Futebol: a paixão nacional tem um enorme potencial comercial com novas tecnologias e grupo SBF agora tem plataforma para explorar oportunidades (Miguel A. Lopes/Reuters)
Graziella Valenti
Publicado em 17 de janeiro de 2022 às 09h30.
Última atualização em 21 de janeiro de 2022 às 11h19.
O Grupo SBF, dono da rede de varejo esportivo Centauro e da distribuição da Nike no Brasil, deu a largada na rota que planeja usar para acelerar a construção de um amplo ecossistema dedicado ao esporte e que vá além do mundo físico. Em junho do ano passado, após a compra da NWB, que reúne os canais digitais Desimpedidos, Acelerados e Falcão 12, foi estruturada a SBF Ventures. E nesta segunda-feira, dia 17, a empresa anunciou o primeiro movimento todo orquestrado já dentro dessa nova estrutura: uma sociedade com a Sportheca, um éstúdio de startups também voltado ao esporte, para a criação da Onefan Ativos Digitais, uma plataforma que vai explorar o universo do futebol no mundo digital.
“Não há hipótese, em um país como o Brasil, em que esse tema é paixão nacional, de se pensar em ser relevante sem essa frente”, afirma Gustavo Furtado, general manager da SBF Ventures, em entrevista exclusiva ao EXAME IN. A participação do grupo na Onefan ficou, neste momento, em 30%.
A Centauro teve receita bruta de R$ 2,34 bilhões nos primeiros nove meses de 2021 e, desse total, R$ 616 milhões foram vendas digitais – expansão de 10% e 63%, respectivamente, em relação a 2019. O faturamento bruto da operação da Nike foi de R$ 2,27 bilhões nesse período, levando o grupo SBF como um todo a um total de R$ 4,3 bilhões de janeiro a setembro, após a eliminação das vendas entre as empresas.
O objetivo da SBF Ventures, que conta com um time de 20 profissionais dedicados, é mapear as possibilidades de aquisições, sociedades e parcerias na área digital e tecnológica para impulsionar o crescimento do grupo. “Fazer o investimento é apenas o primeiro passo. Nosso papel é contribuir com a gestão para que possamos de fato capturar valor com a forma como promovemos as integrações. Somos uma espécie de esquadrão de elite que vai atuar nisso. Não é sobre ser um conglomerado, mas um ecossistema, que realmente dá musculatura às teses inovadoras.”
O valor da transação com a Sportheca não é revelado, mas normalmente os tíquetes das operações com startups são pequenos, comparados, por exemplo, à compra da Fisia, que faz a distribuição da Nike no país, e que movimentou R$ 900 milhões — aquisição feita pela Centauro menos de um ano após a realização da oferta pública inicial (IPO) na B3 e que foi o catalisador de uma nova oferta de ações, em 2020. A relevância desses negócios está justamente naquilo que pode ser construído a partir deles.
A sportech Onefan dá a largada na sua atividade com um aplicativo “white label” desenvolvido dentro da Sportheca que os clubes de futebol podem usar para digitalização de seus negócios, como infraestrutura para seus apl—icativos oficiais. “Poucas relações são mais fortes do que a dos torcedores com seus times do coração. Mas os clubes no Brasil não estão aparelhados para desenvolver sozinhos essa potencialidade. Além das oportunidades que já existem e que ficam na mesa, o futuro promete. Os NFTs já são uma realidade, por exemplo”, enfatiza Furtado.
Estudo realizado pela Sports Value no fim de setembro do ano passado, mostrava que os clubes brasileiros podem gerar mais receitas com ativos digitais do que com patrocínios. Somente com as redes sociais, poderiam ser produzidos mais de R$ 500 milhões e outros R$ 360 milhões poderiam vir com tokens, NFTs e outras novidades. Os números são animadores, mas não se deve esquecer que o futebol brasileiro é um dos mais atrasados quando o assunto é organização e exploração comercial da marca.
Outro estudo da mesma casa feito no ano passado aponta que o esporte no país responde por apenas cerca de 2% do que é movimentado no mundo com essa paixão a enormidade de US$ 300 bilhões. “O Manchester United, por exemplo, é na verdade uma empresa de entretenimento que também tem um clube”, comenta Furtado.
