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'Davos do Deserto' tem maior comitiva de brasileiros – apesar da guerra

Mais de 60 CEOs e empresários brasileiros partem essa semana para a Arábia Saudita, depois de passagem dos sauditas pelo país

Mohammed bin Salman: Plano de abertura econômico em xeque com virada geopolítica (Sergio Moraes/Reuters)

Mohammed bin Salman: Plano de abertura econômico em xeque com virada geopolítica (Sergio Moraes/Reuters)

Publicado em 21 de outubro de 2023 às 16h42.

Última atualização em 23 de outubro de 2023 às 14h23.

Em meio à escalada dos conflitos no Oriente Médio, dezenas de empresários e executivos brasileiros chegam na próxima semana a Riad, na Arábia Saudita, para a Future Investment Initiative (FII), a conferência anual promovida desde 2016 pelo príncipe saudita Mohammad Bin Salman.

A guerra entre Israel e o Hamas eclodiu no mesmo ano em que o Brasil se prepara para mandar sua maior comitiva ao evento, que se consolidou nos últimos anos como a “Davos do Deserto”.

Se nos últimos anos os participantes brasileiros não enchiam os dedos das duas mãos, neste ano, mais de 60 executivos e empresários locais estão confirmados, apurou o Exame IN.  O interesse aumentou depois que uma comitiva de 150 sauditas passou pelo país em agosto, de olho em oportunidades de investimento no país.

O Brasil também vai estar mais presente nos palcos: Jean Paul Prates, presidente da Petrobras, e Eduardo Bartolomeo, da Vale, estão entre os palestrantes sinalizados no programa este ano.

A lista conta ainda com outros três representantes do Brasil: Zeca Auriemo, chairman da JHSF; Ana Cabral-Gardner, fundadora da mineradora de lítio Sigma Lithium; e André Esteves, chairman do BTG Pactual (do mesmo grupo que controla a Exame), que até hoje tinha sido o único empresário brasileiro a falar na história do evento. (Em 2019, o então presidente Jair Bolsonaro foi um dos speakers.)

Vitrine da influência do dinheiro saudita e do projeto de modernização do jovem Bin Salman, a FII atrai líderes dos maiores bancos e empresas tanto do Oriente quanto do Ocidente e virou parada obrigatória para CEOs do calibre de Jamie Dimon, do JP Morgan, David Salomon, da Goldman Sachs, e Larry Fink, da BlackRock.

Neste ano, com a eclosão da guerra, havia a expectativa de que o evento pudesse ser cancelado ou que houvesse uma desistência em massa – o que não aconteceu. Entre os grandes bancos, apenas o suíço UBS proibiu viagens à região do Oriente Médio, apurou a Reuters. Richard Attias, chefe do FII Institute, que organiza o evento, afirmou ao Financial Times que apenas “dez a 20 pessoas” desistiram, de um total de mais de 6 mil previstas.

Numa nota divulgada esta semana, o FII Institute disse que a maior parte dos cancelamentos veio de preocupações com segurança ou cobertura de seguro.

Mas, para além da ameaça física da guerra, as preocupações giram em torno da diplomacia, com olhar atento para a postura do governo em meio ao potencial contágio do conflito para outros países de população árabe, como Líbano.

Nesta semana, o Mohammad bin Salman deu um chá de cadeira no secretário de Estado americano Antony Blinken em sua viagem à região – para depois pedir a interrupção da ofensiva israelense, em contradição direta com os Estados Unidos, que apoia Israel no seu objetivo de erradicar o Hamas.

Entre os brasileiros, houve algumas poucas desistências para a FII, de empresários que preferiram ficar de fora pelo risco de intensificação dos conflitos, dizem fontes que partem rumo à Riad. Mas a imensa maioria está de malas prontas para o evento, que começa na quarta-feira.

Na conferência, as presenças brasileiras nos últimos anos se resumiam a André Esteves e executivos do BTG Pactual (do mesmo grupo que controla a Exame), banco que foi pioneiro na conexão do país com a Arábia Saudita e o único brasileiro a pedir uma licença bancária na região.

Outros nomes que frequentavam o evento incluíam nomes como Alexandre Saigh, da gestora de private equity Pátria, e executivos de empresas de commodities, como a Vale, ou de energia.

A plateia prevista para a próxima semana é muito mais diversa. Inclui nomes como Bruno Ferrari, fundador da rede de tratamento oncológico Oncoclínicas, e Lucas Kallas, da gestora imobiliária Cedro Participações. Executivos de outros bancos, empresas do agronegócio, empresários e fundadores de startups também estão confirmados.

“Esse ano é o ano do hype”, diz uma fonte brasileira que já participou do evento. “É a primeira vez de muita gente pisando em Riad.”

Na sua passagem pelo Brasil em agosto, a comitiva saudita sinalizou interesse em diversas áreas, com destaque mineração, energia, agronegócio e saúde. Por enquanto, o maior aporte no país foi a compra de uma participação de 13% na área de metais básicos da Vale, em conjunto com a gestora americana Engine Nº1, por US$ 3,4 bilhões.

Até agora, o Brasil tinha ficado praticamente fora do radar da investida internacional da Arábia Saudita, vem ganhando proeminência global nos últimos anos – jorrando liquidez do petróleo num momento em que as economias desenvolvidas se retraíram meio à disparada dos juros.

Num plano batizado de Visão 2030, conduzido pelo príncipe MBS para abrir a economia saudita para o mundo, estão previstos US$ 1 trilhão de investimentos até 2030. Se apenas 2% disso vier para o Brasil, já são US$ 20 bilhões, o que explica o interesse do público brasileiro pela aproximação com a coroa.

Ainda não está claro como deve ficar o plano saudita diante do novo cenário geopolítico na região.  A depender dos desdobramentos da guerra, Bin Salman pode ser cobrado a se posicionar se manterá uma postura mais globalista ou se indicará um alinhamento maior com os vizinhos árabes.

Mas o evento será uma boa oportunidade para medir a temperatura. “Espero que todas as sessões [da conferência] discutam o impacto do que está acontecendo não apenas na região, mas também na Ucrânia”, disse Attias ao FT. “É importante endereçar o impacto dos conflitos nos negócios.”

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