devido à crença que pode haver uma briga de preço — o que até agora as duas rivais negam estar dispostas.
A própria Linx se qualifica como “a plataforma que move o varejo”. Nesse sentido, complementa o portfólio da oferta da Totvs, não se sobrepõe a ela — pelo menos, não de forma relevante. A própria apresentação da Totvs sobre a operação demonstra isso: enquanto ela está na ponta que relaciona o varejo ao abastecimento, mais concentrada, a Linx está na vertical que relaciona o varejo com o consumidor, muito mais pulverizada.
A questão é que, justamente no varejo da Linx, a tal da maquininha é impossível de ficar sem. “Vai ser muito fácil para elas, juntas, oferecerem a maquininha para quem tem o software e o software para quem usa a maquininha”, traduz Eduardo Vills, sócio fundador da Justa.com.vc — que atua nesse mercado, combinando o serviço de meio de pagamento e crédito, incluindo cartão para pequenos e médios empreendedores. Vills não divulga dados de sua fintech, que tem escritório em Alphaville e em Recife. Mas, para se defender do que pode vir pela frente, está em busca de parcerias com empresas de software. E acha que essas deveriam seguir nessa direção: buscar uniões — comerciais, pelo menos — com empresas de pagamentos.
O Credit Suisse, em relatório de ontem, contou suas impressões após conversar com a Stone sobre a transação com a Linx. De acordo com os analistas, a expectativa da credenciadora de cartões é ter um aval do Cade para o negócio até novembro. A expectativa da Stone é alcançar uma penetração entre 20% e 30% no total de pagamentos da Linx.
A Linx tem hoje uma participação pouco inferior a 50% no mercado de varejo que usa soluções de software, de acordo com dados do Internacional Data Corporation (IDC) — um mercado total de 1,5 bilhão de reais para empresas de software. Contudo, isso representa apenas 14% do mercado que o IDC estima ser “endereçável”, ou seja, que demanda esse tipo de serviço e que poderia movimentar mais de 11 bilhões de reais ao ano.
“É muito difícil saber exatamente quantas pequenas empresas de software existem no Brasil. Algumas medições apontam mais de 3.000 no país. Se eu fosse elas, estaria muito, mas muito, preocupada”, diz Vills, de forma bastante enfática. Na sequência dessa fala, ele explica que é complexo para a empresa de software penetrar nos micro e pequenos negócios espalhados pelo Brasil. Mas esse é o segredo da maquininha e foi, principalmente, uma oportunidade explorada pela Stone, que soube se colocar como solução Brasil a dentro.
O total da carteira de clientes de cada uma das companhias explica que as grandes companhias de software ainda estão — mesmo quando o assunto é varejo — nos negócios maiores. A Linx tinha mais de 70.000 clientes que usam suas soluções, ao fim de 2019. E a Stone, com a maquininha? Quase 520.000 clientes. É mais ou menos por esses números que os investidores gostaram tanto da ideia de uma operação entre as duas empresas — só não gostaram da forma, devido à discussão a respeito de contratos de não competição para o trio de fundadores da Linx, em especial o presidente Alberto Menache.
A Linx já identificou que soluções de pagamento são essenciais. E a companhia não esconde de ninguém, quando questionada, que se a operação com a Stone for aprovada vai buscar oferecer a seus clientes a maquininha da empresa e soluções complementares. E vice-versa. Hoje, a Linx tem uma parceria comercial com a Rede, a empresa do grupo Itaú. Assim como a Linx vem se esforçando para ter soluções de pagamento, a Stone tem buscado oferecer serviços de software de gestão para sua base.
Vills explica que no setor de varejo — em todas as suas diferentes formas, do pequeno mercadinho às farmácias e aos restaurantes — existe ainda uma grande penetração dos provedores de soluções de software regionais, de menor parte. Isso porque muitas vezes a percepção do cliente é que consegue ser atendido com mais facilidade quando contrata alguém próximo. A Stone chegou nesse cliente, a Linx ainda não. Já a Linx está em grandes bandeiras, onde muitas vezes a Stone não consegue estar. Não por acaso, a companhia de software gosta de exibir seus clientes pelo nome. Ao fim de sua apresentação dos resultados do segundo trimestre trás uma lista de logomarcas: entre as nacionais tem Hering, Natura, Melissa, Le Lis Blanc, IMC (Viena, Frango Assado, entre outras), Ipiranga, Benjamin (a padaria do Abilio Diniz), e entre os internacionais expõe nomes como Tod’s, Lacoste, Adidas, L’Occitane, Asics — para ficar nas mais conhecidas. "As pequenas software houses já sobrevivem à Totvs e Linx, mas não sei se sobrevivem à Linx e Stone."