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Condenado e US$ 30 bi mais pobre, Eike prepara retorno triunfal

Empresário está mudando gestão de MMX e OSX para ficar mais próximo dos negócios, que juntos têm dívidas superiores a R$ 7 bilhões

Eike Batista: condenado e inabilitado pela CVM, troca gestão de controladas para ficar mais próximo (Wilson Dias/Agência Brasil)

Eike Batista: condenado e inabilitado pela CVM, troca gestão de controladas para ficar mais próximo (Wilson Dias/Agência Brasil)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 8 de outubro de 2020 às 15h35.

Última atualização em 13 de outubro de 2020 às 21h13.

Nada derruba o ânimo de Eike Batista, que está esfregando as mãos para voltar a “empresariar”. Não vê a hora. E já começou a preparar seu retorno. Para onde? Para a mineradora MMX e o estaleiro OSX, que era filhote da megalômana OGX (que já não lhe pertence mais e é hoje a Dommo Energia). Ambas estão em recuperação judicial, somando, juntas, dívidas superiores a 7 bilhões de reais. Enquanto a maioria se envergonha por fechar um acordo de colaboração premiada e pensa em como submergir para ser esquecido, Eike comemora.

No aguardo da homologação de sua delação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) — que deve lhe render um ano de cadeia e mais uma multa de 800 milhões de reais —, Eike prepara seu retorno ao mundo dos negócios. O acordo está ligado à investigação do megaesquema de corrupção do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Eike acredita verdadeiramente que pode e vai virar a página.

Mesmo condenado por manipulação de mercado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pela Justiça e proibido de ocupar cargos de administração em companhias abertas pelos próximos sete anos, Eike Batista está trocando a gestão das controladas MMX e OSX. Como não pode sentar na cadeira ele próprio, vai colocar administradores de sua confiança e subordinação no lugar dos atuais. Mais uma vez, vem cheio de ideias mirabolantes, que lhe são características.

Na MMX, a mudança já é fato consumado e com consequências para o mercado. Além da alteração no conselho, trouxe de volta à presidência Joaquim Martino, que já foi da companhia no passado. É do primeiro time de executivos ligados ao empresário, aquele grupo que enriqueceu e recebeu bônus entre 70 milhões e 200 milhões de reais. A ação da  mineradora saiu da casa dos 4 reais para mais de 10 reais, depois das iniciativas da nova administração. A alta despertou atenção da CVM, que tem questionado a empresa.

A valorização é motivada por um pedido feito à Justiça, dentro do processo de recuperação judicial, para cancelar um contrato de cessão dos direitos de exploração de uma das minas da empresa. Em petição do escritório Galdino Coelho, a nova MMX alega que houve renúncia gratuita de um ativo que valeria 300 milhões de dólares e o quer de volta, com base em uma antiga avaliação realizada sobre os ativos da companhia. A informação deu origem a muita especulação sobre as ações da empresa.

Na OSX, a alteração está em andamento ainda. Não foi consumada. A proposta será votada em assembleia de acionistas no próximo dia 14. Entre os nomes indicados, estão executivos que trabalham na holding EBX — onde pessoas próximas dizem que Eike dá expediente todos os dias — e até em negócios de sua esposa.

Os argumentos para as mudanças já foram vários: desde querer terminar os processos em andamento até a alegação de que havia um potencial investidor, o que tornava a modificação necessária. A MMX, que deve 600 milhões de reais, está com a falência decretada. A liquidação só não está em andamento devido a uma liminar na Justiça. Na OSX, a dívida é dez vezes maior: 6,5 bilhões de reais.

O EXAME In apurou, porém, que o verdadeiro motivo desse preparado retorno é a crença de Eike — no otimismo que lhe é peculiar — de que pode recuperar essas companhias, que há riqueza a ser explorada e, ainda, que é viável pagar todo mundo, em especial todas as multas que lhe foram impostas. Em sua visão, a atual administração de ambas as empresas estava lá apenas para prosseguir com os planos de recuperação, mas sem intenção de renovação e revitalização.

