Exame IN

Conheça a Maquira: a empresa em que o sorriso do brasileiro é o marketing

Fabricante de produtos odontológicos fundada em 2003 deve alcançar receita de R$ 80 milhões neste ano, após aquisição

Antonio Leme Junior, fundador da Maquira, e Rafael Gonçalez, da Concept: sintonia perfeita que quintuplicou o negócio (Maquira/Divulgação)

Antonio Leme Junior, fundador da Maquira, e Rafael Gonçalez, da Concept: sintonia perfeita que quintuplicou o negócio (Maquira/Divulgação)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 17 de março de 2021 às 13h11.

Última atualização em 17 de março de 2021 às 14h03.

Há seis anos, o paranaense Antonio Leme Junior, fundador da Maquira, deu um nó na cabeça de Rafael Gonçalez, que estava na gestora de private equity Innova Capital em busca de oportunidades de investimento. De um jeito bem diferente daquele que a Faria Lima está habituada, sem nenhum PowerPoint, sem vestir a noiva, o empreendedor mostrou as oportunidades de explorar o mercado de produtos odontológicos e fez Gonçalez mudar completamente de vida. O gestor buscou investidores e abriu sua própria casa de private equity e ambos formaram uma sociedade para a vida, ao afetarem um a história do outro.

A Maquira nasceu em 2003, em Maringá, cidade hoje com menos de 450 mil habitantes. Na largada, fabricava caixas plásticas para aparelhos de dente e hoje é uma empresa de tecnologia e inovação em saúde e produtos odontológicos, com mais de 400 itens no portfólio e única fabricante nacional de alguns deles. Se fosse listada em bolsa, como diversas grandes companhias do setor que são negociadas a cerca de 20 vezes Ebitda, valeria no mínimo R$ 600 milhões.

Apesar do número e de ter uma governança que muita companhia grande ainda não possui, os sócios não pensam em listar a Maquira na B3, pelo menos, por enquanto. Mesmo sabendo que poderiam ser associados ao setor de health tech, última moda entre os investidores. Antes, querem mais crescimento, mas de forma susntentável.

O que a Maquira tinha — tem — e que impressionou tanto Gonçalez? O fundador Antonio Leme Junior, sua história e, principalmente, seu conhecimento sobre o setor e as necessidades dos clientes na palma da mão. Por causa da empresa, o gestor fundou a Concept, que no ano passado também aportou R$ 50 milhões na La Guapa, a rede de empanadas da dupla Paola Carosella e Benny Goldberg.

Neste ano, a Maquira deve alcançar uma receita de R$ 80 milhões, uma expansão de 35% sobre o ano passado. As vendas internacionais, para mais de 50 países, já respondem por cerca de 20% do que a empresa fatura. O número de 2021 será alcançado com a adição de mais um produto em sua lista: resinas biocompatíveis para impressão 3D, fruto da aquisição da Makertech Labs em dezembro. O que antes os consultórios precisavam encomendar para receber, no mínimo, dentro de 24 horas, agora pode ficar pronto em 20 minutos. Os usos? Os mais variados, de próteses a placas relaxantes, passando por alinhadores estéticos e guias cirúrgicas.

“A fama da boa odontologia no Brasil ajuda bastante. Temos uma das maiores populações de dentistas do planeta e, mais do que isso, somos benchmark internacional no setor. Das dez melhores universidades do mundo, três são brasileiras”, comenta Leme, em entrevista exclusiva ao EXAME IN. É como ter o sorriso do brasileiro como marketing e seu espírito de empreendedor persistente como motor.

Só o mercado de ortodontia global deve alcançar US$ 10,6 bilhões em 2027, de acordo com relatório da Emergem Research, incluídas aí as cirurgias estéticas. Para chegar a esse tamanho, significa que o mercado crescerá num ritmo médio de dois dígitos todos os anos até lá.