Hoje, a plataforma digital que ficará na Onefan já está por trás dos aplicativos oficiais do Flamengo, Fortaleza, Atlético Mineiro, Coritiba e até mesmo alguns times na Espanha. “Chamou muito nossa atenção que, sem investimento em marketing, essa espécie de super app criado pela Sportheca, algo que inclusive pensamos em fazer internamente, já tem mais de um milhão de usuários, com um engajamento muito relevante do público.”
De acordo com o executivo, existe um mundo de soluções que podem ser criadas em conjunto com os clubes e que vão dar a eles a capacidade de reunir dados sobre seus torcedores de uma forma que hoje eles não conseguem fazer sozinhos. E o grupo, segundo Furtado, é totalmente flexível na forma pela qual pode capturar sinergias comerciais junto com os clubes, que podem ir além do resultado e das receitas da própria Onefan. As estimativas apontam que o universo de torcedores no país é da ordem de 160 milhões de pessoas.
Ele conta que, antes mesmo da decisão do co-investimento com a Sportheca para a criação da OneFan, as empresas já estavam trabalhando em conjunto e até mesmo realizando diversas reuniões comerciais. “Desenvolvemos uma apresentação conjunta perfeita e vimos, então, que esse movimento de associação fazia muito sentido.” O executivo lembra que a Centauro e a Nike já possuem uma forte relação com os clubes, seja por vender os produtos oficiais, seja por licenciar a marca para desenvolver produtos. Além disso, a plataforma também é uma solução possível de ser exportada e com potencial de gerar receita internacional, com um câmbio extremamente atrativo para isso.
Furtado conta, sem relevar os resultados, de uma ação realizada com o Fortaleza, que mostra como nesse caso as sinergias vieram até mesmo antes da transação financeira. Foi realizada uma votação no aplicativo do clube sobre o que os torcedores gostariam de ver concretizado e o resultado foi a escolha de uma sala de troféus. Então, foi feita uma campanha conjunta, por meio do aplicativo, na qual 5% das receitas geradas pelos torcedores do clube nas lojas da Centauro ou nas compras online seriam destinadas a esse objetivo. “O resultado na região foi considerável e esse é só um exemplo do que é possível”, diz o executivo.
Para além de estimular o comércio eletrônico, o executivo ressalta como a receita de publicidade dos clubes pode melhorar muito a partir de um maior conhecimento do público torcedor e seus hábitos. “Até a proposta de valor para negociar patrocínio fica diferente.”
Apesar de o futebol ser uma das maiores frentes de oportunidades para a SBF Ventures explorar, o objetivo é encontrar caminhos para inovação em diversos esportes que sejam relevantes para a rede, como o universo de academias, caminhada, corrida e até mesmo moda casual esportiva. A OneFan é só o começo da jornada.
Não por acaso, em março do ano passado, a empresa passou a ser negociada na B3 com o ticker SBFG3, justamente para se posicionar como ecossistema que vai muito além do varejo. “Nossa tese era calcada toda no varejo, na omnicanalidade, na digitalização — tudo da Centauro. Agora, nossa tese é muito mais poderosa. Também não é só ter vários negócios, mas é como eles se relacionam e como podem catalisar suas operações. Cada uma pode fazer o outro valer mais”, afirmou na época, Pedro Zemel, o CEO da companhia, avaliada em R$ 5,1 bilhões na B3, em entrevista ao EXAME IN.
O executivo explicou, então, que toda essa forma de pensar — calcada nos pilares da distribuição, da gestão de produto e da audiência relacionada ao esporte — seria o vapor presente em toda a gestão. “No futuro, queremos participar de toda a jornada. Desde a compra de produtos, serviços e até assessorias. Não vamos precisar fazer tudo, podemos explorar isso de diversas formas, com parcerias, por exemplo, como um meio para gerar benefícios e fidelização de quem vive nosso ecossistema”, disse, vaticinando as novidades que viriam, antes mesmo da criação da SBF Ventures.
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