Rompimento de barragem: BHP pleiteia responsabilidade da Vale na Corte de Londres (DOUGLAS MAGNO/AFP/Getty Images)
Repórter Exame IN
Publicado em 12 de julho de 2023 às 10h13.
Última atualização em 12 de julho de 2023 às 10h55.
A ação coletiva movida contra a BHP pelo rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, em 2015, ganhou novos capítulos nesta semana. Nesta quarta e quinta-feira correm as audiências para definir se a Vale também poderá ser responsabilizada pelo fato ocorrido há oito anos. A informação se tornou pública no pool de processos que correm em Londres, apontando que a BHP pleiteia, nessas discussões, que a maior empresa privada brasileira arque com "50% ou mais" do valor da causa. Ou de qualquer outra penalidade que a empresa possa sofrer na corte local.
Para entender o que isso significa, é necessário fazer uma breve viagem ao passado. O processo, que começou pouco depois do desastre em Minas Gerais, é movido pelo escritório Poogust Goodhead, afirmando que tem 720 mil reclamantes e pleiteando 36 bilhões de libras em indenizações (um valor não confirmado oficialmente, mas divulgado na mídia local). Caso confirmada, a cifra representa a maior ação civil pública envolvendo uma empresa privada no Reino Unido.
A Samarco, empresa que detinha a barragem de Fundão, era uma empresa formada por 50% da Vale e 50% da BHP -- o que ajuda a entender, de largada, o pedido para que a empresa brasileira arque com 50% do valor da indenização pleiteada na corte britânica. De onde vem o "ou mais", então? Principalmente de um documento emitido pelo Ministério Público brasileiro, segundo fontes próximas ao processo ouvidas pelo EXAME IN.
O documento, feito a partir de 26 acusações contra as mineradoras e pessoas físicas, em especial engenheiros e peritos que avaliaram a segurança da barragem, constatou que, entre 2008 e 2015, a Vale depositou rejeitos na barragem de Fundão. Especificamente, esse ponto está na página 161 da denúncia do MP. Segundo o documento, os rejeitos colocados pela Vale no local correspondiam a 27% do toda a lama depositada entre 2008 e 2015 na barragem de Fundão.
“Sem sua contribuição, ainda que o planejamento fosse impactado pela interferência das obras no reservatório do Dique 1, a cota do reservatório de lama não teria ultrapassado a cota do reservatório arenoso, fazendo com que a lama avançasse por sobre o rejeito arenoso já depositado, e implicando ainda em descumprimento da premissa de praia mínima de 200 m.”, afirma o documento.
A petição corre em segredo de Justiça. A expectativa da BHP, segundo fontes próximas ao processo, é que a inclusão da Vale no processo considere estes fatores: o fato de que a Vale ser acionista direta na Samarco (diferentemente da BHP, que investia por meio de subsidiárias), o fato de que a empresa brasileira estava presente no dia a dia da operação e, principalmente, o fato de que usava a barragem que rompeu. Hoje, para lembrar, a BHP é a única ré na ação que corre em Londres.
A decisão sobre a responsabilidade da Vale deve ocorrer até outubro deste ano, mas isso nem de longe significa o fim do processo completo. Em outubro do ano que vem serão realizadas as audiências para definir se a BHP pode ser responsabilizada pelo acidente da Samarco e, só então (em caso afirmativo) terá início a fase de indenização, onde terá de ser provado que os 720 mil reclamantes foram prejudicados e seus respectivos montantes pelo rompimento.
A ação de classe movida pela Corte de Londres veio depois de acordos firmados pelas empresas (Samarco, Vale e BHP) no Brasil após o rompimento das barragens. O Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) firmado entre elas e o governo brasileiro foi responsável por criar a Fundação Renova, instituição responsável por indenizar os prejudicados pelo rompimento da barragem.
De acordo com os dados oficiais, até março deste ano, foram investidos R$ 28,1 bilhões em iniciativas de reparação e compensação para mais de 410 mil pessoas. E estão previstos mais R$ 8,1 bilhões neste ano, 60% destinados a pessoas e comunidades.
Também corre no Brasil um processo criminal, fruto da denúncia do MP (que gerou o documento citado acima), mas que, até o momento, não teve conclusão.
Procurada pelo EXAME IN, a BHP não se manifestou. A reportagem também abriu espaço para a Vale se pronunciar e, quando houver retorno, a matéria será atualizada.