Exame IN

Enjoei tem disputa de fundos para ancorar IPO de R$ 1 bi

Plataforma que nasceu a partir de um blog tem hoje 23 milhões de visitas mensais

Enjoei: escritório em São Paulo, empresa tem quase 200 funcionários (Larissa Gomes/Divulgação)

Enjoei: escritório em São Paulo, empresa tem quase 200 funcionários (Larissa Gomes/Divulgação)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 21 de setembro de 2020 às 16h24.

Última atualização em 21 de setembro de 2020 às 22h19.

Em meio a uma chuva de IPOs que deve fazer de 2020 um ano de recordes, uma companhia pequena e ainda sem lucro tem se destacado e já está sendo chamada por muitos de a “mais sexy” da temporada: a plataforma eletrônica de venda de moda usada Enjoei. A oferta de ações da empresa deve ser de pelo menos 1 bilhão de reais, com parcela primária e secundária — ou seja uma fatia do dinheiro para a empresa e outra para os sócios que decidirem vender parte de suas ações, conforme fontes próximas à operação. Isso se nada mudar no mercado, cada dia mais azedo devido às preocupações com o futuro macroeconômico do país.

Nos IPOs da pandemia, no Brasil, nem startup faz oferta pequena. Com a desvalorização cambial, a operação em dólares não é grande, mas em moeda local é significativa. E o investidor doméstico têm sido o principal comprador, absorvendo mais de 60% das colocações.

A Enjoei deve ser levada oficialmente aos investidores um pouco mais à frente. Mas o EXAME IN apurou que, desde já, a demanda cobriu o valor da oferta. Há inclusive disputa pela posição de ancoragem do IPO — os fundos que colocam propostas maiores para dar robustez à transação — e para conhecer a fundadora Ana Luiza McLaren.  Isso porque tudo começou em 2009, com um blog que ela montou para vender roupas usadas e que foi crescendo no boca-a-boca até virar realmente uma empresa, em parceria com o marido Tiê Lima, a partir de 2012. Hoje, a plataforma tem mais de 23 milhões de visitas por mês e uma lista de serviços que vão desde logística, seguro anti-fraude até uma carteira virtual, e que recebe a cada semana 350 mil novos produtos cadastrados.

A avaliação para toda a companhia é de 2 bilhões de reais e, nas conversas iniciais com investidores, esse número tem mostrado “aderência”— em outras palavras, os compradores estão vendo sentido nesse preço. O valor total das vendas (GMV) realizadas na plataforma alcançou quase 200 milhões de reais no primeiro semestre deste ano. Só que o ritmo de crescimento é tal que somente em julho chegou a 45 milhões de reais, o que em 12 meses daria 540 milhões. Pelo dado anualizado de julho, a Enjoei pode estrear valendo quase 4 vezes seu GMV.

Com GMV de julho, Enjoei vira plataforma com movimento de R$ 500 milhões ao ano

O tal do “take rate”, ou seja, aquilo que fica com a Enjoei estava acima de 26% no segundo trimestre. No balanço de janeiro a julho, a companhia teve receita bruta de 47,4 milhões de reais, um aumento de 46% na comparação com o mesmo período do ano passado. Mas, quando observado separadamente, o mês de julho tem faturamento de quase 10 milhões de reais, o que é mais de 70% de expansão na comparação anual.

No balanço dos primeiros sete meses do ano, a Enjoei já ultrapassou o break-even na linha do Ebitda, quando as receitas mais do que cobrem as despesas. A companhia ficou positiva em 218 mil reais no período, comparado a 4,4 milhões de reais negativos no ano passado. A última linha, porém, ainda está no vermelho: prejuízo de 4,55 milhões de reais no intervalo, ante aos 6,75 milhões de reais do mesmo período de 2019.

A falta de lucro e uma vida cheia de emoções pela frente — o que inclui ter de dar conta de administrar uma quantidade de dinheiro que nunca teve antes, no pós-IPO — é o que torna startups um investimento para profissionais ou apenas para os mais resilientes, segundo especialistas.

O Mercado Livre, por exemplo, que lá na sua origem começou como um comércio eletrônico dedicado a usados até se expandir para um marketplace de produtos novos e pequenos varejos, é avaliado hoje por 60 bilhões de dólares, mais de duas vezes o GMV anualizado. É atualmente a maior empresa da América Latina em valor de mercado, acima de nomes como Petrobras, Vale, Itaú e Ambev. O múltiplo maior da Enjoei em relação a redes para lá de estabelecidas é o que sempre está por trás das startups: velocidade de crescimento.

Embora a plataforma tenha produtos como eletrônicos e para a casa, o foco é moda. O entendimento da empresa, que hoje tem quase 200 funcionários próprios, é que a especialização em moda é seu principal diferencial.

Depois que virou empresa, a Enjoei foi agregando acionistas. Nesse caminho, atraiu Monashees e Dynamo. A primeira, uma das casas nacionais mais renomadas no venture capital e a Dynamo, reconhecida pela análise de fundamento das companhias nas quais investe.

A Monashees chegou primeiro, ainda em 2013. No ano seguinte veio o fundo americano Bessemer Venture Partner, quando o site passou a ter também o aplicativo para dispositivos móveis, como celulares e tablets. Atualmente, cada qual tem 15,5% e 18,5%, respectivamente. A Dynamo, por sua vez, detém pouco menos de 9%. Quem também é acionista da Enjoei é o Grupo Globo, que aportou 22 milhões de reais em dezembro de 2018 em verbas para mídia fora da internet.

Negócio fundado por Ana Luiza McLaren, atraiu sócios estrelados como Monashees, Dynamo e Globo

Até 2017, a Enjoei se dedicava apenas à intermediação das vendas. A partir de então, lançou o EnjoeiPro, serviço com taxas mais altas, mas que envolve toda a gestão do processo para o vendedor. Desde a retirada das mercadorias, triagem, até fotografia e oferta de preço. No modelo da Enjoei, cada vendedor tem sua própria loja dentro de um ambiente de rede. Por causa desse formato individualizado, com aparência de rede social, muitas celebridades também vendem seus itens na plataforma. Estão lá, Isabella Fiorentino, Cleo Pires, Julia Petit, Bia Paes de Barros, a influencer Camila Coutinho, entre outras.

Como todo marketplace, o maior desafio da Enjoei é não ter barreira de entrada. No mercado de novos, por exemplo,  qualquer varejista de porte médio que tenha solução digital agora quer ser marketplace. O desafio, portanto, é dobrado. Como não há barreira para novos competidores surgirem e desenvolverem canais semelhantes, deve haver um esforço de retenção da base e conquista de novos. Tudo isso exige um investimento contínuo em inovação e qualidade dos serviços associados. Para completar, muito gradualmente, as grandes marcas começam a estudar formas de elas próprias criarem marketplaces para seus produtos usados, em linha com a tendência e cobrança por um mercado de moda que seja mais consciente no estímulo ao consumismo — alinhado aos princípios ambientais, sociais e de governança (ESG) .

Só o tempo vai mostrar se a vida da Enjoei na bolsa será tão estrelada como sua base de vendedoras e acionistas pré-IPO.

 

 

 

 

Acompanhe tudo sobre:AmbevDynamoGloboItaúMercado LivreValeVibra Energia

Mais de Exame IN

Renner vem bem no terceiro trimestre – mas não tão bem quanto se esperava

Vinci compra controle do Outback no Brasil em operação de R$ 2 bi

Magazine Luiza lucra R$ 70 milhões no 3º tri e bate (de longe) consenso

Para lidar com juros altos, Assaí reduz alavancagem e fica menos promocional no 3º tri