Marcos Leta, da Fazenda Futuro: próximos passos são produtos 'plant based' de "frango e peixe" (Germano Lüders/Exame)
Lucas Amorim
Publicado em 6 de agosto de 2020 às 14h59.
Última atualização em 6 de agosto de 2020 às 16h22.
O mercado de carnes vegetais, ou plant based, é um dos vencedores indiscutíveis da pandemia do novo coronavírus. Em quarentena, os consumidores cozinharam mais, se preocuparam mais com a saúde — e toparam experimentar mais. É um conjunto de ações que beneficiou as companhias que despontaram nos últimos anos para convencer seus consumidores a trocar a carne vermelha — nem que seja alguns dias da semana. Nos Estados Unidos, a Beyond Meat, maior empresa do mundo neste segmento, anunciou nesta semana alta de 195% nas vendas no varejo ante 2019. Para o brasileiro Marcos Leta, a revolução está apenas no início.
Leta lançou, em maio do ano passado, a Fazenda Futuro, startup brasileira de alimentos plant based. Pegou carona na abertura de capital da Beyond Meat para fazer barulho com o lançamento de seu hambúrguer feito com vegetais. Pouco mais de um ano e uma pandemia depois, ele investe para levar a Fazenda Futuro, ou Future Farm, para os principais mercados da Europa e dos Estados Unidos. Seus produtos — além do hambúrguer, ele lançou almôndegas e carne moída — já são vendidos em 40 pontos comerciais da Holanda. Estão entrando também na Alemanha e no Reino Unido e, um mês atrás, foram autorizados a ser comercializados nos Estados Unidos pela FDA, a Anvisa local.
"Temos condições de ser uma companhia brasileira reconhecida mundialmente. Uma marca jovem conectada a um consumidor que se preocupa com saúde e sustentabilidade", diz Leta. "O grande projeto é exportar e agregar valor para os vegetais brasileiros. O maior exemplo de marca brasileira global é a Havaianas, mas não há uma grande marca de alimentos, apesar de o país ser uma potência global."
Ele afirma que a Fazenda Futuro tem vantagens competitivas que permitem sonhar alto. Entre elas estão o baixo preço de vegetais no Brasil, o câmbio desvalorizado e a grande cadeia de distribuidores globais de carne brasileira. "Posso hackear a cadeia para distribuir também a carne plant based", diz.
Além disso, a Fazenda Futuro se estruturou de uma forma mais verticalizada que suas concorrentes globais, o que, segundo Leta, lhe garante agilidade e custos baixos. A Beyond Meat, por exemplo, terceiriza boa parte da produção para frigoríficos tradicionais — e paga por isso. Segundo o empreendedor, uma embalagem com dois hambúrgueres da Fazenda Futuro é vendida na Holanda a 3,89 euros, ante 6 euros em média da Beyond Meat. Ainda assim, ele consegue margem bruta de 44%, ante 34% da concorrente, que ainda não dá lucro.
Detalhe: a companhia americana vale 8 bilhões de dólares na bolsa. A Fazenda Futuro até hoje recebeu um aporte de 8 milhões de dólares dos fundos de investimento Monashees e Go4It, em julho do ano passado, avaliando o negócio na época em 100 milhões de dólares. Os recursos foram usados para ampliar a fábrica da empresa, localizada em Volta Redonda, no interior do Rio, de 115 para 600 toneladas mensais.
É o suficiente, segundo Leta, para sustentar o crescimento da companhia até o fim de 2021 — embora uma aceleração do crescimento possa demandar a entrada de um novo investidor. Em maio, a Fazenda Futuro faturou mais que em oito meses do ano passado — os dados não são revelados. A Beyond Meat produz cerca de 1.200 toneladas por mês e faturou 113 milhões de dólares no último trimestre.
A companhia mira não o mercado vegano, ainda muito pequeno. Quer competir — em volume e qualidade — com o mercado de carnes. No Brasil, é um negócio de 222 bilhões de reais ao ano. Em um ano de negócio, ele já conseguiu abocanhar 20% das vendas de hambúrguer em redes de supermercados como o Pão de Açúcar. Nos países desenvolvidos, o preço dos produtos já compete de igual para igual com o da carne bovina. No Brasil, dois hambúrgueres da empresa custam cerca de 17,90 reais, pouco acima de algumas marcas premium do mercado.
"Queremos evoluir em tecnologia para chegar a uma sofisticação que você não percebe o que é animal e o que é planta. Hoje você ainda percebe, mas no final do ano que vem teremos chegado lá, mas só com 7% de gordura no hambúrguer", diz.
A Fazenda Futuro nasceu da experiência anterior de Leta, na sucos Do Bem, vendida em 2016 para a Ambev. "Se havia oportunidade no mercado de sucos, o de carnes era muito maior. As grandes empresas se especializaram em cortar a carne em partes diferentes", diz. Em 2017, ele visitou a Beyond Meat, que na época faturava 16 milhões de dólares ao ano. E viu o que fazer, e o que não fazer.
Além da fábrica própria, Leta investiu pesado no comercial. Não adianta, segundo ele, investir em tecnologia e ser superinovador sem aparecer nas gôndolas dos supermercados. "Tínhamos a lista de 120 clientes que representam 60% do faturamento do varejo de carnes no Brasil, e botamos nossos produtos em 30 clientes em 2019", diz. Além disso, a companhia está em 2.500 restaurantes, incluindo redes como Bob's e Spoleto.
A companhia segue investindo para lançar novas "carnes", como de frango e peixe — até atum em lata está em desenvolvimento. Tudo num frigorífico com maquinário semelhante ao tradicional, mas com uma diferença fundamental: sangue, por lá, só o de beterraba.