Eletrobras: assembleia de acionistas elege hoje novo conselho de administração, que pode chegar já com duas baixas na chapa formada (Bloomberg/Getty Images)
Beatriz Quesada
Publicado em 5 de agosto de 2022 às 13h52.
Última atualização em 5 de agosto de 2022 às 19h10.
Depois da privatização, os analistas de investimento estão retomando a cobertura das ações da Eletrobras (ELET3/ELET6). A companhia, que foi avaliada em quase R$ 100 bilhões, na megaoferta de R$ 34 bilhões, deveria valer pelo menos 25% mais. Essa é a visão mais conservadora entre cinco grandes bancos de investimento: Bank of America (BofA), BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME), Credit Suisse, Itaú BBA e JPMorgan.
Os especialistas no setor de energia estimam que as ações deveriam ser negociadas entre R$ 62 e R$ 71. No piso do cálculo, a ex-estatal valeria R$ 142,5 bilhões e, no teto, R$ 163,5 bilhões — tomando-se as ações preferenciais classe B (ELET6) como base de valor para todo capital social. Na oferta que marcou a pulverização do capital da Eletrobras, os papéis foram vendidos por R$ 42. Atualmente, os papéis são negociados por cerca de R$ 50, com a empresa avaliada em R$ 113 bilhões.
Mais do que retomar a cobertura, os analistas das cinco casas escolheram as ações da companhia como sua preferida em todo setor de utilities, que engloba serviços essenciais como energia, água e gás natural. A Eletrobras já era bem-quista no mercado considerando seu tamanho: a empresa é responsável por 28% da capacidade de geração instalada no Brasil e detém quase metade das linhas de transmissão do País. Outra notícia antiga é o valuation atrativo, somado ao pagamento de dividendos que torna a empresa uma das favoritas do setor.
O que muda, então, com a privatização? Os analistas projetam que a companhia possa entrar em uma nova fase para seus negócios, ainda mais valiosa, apoiada em quatro pilares: mudança de gestão, corte de custos, reprecificação do portfólio elétrico e renegociação de dívidas.
O primeiro passo começa nesta sexta-feira, 5, com a eleição do novo conselho de administração — em assembleia de acionistas que acaba de começar, marcada para as 13h30. O conselho será responsável pela escolha do novo CEO e pela definição da estratégia da companhia até 2025. Existe grande expectativa de que Wilson Ferreira volte ao comando da Eletrobras, após deixar o cargo em janeiro em meio a pressões contra a privatização.
A chapa indicada para o novo conselho tem cinco novos nomes: Ivan Monteiro, ex-presidente da Petrobras; Carlos Augusto Leone Piani, ex-presidente da Equatorial Energia; Octavio Cortes Pereira Lopes, ex-conselheiro de Light e TokStock; o especialista em gestão Vicente Falconi e o advogado Marcelo Gasparino, que também é conselheiro de Vale e Petrobras. Além disso, foram indicados na chapa, como recondução, Daniel Alves Ferreira, Felipe Villela Dias e Marcelo de Siqueira Freitas. Pedro Batista foi indicado por acionistas preferencialistas, para votação em separado.
Dessa lista, dois já se tornaram impossíveis de serem eleitos: Octavio Lopes, pela indicação para presidência da Light, e Carlos Augusto Piani, que teria renegociado sua permanência no conselho da Equatorial — ambos, portanto, estariam em situação de conflito. Caso se confirme que de fato eles não permanecem, o conselho perde os principais indicados que entendem do setor. De qualquer forma, apesar de vários nomes conhecidos para composição do colegiado, o otimismo maior mesmo está em torno do esperado retorno de Wilson Ferreira.
Ferreira foi responsável por um bem-sucedido processo de turnaround na então estatal que preparou o terreno para a privatização da empresa com a estruturação de uma governança interna quanto a reorganização envolvendo as diversas controladas. Nos cálculos do BTG, a influência positiva da gestão de Ferreira pode ser encontrada no aumento da margem Ebitda, que passou de 30% em 2016, quando assumiu, para 40% em 2021.
No Itaú BBA, a expectativa dos analistas é que o executivo possa ser anunciado como CEO ainda hoje, ou já na próxima semana, destravando valor para as ações. “A empresa não está mais limitada por ser uma estatal, e a gestão agora terá muito mais flexibilidade para implementar as mudanças que podem torná-la uma das melhores companhias de utilidades do mundo”, afirmaram, em relatório.
Uma das transformações esperadas da nova gestão é um corte de custos significativo — comum na transição de uma companhia estatal para privatizada. O JPMorgan ressalta a desconsolidação da Eletronuclear como um corte relevante, com redução de 1,6 mil funcionários do quadro. Os cálculos estimam que o processo pode reduzir as despesas com vendas, gerais e administrativas em 40% em relação aos níveis de 2022.
“A Eletrobras deve trabalhar com consultorias para reduzir custos e otimizar as operações existentes, indo além do que era possível melhorar como empresa estatal. A magnitude e a velocidade do corte de custos serão monitorados pelo mercado e pode ser uma importante fonte de upside [potencial de valorização] ou downside [potencial de queda]”, informa o relatório do banco.
A atenção dos analistas se volta ainda para o potencial de reprecificação do portfólio elétrico. Após a privatização, 22 hidrelétricas da companhia irão sair do atual regime de cotas, que só remunera operação e manutenção e no qual o risco hidrológico é alocado ao consumidor. As usinas irão passar para o regime de produção independente, o que dá mais liberdade de comercialização para a companhia.
“Ao aderir [ao regime de cotas], a Eletrobras concordou em vender energia para as empresas de distribuição do Brasil a preços muito mais baixos. Agora, como parte do processo de privatização, o fim do regime de cotas permitirá que a Eletrobras venda livremente essa energia em condições muito melhores”, argumentam os analistas do BTG.
A Eletrobras possui um total de R$ 34 bilhões em provisões para contingências, incluindo R$ 26 bilhões em empréstimos compulsórios. Adicionalmente, o passivo total dos fundos de pensão atinge R$ 5,7 bilhões.
Os analistas do Credit Suisse lembram que, como empresa estatal, a Eletrobras não poderia negociar acordos ou buscar diferentes pareceres jurídicos para ajudar a reduzir os montantes totais em disputa. Com a companhia privatizada, a situação pode ser diferente.
“Lembramos que a CESP [agora Auren Energia] conseguiu reduzir seu passivo total acima de 40% [com a privatização]. Consequentemente, decidimos incluir um haircut [desconto na renegociação da dívida] de 20% nas provisões registradas e permitir que a empresa pague os valores devidos em parcelas [como um reconhecimento de dívida]. Acreditamos também que a Eletrobras poderá se beneficiar dos créditos tributários decorrentes das perdas contabilizadas com essas provisões”, defendem os analistas.
O BofA acrescenta que, em privatizações passadas, o potencial de redução da dívida rondou entre 20% e 30% do valor original. “É um cenário particularmente provável para a Eletrobras pois muitos desses passivos têm como contraparte investidores financeiros, que adquiriram recebíveis contenciosos com desconto de outras partes”, informa o relatório.
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