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Com Farm Global e Hering, Grupo Soma vai dobrar receita até 2026

Em evento a investidores, executivos destacaram a estratégia para que o grupo cresça 15% ao ano até lá, sem perder margens

Farm Global: coleções exclusivas para estações do Hemisfério Norte, mas com o mesmo tom de "happiness" (Farm/Divulgação)

Farm Global: coleções exclusivas para estações do Hemisfério Norte, mas com o mesmo tom de "happiness" (Farm/Divulgação)

KS

Karina Souza

Publicado em 1 de abril de 2022 às 12h18.

Última atualização em 1 de abril de 2022 às 14h29.

O Grupo Soma, plataforma de moda dona de etiquetas como Animale, Cris Barros, Farm, NV, Foxton e, desde o ano passado, a centenária Hering, deve dobrar de tamanho até o fim de  2026. Se tivesse consolidado a marca catarinense durante os 12 meses de 2021, a receita líquida da empresa teria alcançado R$ 3,7 bilhões. Portanto, o grupo tem potencial para ser um negócio de aproximidamente R$ 7,5 bilhões dentro de cinco anos. 

A conclusão vem de uma estimativa de expansão média da ordem de 15% ano durante esse intervalo, fornecida pela empresa em seu primeiro Investor Day, realizado nessa semana. O grupo abriu capital em julho de 2020 e, no ano inteiro de 2019, havia registrado uma receita líquida de R$ 1,3 bilhão. De lá para cá, o negócio já mais do que triplicou, pois a receita líquida da empresa só no quarto trimestre de 2021 foi de R$ 1,2 bilhão.

O ritmo médio de 15% ao ano é um patamar que o CFO, Gabriel Lobo, destacou como "ideal" para que a operação não perca rentabilidade. A receita, para alcançar esse resultado, tem como ingredientes "audácia e risco", nas palavras usadas pelo próprio CEO Roberto Jatahy durante o evento com investidores. Embora todas as marcas tenham um papel relevante nessa trajetória de crescimento, há duas frentes de negócios que claramente serão motor desse crescimento: a Farm Global  e Hering.

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O evento foi marcado pela participação de diversos "personagens" do grupo que falaram com investidores pela primeira vez. É o caso, por exemplo, da reverenciada Katia Barros, diretora de criação da marca e que fundou o negócio ao lado de Marcello Bastos. A executiva, que prefere se manter discreta na maior medida possível que sua posição exige, falou sobre o potencial da Farm Global.

Sem pensar em mercados ou produtos novos, a operação internacional pode alcançar uma receita entre R$ 2,25 bilhões e R$ 3 bilhões, em 2026. "Acredito que a Farm tem uma proposta única diante do mercado internacional, o ‘dress in happiness’ que colabora para o nosso crescimento”, ressaltou ela. Os passos fora do Brasil demandaram análise e aprendizado, por ser um movimento novo dentro do grupo. Mas Kátia ressalta que os resultados foram positivos desde o dia 1.  “Pouco depois de chegarmos aos Estados Unidos, a diretora da Bloomingdale’s foi nos visitar. Em seguida,  conseguimos montar a nossa loja no Soho e estabelecemos a parceria com a Nordstrom."

Jatahy, que sempre foi muito conservador ao falar do potencial internacional, tem dito mais recentemente que o grupo agora não vai mais ser levado pelo mercado. A partir de agora, a Farm Global ganhou condições e autoridade para tomar as rédeas de seu próprio futuro.  A Farm Global faturou R$ 30 milhões em 2019, R$ 95 milhões em 2020 e R$ 272 milhões em 2021. 

No segmento de moda têxtil, a Farm já pode ser chamada de primeira grande marca com presença internacional e as projeções tornarão o caso ainda mais único. É por isso que o CFO Lobo usa a expressão "disrupção" quando fala da unidade de negócios.

O segredo do crescimento no mercado externo, de acordo com Kátia,  está no posicionamento de marca adotado. Com fornecedores locais e priorizando matérias-primas de alta qualidade (superior, inclusive, à do Brasil), Kátia mostrou que a empresa vende produtos que estão na faixa de US$ 171 a US$ 400 e tem um valor percebido alinhado ao de marcas em um patamar de vendas superior (em linha com Isabel Marant e Zimmerman, por exemplo) de US$ 401 a US$ 700. 

