“Diferencial de juro faz diferença para fluxo de capital e, portanto, para a taxa de câmbio”, diz Arruda, do BNP (Fabrice Dimier/Bloomberg/Bloomberg)
Angela Bittencourt
Publicado em 22 de junho de 2021 às 12h11.
O cardápio da semana é para os fortes. A ‘dobradinha’ juro e inflação estará nas mesas de operações do mercado desta terça até sexta-feira, um período de consolidação do Brasil no alto do podium que reúne os países que melhor remuneram os investidores no mundo. Ata do Copom, Relatório Trimestral de Inflação, definição da meta de 2024 e IPCA-15 de junho potencializam a sinalização do BC por ajustes adicionais da taxa Selic que, por tabela, ampliam o diferencial entre juros doméstico e externo e ajuda a valorizar o real ante o dólar. A ata do Copom, divulgada nesta terça-feira, cravou a possibilidade de a Selic acelerar para 5,25% na reunião de agosto.
Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management, que há mais de uma década elabora o Ranking Mundial de Juros e avalia a posição relativa do Brasil em relação a 40 países, mostra que a última decisão do Copom, de Selic a 4,25% ao ano, elevou o juro real brasileiro a 1,92% nos próximos 12 meses ou à segunda posição no ranking global, atrás da Turquia e sua taxa de 6,44% acima da inflação. A distância entre os dois países é expressiva, mas tende a se estreitar com avanços da taxa básica brasileira. É questão de tempo, sugerem as projeções de analistas. Parte deles já vê Selic a 7% ou 7,50% no primeiro trimestre de 2022.
O juro brasileiro está no topo do ranking global e é um dos seis que subiram, em termos reais, entre as 40 economias avaliadas. Por ordem decrescente: Turquia (6,44%), Brasil (1,92%), Rússia (1,91%, Indonésia (1,66%), China (1,03%) e México (0,24%). Os demais 34 países têm juros reais negativos. E a média das 40 economias é negativa em 1,38%, boa medida para apontar a vantagem relativa de aplicações financeiras no Brasil ante a concorrência.
Em junho, mais relevante que o aumento do juro foi a mudança na inflação global. “Os preços avançaram na maioria dos países em função de pressões e choques de oferta ao atacado e aceleração da demanda, em vista ao processo de reabertura de diversas economias. Por essa razão aumentou a ocorrência de juros negativos no mundo”, informa em relatório Jason Vieira.
O economista pondera que mesmo se preservados os programas de expansão de moeda, o movimento global de políticas de alívio monetário perdeu força, com o aumento expressivo do número de bancos centrais sinalizando preocupação com a inflação. Vieira relata que, no geral, entre 168 países, 88,1% mantiveram os juros, 8,3% elevaram e 3,6% cortaram suas taxas. No Ranking Mundial, que reúne 40 economias, 92,5% mantiveram os juros, enquanto 7,5% aumentaram.
Ao contrário do que ocorreu quando a Selic caiu a 2%, devido à redução do diferencial entre juros doméstico e externo, a elevação da Selic tende a atrair mais capital estrangeiro por meio de operações denominadas ‘carry trade’. Nessas operações, os investidores buscam fontes de financiamento com juros mais baratos em alguns países para aplicar os recursos em mercados que pagam mais. O Brasil é forte candidato a atrair esse dinheiro.
Em entrevista ao EXAME IN, o economista-chefe do BNP Paribas, Gustavo Arruda, avalia que o diferencial de juro faz diferença para o fluxo de capital externo e, portanto, para a taxa de câmbio. Porém, quando o diferencial de juros já é pequeno, avalia, qualquer movimento no sentido de mais juros tem impacto maior sobre a moeda. Ao contrário, quando o diferencial entre as taxas de juros já é grande, os movimentos de alta afetam menos o câmbio.
“É importante considerar que o Banco Central está entregando o que está na curva de juros. E o momento também é importante porque o Brasil está praticamente sozinho neste movimento de alta de taxa”, afirma Arruda que considera a apreciação recente do real ante o dólar um reflexo da expectativa e da ação do BC.
Para o economista-chefe do BNP, o Brasil apontando para Selic a 6,5% ou mais, como indicam as projeções do mercado, começa a fazer diferença como sinalização para os investidores. Ele lembra que outros países da América Latina se movem no mesmo sentido de aumento de juros. Mas o Brasil está na frente.
“Chile e Colômbia são dois países importantes ao lado do México que tem juro menor, de 4%, dívida mais baixa. O México está mais preparado [para acolher investidores] em termos fiscais. Os investidores estão atentos, dada a importância de distribuir ou pulverizar o risco nos portfólios. Outro ponto a considerar no fluxo de capital é que o diferencial de juros doméstico e externo interessa também aos fundos brasileiros que estão lá fora e podem retornar com aplicações no país”, completa Gustavo Arruda.
Daniel Castro, CEO da Inter Asset Management, considera saudável o processo de ajuste de juro em curso pelo Banco Central. “É saudável. Não vai haver disfuncionalidade e os portfólios ficarão mais equilibrados. Primeiro, não estamos falando de taxa Selic a 10% ou 14% ao ano e, segundo, estamos em um cenário em que se apresentam várias oportunidades de investimento.”
Ao EXAME IN, Castro pondera que a Inter Asset vê a inflação em 12 meses mais forte, mas haverá um arrefecimento da pressão inflacionária no segundo semestre, ainda que o indicador não volte ao que os analistas esperavam meses atrás. “Desde 2019, assistimos à migração de investidores da renda fixa para a renda variável. O juro mais perto de 6,50% deve mudar esse sinal, mas não vai tirar a atratividade da Bolsa e nem de fundos imobiliários. O investidor vai exigir ‘yield’ maior, mas já vemos a renda fixa e o crédito privado ocupando mais espaço nas carteiras. E isso não vale apenas para papéis atrelados ao IPCA, como debêntures incentivadas, e papéis atrelados ao CDI.”
A Inter Asset defende portfólios mais diversificados e descorrelacionados. “Vamos buscar retorno, mas não em apenas uma classe de ativos. Em portfólios compostos por ativos diversificados por classes ou região geográfica, como Bolsa brasileira e Bolsa mundo, temos essa descorrelação. A Bolsa mundo, por exemplo, não é suscetível às eleições gerais como a que teremos no Brasil em 2022. Portanto, temos mais equilíbrio e com a certeza de que o investidor hoje é mais antenado quanto ao retorno e também aos custos de suas aplicações”, afirma Castro.
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