“O Antonio trouxe o negócio não do jeito que a Faria Lima está acostumada, trouxe do jeito dele. Mas na conversa dava para ver a profundidade que ele tinha. Não era aquela coisa feita para vender a empresa, em que o cara vai lá e dá um tapa na noiva”, conta Gonçalez, lembrando que a apresentação foi feita em XMind, um software de mapeamento mental e organização de pensamento pouco utilizado. Leme não levou o famoso PowerPoint, que bem-feito ajudou Eike Batista a ter um patrimônio superior a US$ 30 bilhões, sem lastro equivalente, em várias companhias que criou e listou na bolsa.

“Eu já tinha falado com diversos empreendedores que me impressionaram. Mas a capacidade dele e a compreensão do mercado me chamaram muita atenção”, comenta o gestor.

O ano era 2015. Gonçalez buscava potenciais alvos para a Innova. Depois de se aproximar da Maquira e enxergar seu diferencial, decidiu ele sair da Innova quando a gestora disse não ao investimento e foi montar seu próprio fundo para se associar a Leme Filho. A sintonia de visão de negócios entre os dois era grande e ele via muito sentido no projeto para a companhia. Assim, montou a Concept e no ano seguinte fez o aporte na Maquira.

Leme é o caçula de três irmãos em uma família de imigrantes italianos. “Sete irmãos que se casaram com sete irmãs, pode imaginar como é isso?” O pai dele era vendedor e, em 1976, começou no ramo de produtos odontológicos, lá em Maringá. Desde muito cedo, acompanhou o pai e trabalhou com ele, praticamente ainda criança. Portanto, não é de se surpreender que, aos 18 anos, querendo ganhar mais do que recebia como “trainee do pai”, decidiu abrir seu próprio negócio.

“Com 18 anos, eu comprava dos fornecedores menores, já trabalhava lado a lado com meu pai. Eu sentia na pele a falta de competidores para coisas simples. Dificilmente, havia três no mesmo ramo. Os fornecedores cobravam o preço que queriam, entregavam quando queriam e o problema com os compradores era todo nosso. Havia oportunidades evidentes”, relembra.

A produção do empreendedor começou em 2001, mas foi só em 2003 que a Maquira ganhou CNPJ e espaço próprio. Três anos depois, já produzia em um endereço de 500 metros quadrados e obtinha na Anvisa a autorização para fabricação de seu primeiro produto controlado.

Hoje, a companhia tem uma área própria de inovação, pesquisa e desenvolvimento, liderada por uma mulher, a doutora Vanessa Cardoso, com um time de 15 pessoas dedicadas só para isso, e ocupa uma área de 7.500 metros quadrados. O impulso que faltava veio com o capital levado pela Concept e o compartilhamento de conhecimentos entre os novos sócios.

Após a chegada de Gonçalez, a Maquira fez quatro aquisições — além da MakerTech, comprou dois negócios da Dente Forte e ainda a BM4, de clareadores — e Leme aprendeu que um certo tanto de dívida é até saudável para o negócio. Mesmo assim, os compromissos, com o BNDES, não alcançam nem mesmo 1 vez o Ebitda anual e têm prazo de 15 anos. “Eu não conhecia nada de matemática financeira antes do Rafael. Aprendi tudo com ele. Fui estudar mais sobre gestão e governança. Quando a gente se conheceu, eu pagava as duplicatas à vista e comprava a prazo. Tinha pavor de dívida”, lembra o fundador.

Convencer o pai de que tinha de voar sozinho e, tão cedo, não foi simples. Demorou um pouco até ele entender a verve empreendedora que o filho tinha no sangue, sua própria herança, inclusive. “Eu me lembro direitinho. Vendi meu golzinho, na época meu único bem, e me associei a um amigo meu que mexia com injeção de plásticos. Coloquei R$ 7.500. Sempre fui arrojado, mas com cuidado. Em 30 dias, eu tinha comprado a parte do meu sócio.” Leme conta, com orgulho, que no segundo ou terceiro mês trabalhando completamente sozinho já ganhava mais do que quando ainda estava com o pai. Dali para a frente, acumulou um crescimento de 40% todo ano, em média.

