Câmbio: levantamento da Armor Capital para EXAME IN mostra que 10 exportadoras trouxeram quase US$ 1,3 bi ao país de janeiro a março (Ricardo Moraes/Reuters)
Angela Bittencourt
Publicado em 17 de maio de 2021 às 11h00.
A taxa de câmbio não está de rasteirinha, mas está descendo do salto. Levou um tranco do Banco Central e levará outro das empresas exportadoras. É cedo para prever dólar ladeira abaixo, porém, já desliza. A depreciação do real, de 30% em 2020, não será revertida. Contudo, a moeda deve se valorizar aos poucos. As exportadoras voltaram a fechar contratos de câmbio e deram início a um processo de redução de caixa mantido no exterior — procedimento autorizado pela legislação.
Alfredo Menezes, sócio e CEO da Armor Capital e experiente especialista em operações monetárias e cambiais, diz em entrevista ao EXAME IN que esse movimento das companhias já é percebido no mercado cambial. Levantamento feito com base nos balanços de 10 das maiores exportadoras brasileiras referentes ao primeiro trimestre confirma que 6 reduziram o caixa lá fora e 4 aumentaram. O saldo desses ajustes é queda de aproximadamente US$ 1,28 bilhão, ante a posição de dezembro. A redução do caixa foi de cerca de US$ 2,4 bilhões e a expansão inferior a US$ 1,2 bilhão. O caixa externo consolidado das 10 empresas listadas por Menezes era de US$ 24,27 bilhões no quarto trimestre de 2020 e de US$ 22,99 bilhões ao final de março deste ano.
As exportadoras avaliadas são, por ordem alfabética: Braskem, BRF, CSN, JBS, Klabin, Petrobras, PetroRio, Suzano, Usiminas e Vale.
O CEO da Armor Capital, que tem no currículo o comando da Tesouraria do Bradesco, chama atenção para o impacto da Petrobras no câmbio. “Em apenas quatro meses deste ano, a Petrobras tirou do mercado, montante equivalente a US$ 7,8 bilhões. Desde janeiro de 2020 foram US$ 19 bilhões e somente para pré-pagamento de dívida. As operações da companhia geraram grande pressão no câmbio, mas essa pressão deve estar no final porque havia o compromisso de baixar sua dívida a US$ 60 bilhões neste ano e ela já está em US$ 67 bilhões”, explica.
Alfredo Menezes não tem dúvida de que o juro real negativo durante meses no Brasil, em quase 3%, foi um dos motivos de sustentação do dólar e da retenção de moeda estrangeira por exportadores no exterior. “Essa taxa de juro é incompatível com um problema fiscal relevante. O juro real brasileiro estava e ainda está totalmente desequilibrado com o risco fiscal que o Brasil oferece a médio prazo”, afirma.
Na sua avaliação, a retenção de dólares deve ser avaliada, porém, em duas etapas. Uma deles tem a ver com a mudança de postura de investidores domésticos que, diante do corte da Selic pelo Copom, ampliaram fortemente a demanda por títulos privados, como debêntures; e a outra etapa reflete a decisão das empresas de levantarem recursos com a emissão desses títulos e usar o dinheiro captado para recomprar bônus no mercado internacional e com uma boa justificativa. Os bônus tinham rentabilidade superior ao custo da dívida doméstica.
“Não à toa, ocorreram muitas recompras de bônus, emissões internas via debêntures e manutenção de dólares das exportações lá fora”, afirma o especialista que cita a Vale como exemplo de empresa que mais que dobrou seu caixa no exterior entre dezembro de 2019 e dezembro de 2020. No primeiro trimestre deste ano, porém, o caixa externo encolheu mais de US$ 1 bilhão, sugerindo que a mineradora começou a trazer de volta os recursos.
“Estou convencido de que algo mudou nas últimas semanas. Os exportadores voltaram a fechar contratos de câmbio, ampliando a oferta de dólares no mercado local e, tem parte nisso, o comportamento do juro aqui e as sinalizações do Banco Central”, diz.
De fato, o Banco Central se mostrou mais conservador na gestão do juro, sinalizando em março e reafirmando em maio um ajuste da Selic de 2,25 ponto percentual para 4,25% ao ano em meados de junho.
Essa sinalização fez efeito no mercado que entendeu, contudo, a Ata do Copom como indicação mais branda sobre a perspectiva para a taxa de juro. Menezes, que acompanhou todos esses movimentos, entende que em sua sinalização quanto menos o BC for “dovish” em comentários ou, ao contrário, quanto mais dura for a retórica, menor tende a ser a necessidade de alta do juro.
“Custa mais barato para o próprio BC e para o governo como um todo. Hoje, porém, não dá para dizer de quanto será o ajuste da Selic, inclusive porque temos duas pressões concomitantes. Temos a pressão inflacionária doméstica e estamos vivendo um ciclo de alta de preços de commodities. Então, para o próprio BC não é um cenário simples para ajustar a política monetária porque está em curso uma alta de inflação no mundo. Na prática, com o discurso e os documentos, o BC ‘morde e assopra’ na transmissão das suas mensagens.”
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