FLAMENGO EM CAMPO, SEM TORCIDA: time mais rico do Brasil também deve ser o que mais perderá receita (Ricardo Moraes/Reuters)
Lucas Amorim
Publicado em 23 de junho de 2020 às 19h14.
Última atualização em 25 de junho de 2020 às 10h24.
A pandemia do coronavírus, como se sabe, paralisou o futebol no Brasil desde março. De lá pra cá, a receita dos principais clubes brasileiros despencou, claro -- a bilheteria foi a zero, os patrocinadores sumiram, as negociações de atletas foram congeladas e as perspectivas são as piores possíveis para direitos de transmissão.
O quanto será efetivamente perdido ficou claro agora, com um estudo exclusivo da consultoria Sports Value. O impacto, segundo a consultoria, será "brutal". Pior: a baixa digitalização dos clubes deve dificultar também a retomada, na comparação com os grandes clubes europeus.
Segundo um estudo do Deutsche Bank, os 20 maiores clubes da Europa devem perder de 1,2 bilhão a 2,7 bilhões de euros em 2020, e de até 3,9 bilhões de euros nos próximos dois anos. No cenário mais pessimista, a receita encolhe 27%. No melhor, 13%.
O baque no Brasil deve ser maior, segundo a SportsValeu, com metodologia similar à do Deutsche Bank (veja quadros no final da reportagem). A perda mínima será de 1,8 bilhão de reais, 29% menos que os 6,1 bilhões obtidos em 2019. A perda máxima será de 2,5 bilhões de reais -- 37% a menos. "Dependendo de como os clubes reagirem à crise, e como se comportará o mercado de transferências, podemos apresentar receitas similares a 2010/2011", afirma, no relatório, Amir Somoggi, sócio da SportsValue.
As perdas devem vir em todas as frentes de negócio. Em direitos de TV, podem cari até 500 milhões de reais. Em transferências de atletas, de 800 milhões de reais. Em bilheteria, de 410 milhões de reais.
Assim como acontece na Europa, os clubes com os maiores faturamentos devem ser os com as maiores perdas. O Flamengo, por exemplo, que teve receita relevante com premiação, com bilheteria e com patrocínio ano passado, deve perder 43% da receita, segundo a SportsValue -- de 950 milhões em 2019 para 542 milhões de reais em 2020. O Bahia, com a menor receita entre os clubes pesquisados, deve perder 31% -- de 189 milhões para 131 milhões de reais.
"A Europa está mais evoluída e consegue receitas com streaming, com marketing digital. A queda, por lá, deve ser de quatro anos. Aqui, os clubes estão atrasados, e temos problemas estruturais, como a baixa renda média dos torcedores", diz Somoggi.
O problema se agrava, diz o consultor, porque os clubes não vão conseguir cortar custos na mesma proporção. "Será um ano de rejuízos abissais, até porque os clubes brasileiros estão sempre alavancados. A pandemia escancara os problemas de gestão".
A saída, para perder menos e para ganhar no futuro, segundo o consultor, é acelerar a transformação digital dos clibes. "Clubes precisam de uma profunda imersão em inovações tecnológicas, se transformar em incubadoras de startups e aplicar novos conceitos de engajamento de fãs", diz o relatório. Entre as boas práticas sugeridas estão entregas digitais para patrocinadores, monetização de conteúdos próprios e conectar digitalmente torcedors dispostos a consumir a marca dos clubes em novas frentes.
Os exemplos estão em toda parte. O Bahia criou durante a pandemia um serviço de sócio digital. O Atlético Nacional, da Colômbia, turbinou o contato digital entre os atletas e os torcedores. O Barcelona lançou um serviço de streaming com conteúdo produzido em seus próprios estúdios -- o potencial é de 30 milhões de assinantes no mundo.
A pandemia, trágica, pode ser um divisor de águas para o futebol brasileiro.
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