Neste ano, a Farm vai começar a expansão na Europa, uma região considerada porta de entrada para o mercado asiático. O foco, por enquanto, é estabelecer a Farm em países como Reino Unido, Alemanha, França, Itália e Espanha. Para começar essa operação, a empresa já fez uma parceria com uma marca francesa (não divulgada por motivos de contrato) que deve levar a linha kids para o país já neste ano.

Em paralelo a isso, a expansão nos Estados Unidos também continua, assim como a estratégia vital para esse mercado que são as collabs. Neste ano, haverá uma parceria com a Starbucks para produtos estampados e também está no pipeline uma linha de produtos mais casual e básica. Isso sem falar na possibilidade de licenciamento no futuro, sobre a qual não foram dados detalhes em profundidade.

“Vemos uma oportunidade de abrir de 35 a 55 lojas nos Estados Unidos no médio a longo prazo. A entrada no mercado europeu vai praticamente dobrar o tamanho da Farm Global e não vemos nenhum concorrente direto ao nosso negócio, o que é ótimo”, diz Kátia.

Além do desempenho no mercado externo, a presença global da marca também potencializa a operação nacional. No Brasil, a marca também passa por um bom momento. O percentual de giro de produtos com preço cheio é de 73% e a empresa tem mais de 750 mil clientes ativos, um número que representa o crescimento contínuo ano a ano de 16,8%. “Além disso, estamos investindo em vendas omnicanais, que representam 30% do total de vendas, e o app já tem conversão 80% maior do que a do site. Estamos também estudando oportunidades de entrar no mercado 3D, como um treino para o metaverso”, diz Marcello Bastos, sócio-diretor da Farm.

Hering em dobro

Para a Hering, ponto nevrálgico de algum ceticismo do mercado em relação ao grupo que ainda persiste, a expectativa é alcançar uma receita de R$ 1,7 bilhão a R$ 2,75 bilhões em 2026. Jatahy e Lobo têm reforçado ver potencial para a marca dobrar de tamanho nos próximos cinco anos — dez, no máximo. Esse faturamento deve trazer um Ebitda entre R$ 375 milhões a R$ 770 milhões para o consolidado do grupo. 

Adquirida em 2021, a Hering foi substancialmente atingida pela pandemia. A companhia teve uma receita líquida de R$ 1,5 bilhão em 2019, mas esse total caiu para R$ 1 bilhão, em 2020. Para chegar ao patamar planejado, Jatahy e Thiago Hering, que ficou na posição de CEO da Hering, apresentaram os planos de curto e de longo prazo: organizar a casa primeiro, usando a inteligência do grupo para reformular o portfólio e a relação com multimarcas e franqueados, e, na sequência, investir em novos produtos de olho em reformular o básico, tornando a companhia mais atrativa a um público mais jovem. 

De mais imediato, o foco é resolver questões operacionais, ou seja, garantir que a Hering entregue o que vende e foque em produtos mais rentáveis. Para começar esse processo, o Grupo Soma colocou dentro da marca, de forma temporária, três de seus diretores: Gustavo Fonseca, de Operações, Alisson Calgaroto, de Planejamento Comercial, e Tiago Dowsley, de Digital. Dentro dessa “jornada dupla”, os três apresentaram em detalhes as metas que já cumpriram e o que vem pela frente.

Nessa frente, o Grupo Soma reduziu em 22% o sortimento da marca, depois de constatar que grande parte da receita vinha de itens disponibilizados de forma contínua nas lojas — e não de produtos novos. Além disso, a companhia cuidou da terceirização da produção para diminuir a ruptura da marca (que estava em torno de 23%) e buscou uma relação melhor com multimarcas e franqueados, usando algoritmos que apontam as melhores peças em termos de giro.

“Em 2019, 17% da produção da Hering era terceirizada e, em 2022, esse percentual deve ir para 28% do total. Não é algo que queremos manter para toda a vida útil da companhia, porque diminui margem, mas é uma situação temporária enquanto não conseguimos expandir a fabricação própria. Trabalhamos com um patamar para o futuro de 20% da produção vindo de fora, principalmente porque a operação da fábrica da Hering tem custos 14% menores do que as de fora”, afirma Gustavo Fonseca, diretor de operações do Grupo Soma.