Quando a Concept chegou, a Maquira tinha fechado 2015 com R$ 17 milhões em receita e R$ 6 milhões de Ebitda, para nenhuma dívida. “Multiplicamos a empresa por 5”, comenta Gonçalez. “Eram 100 produtos no portfólio.” O catálogo quadruplicou e os produtos envolvem cada vez mais tecnologia.

Leme, desde o começo, estava sempre pensando no próximo produto e no próximo passo e, assim, reinvestindo o capital. Mas ele conta que enxergou de vez o potencial da companhia quando a francesa Septodont levou até ele uma proposta de aquisição por R$ 25 milhões. A receita, na época, estava entre R$ 10 milhões e R$ 12 milhões. “Pensei comigo: o que eles estão vendo que eu não estou? Se eles querem comprar, é porque o negócio é muito bom”, comenta, brincando.

Depois de refletir bastante e concluir que era aquilo que sabia e gostava de fazer, ofereceu se podia ficar com 20% do negócio e continuar trabalhando. “Mas era 100% ou nada. Então, eu disse não.”

Só que foi ali que ele se deu conta que sua próxima fronteira era crescer e muito e sofisticar mais as linhas de produtos. Em 2014, foi devorado pelo negócio e, no ano seguinte, depois de fazer e refazer mil vezes as contas do quanto precisaria para uma fábrica nova, achou que era hora de mudar para São Paulo, fazer contatos e procurar por um fundo de private equity que pudesse fazer um aporte de recursos. Não queria dívida. Nunca quis. Além disso, procurava por alguém que entendesse de gestão de negócios mesmo. “Eu entendia bem de fazer e vender produto. Minhas contas eram todas no Excel.”

Veio para a capital paulista, contratou um assessor financeiro e levou o negócio para sete ou oito gestores. “Mas meu cheque era pequeno para alguns deles”, lembra. Estava à procura de aproximadamente R$ 20 milhões. Até que conheceu Gonçalez. Em um jantar, no dia em que o gestor foi contar a decisão da Innova de não investir, Leme, bem ao seu estilo, não desistiu. "Não é você quem conhece as pessoas que colocam o dinheiro no fundo? Por que não cria o seu e vem junto?" Pronto, foi mais uma semente que plantou e ainda provocou, falando em levar o negócio a uma receita de R$ 100 milhões. Parecia um número enorme naquele momento, mas já estão quase lá.

Nesses cinco anos de sociedade, o negócio não apenas quintuplicou de tamanho como também se profissionalizou. A Maquira, que é uma sociedade anônima de capital fechado, passou a ter um conselho de administração, com comitês dedicados a recursos humanos, inovação, entre outros. Também ganhou auditoria de uma das big four, a PwC. E Leme hoje está apenas no conselho. Passou o bastão da presidência para se dedicar ao desenvolvimento estratégico da companhia.

Com tudo tão redondo, poderia ir logo para um IPO, mas a dupla acha precoce. “A Concept nasceu para ser uma gestora de capital paciente”, afirma e reafirma Gonçalez, que também falou que a criação do fundo tem relação com seu desejo de participar mais e se sentir mais útil para os empreendedores brasileiros. "Muitas vezes, o dinheiro não é só do que o empreendedor precisa." Outro sócio? Só se passar no crivo dos dois e eles sentirem que não vai, de forma alguma, estragar o equilíbrio e a sintonia entre eles.

Quando questionados para onde quer levar a Maquira agora, Leme e Gonçalez não têm mais receio de responder: “O céu é o limite”.  Questionado se a pandemia de covid atrapalhou, o fundador explicou que, desde o fim de 2020, a empresa vem batendo recorde em vendas todos os meses.

Acompanhe tudo sobre:Clínicas odontológicasEmpreendedorismoIPOsPrivate equity

Mais de Exame IN

Mais Porto, menos Seguro: Diversificação leva companhia a novo patamar na bolsa

Na Natura &Co, leilão garantido e uma semana decisiva para o futuro da Avon

UBS vai contra o consenso e dá "venda" em Embraer; ações lideram queda do Ibovespa

O "excesso de contexto" que enfraquece a esquerda