A reportagem procurou os advogados corporativos próximos de Eike, mas eles preferiram não comentar as iniciativas.

Além das dívidas corporativas, existem as pendências pessoais. Apenas na condenação de manipulação de mercado são devidos 540 milhões de reais em multas aplicadas pela CVM — que junto com a delação somam 1,3 bilhão de reais. Eike recorreu ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o chamado Conselhinho, da pena recebia pela xerife do mercado.

Eike também tem conversado com amigos consultados pela reportagem sobre diversas outras ideias mirabolantes de negócios. Algo recorrente em sua trajetória. Apesar das enormes confusões que criou, dois ativos são costumeiramente reconhecidos como de sucesso: o projeto das termelétricas do Nordeste, abrigados na antiga MPX (hoje Eneva) e o Porto do Açú — ambos mudaram de mãos durante o processo de reestruturação das dívidas do grupo.

Sobra otimismo, falta dinheiro

Quem conhece Eike Batista não duvida do seu otimismo, mas nem todas as explicações para o movimento atual são tão românticas. Fontes próximas à situação apontam que há atrasos de pagamento de funcionários da EBX e que o empresário está sem nenhuma liquidez, uma vez que seus recursos e bens estão bloqueados pela Justiça — o que a delação pode resolver em parte. Mesmo assim, não há ninguém próximo que acredite na existência de patrimônio suficiente para quitar todos os compromissos.

Eike Batista perdeu 30 bilhões de dólares. Esse é o valor que seus negócios alcançaram no auge da euforia com os ativos X. Embora o tempo provou que as companhias não valessem nada do que pareciam, o empresário viveu como se tivesse todo esse patrimônio. Acumulava além de carros de luxo, imóveis, aviões e um barco personalizado para seus costumes e gostos (leiloado em 2018 e que ele sonha em recuperar também). Dava-se ao direito de todos os tresloucados caprichos que esses cifrões poderiam comprar.

Assim, o acesso a essas companhias seria uma forma de ter alguma fonte de liquidez, pelo menos para algumas obrigações. Apesar de estarem em extrema dificuldade financeira, as empresas ainda têm algum fluxo de receita. A OSX, por exemplo, teve 5,5 milhões de receita líquida no primeiro semestre. E a MMX recebe cerca de 100.000 reais ao mês.

Dos três nomes indicados à OSX, dois têm vínculo atual com os negócios da família. João Manoel de Lima Monteiro é executivo da EBX e Willian de Mello Magalhães Júnior é ex-OGX e neste ano atuava como diretor de expansão da PowerLook, empresa da esposa de Eike. O terceiro recomendado é Roberto Hukai, ex-MMX e ex-CCX, a empresa de carvão que está em liquidação.

De acordo com fontes, a administração da OSX está bastante preocupada com o assunto. No entanto, consultado, o presidente da companhia, Pedro Borba, não quis comentar a questão. O conselheiro independente Rogério Alves de Freitas tentou na CVM suspender a assembleia que tratará das mudanças, mas sem sucesso. Historicamente, quando não há ilegalidade na pauta proposta, a autarquia não concede o pedido, seguindo o que diz a legislação.

No caso de Eike, a questão suscita debate, pela inconsistência prática da condenação. O empresário está afastado da gestão, mas seus direitos de acionista não estão cassados — bloqueio ou suspensão ampla de direitos de acionistas são raros, fora de situações específicas. As modificações estão sendo feitas pelo controlador Eike e não pelo gestor. É nesse argumento, inclusive, que os advogados de Eike se fiaram para permitir-lhe a iniciativa. O mérito do pedido de Freitas terminou por não ser avaliado pelo colegiado da CVM, justamente o debate se ele poderia colocar pessoas evidentemente sob seu comando direto à frente das empresas. Mas o tema ainda promete cenas dos próximos capítulos. Ao que tudo indica, Freitas não pretende ficar parado.

 

 

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