Em cinco anos, empresas levantaram US$ 99,5 bilhões no exterior e US$ 176,8 bilhões no país (Gil Ferreira/Agência CNJ/Reprodução)
Angela Bittencourt
Publicado em 9 de junho de 2021 às 16h41.
Em tempos de inflação de dois dígitos ao mês e operações “overnight” para proteger patrimônio, cinco anos era longo prazo no Brasil. Hoje, com inflação esticada a 8,06% em doze meses e títulos do Tesouro com vencimento em 2050, cinco anos é fichinha. Em cenário crítico, porém, é tempo suficiente para virar economias do avesso e dificultar a vida de muita gente. De 2015 a 2020, a perda do selo de bom pagador pelo Brasil e a eclosão da pandemia de Covid-19 poderiam minar a confiança de investidores em empresas brasileiras e isso não aconteceu. Quem conta é o Banco Central (BC) em um estudo especial divulgado nesta semana.
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Esses dois eventos, ocorridos exatamente em 2015 e 2020, alteraram condições de lançamento de títulos de dívida corporativa. Contudo, o mercado não se fechou para as companhias brasileiras que passaram em testes de estresse informais ao buscar recursos.
A nota de crédito dada pelas agências de classificação de risco é uma medida internacional de avaliação da capacidade de países e empresas de cumprir seus compromissos com seus credores. Quanto mais alta a nota, menor o risco percebido pela agência e menor o custo do dinheiro que um país ou uma empresa paga ao investidor para financiar seus gastos.
O Brasil ganhou o primeiro selo de bom pagador em 2008 pela Standard & Poor’s, hoje S&P Global, e perdeu o selo em setembro de 2015, sendo rebaixado para investimento especulativo. Em dezembro do mesmo ano, a Fitch Ratings retirou o selo que também havia atribuído ao país. E, em fevereiro de 2016, ocorreu o rebaixamento pela Moody’s em meio a uma barafunda fiscal que levou ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
O BC utilizou o intervalo de 2015 a 2020 em um estudo especial, publicado no Relatório de Economia Bancária, em que avalia o financiamento das empresas domiciliadas no país e suas subsidiárias no exterior por meio de emissão de títulos no mercado internacional. O financiamento por meio do mercado doméstico de títulos é citado para comparação quanto às condições de financiamento, mas também traz boa notícia. O BC confirma o vigor da captação de recursos no mercado doméstico sobretudo em debêntures.
Nos últimos cinco anos, a captação de recursos por instrumentos de dívida corporativa no exterior totalizou US$ 99,5 bilhões em 141 operações, enquanto US$ 176,8 bilhões foram levantados no Brasil com lastro em 1.635 operações. Esse dado divulgado pelo BC, com base em estatísticas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), é termômetro positivo para as empresas que precisam de financiamento e também para os investidores em busca de oportunidades atraentes para investimento financeiro.
“A predominância do mercado de capitais doméstico em relação ao externo como fonte de financiamento para as empresas brasileiras é consistente com o resultado encontrado pela International Organization of Securities Commissions (IOSCO) para os mercados emergentes. No entanto, para as empresas com títulos no exterior, as emissões externas são predominantes, resultado corroborado para as 25 maiores empresas de capital aberto e controle nacional, conforme estudo da CVM”, afirmam os técnicos do BC.
Em sua análise, a instituição pontua que as operações externas registraram volume médio seis vezes maior que no mercado local e com o dobro do prazo médio para o vencimento. A retomada das captações após os dois eventos (perda do grau de investimento e eclosão da pandemia) ocorreu em tempos diferentes: em 2015 levou 10 meses; em 2020, apenas três meses. Detalhe: no ano passado, as empresas voltaram a emitir títulos em condições de financiamento externo semelhantes às que vinham sendo praticadas e que já eram melhores do que anos anteriores, com custos menores e prazos mais longos.
Ao contrário do que se poderia supor, dado o impacto da perda do grau de investimento pelo Brasil, o Relatório de Economia Bancária informa que esse evento não impediu o acesso da maioria das empresas ao mercado internacional de capitais e em condições favoráveis.
De acordo com o BC, enquanto no período 2015 a 2019 o refinanciamento e o alongamento de dívidas foi a principal destinação dos recursos levantados no exterior, em 2020, o dinheiro captado pode ter sido destinado prioritariamente à formação de reservas de segurança. Duas constatações corroboram a hipótese de formação de colchões de liquidez: a ausência da necessidade de refinanciar ou liquidar dívidas de curto prazo e o fato de a captação não estar associada a investimentos.
O estudo especial divulgado no Relatório de Economia Bancária revela também a importância da participação da Petrobras no estoque de emissões externas de títulos corporativos. Em 2015, o estoque total de captação das companhias alcançou US$ 157 bilhões. A estatal respondeu por 35% desse montante. Em 2020, o estoque total foi de US$ 126 bilhões, com a fatia da Petrobras declinando a 24%. Segundo o BC, 71% do estoque de títulos têm prazo superior a cinco anos.
Quanto ao custo efetivo médio das captações por empresas com emissões externas nos últimos cinco anos, o BC informa que o pico foi observado em 2016, 7,5% ao ano. Em 2020, a taxa declinou a 5,5%. Nesses dois momentos, o spread das operações permaneceu em 2,7%. Caiu substancialmente, porém, a parcela do custo que reflete o risco-país, passando de 4,8% em 2015 para 2,8% logo após a eclosão da pandemia.
O estudo do BC pondera que, em 2020, a conjuntura pautada pela incerteza quanto aos efeitos da pandemia da Covid-19 sobre a economia global apresentou um novo cenário para os emissores brasileiros. “O risco-país, na virada da primeira quinzena de março, atingiu nível no qual as emissões tornam-se escassas ou cessam, 250 pontos-base. No ano, as emissões ocorreram em ritmo de ‘stop and go’, em linha com os níveis do Credit Default Swap (CDS). Quatro meses do ano com ausência de emissões, 14 interrompidas em fevereiro e retomadas em junho, na sequência das emissões soberanas.”
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