Diante da eficiência da fábrica própria, o foco em longo prazo será usá-la para a produção para outras marcas dentro do Grupo — algo que ainda não tem data prevista, mas já tem receita projetada. Ao fabricar “dentro de casa” produtos de malha e de viscose, o grupo pode ter um ganho de 5% a 25%, de acordo com as informações apresentadas, além de reduzir o tempo atual de produção do Grupo Soma. Só este último fator incrementaria em R$ 70 milhões a receita e em 2,7 pontos percentuais a margem bruta da companhia, considerando os números atuais.

Atingir esses objetivos será o resultado de um trabalho combinado com a área de planejamento comercial. Nessa frente, as soluções de inteligência artificial do Grupo Soma já estão ajudando a avaliar melhor o ciclo de vida dos produtos e garantir mais vazão do estoque. “Um resultado prático desse algoritmo está na quantidade de peças vendidas. Em 90 dias, sem o algoritmo, a Hering vendia 33% do estoque e, ao utilizar esse software no fim do ano passado, esse número já subiu para 40%. Isso se traduziu em um ganho de receita de 15% a 27% para as lojas próprias e percentuais ainda maiores para franqueados e multimarcas, que compram produtos selecionados”, diz Alisson.

A vazão do estoque com preço cheio também deve ganhar o reforço da área digital — algo que ainda não acontece. Hoje, 70% da venda do site da marca é de promoções, enquanto a Farm tem 20% e Animale, 35%. Para 2022, o foco é começar a atingir o tíquete cheio dos produtos e, para isso, melhorar a experiência digital com a etiqueta, que tem indicadores piores de satisfação do que a média do grupo. “Para mim, o ecommerce é tão simples quanto escutar o que o cliente quer. As pessoas querem receber rápido e serem atendidas no SAC e comprar sem atrito. Temos como fazer isso”, diz Tiago.

Essas três pontas amarram a base para pensar no longo prazo da Hering. Com os executivos cuidando do operacional, Thiago Hering mostrou que a empresa deve já dar os primeiros passos para a revitalização da marca a partir deste ano. Exemplos claros disso são o fato de que a empresa vai investir em marketing (com uma campanha de Dia das Mães protagonizada por Ivete Sangalo) e em colaborações com outras marcas do grupo: uma com a Fábula — já adiantada por Roberto Jatahy durante a divulgação anual de resultados ao EXAME IN — e outra, com a Farm. A primeira deve sair do forno em breve e, a segunda, no fim de 2022.

Em relação à collab entre as duas maiores empresas em receita do Grupo Soma, apesar de “tudo estar estruturado”, segundo Jatahy, não há ainda uma projeção clara de receita a ser atingida. O que se sabe até o momento é que os produtos devem ser vendidos em ambas as lojas, mas com prioridade na distribuição via megastores da Hering. “É para colocar o nível de surpresa lá em cima. Acreditamos que isso pode ser exponencial para ambas as companhias tanto para atingir públicos diferentes quanto para a marca se aproximar de consumidores ‘do Rio de Janeiro para cima’, onde a Hering tradicionalmente não tem uma presença tão forte”, afirma Thiago.

De olho em um futuro com a marca mais estruturada, a meta da Hering é ter 1.000 lojas próprias em 2026 (hoje são 790) e mais de 16 mil pontos de venda. A principal novidade está nas megastores, a serem inauguradas a partir de junho deste ano e que devem somar 100 unidades dentro do plano de expansão nos próximos quatro anos. Elas devem ser uma versão ampliada do que hoje já está disponível nos shoppings Morumbi e JK, de acordo com o modelo 3D mostrado durante o evento. Com o conceito de loja integrada e de melhorar a experiência de compra em grandes espaços, o foco será revitalizar a Hering, tornando a marca mais atrativa ao público jovem.

A expansão acelerada das lojas físicas chamou a atenção de analistas presentes no evento, que questionaram se não seria o início de uma mudança para concentrar o crescimento dentro de casa — como o Grupo Soma sempre fez — em vez de contar com franqueados, modelo da Hering. A isso, a resposta de Tiago Hering e de Roberto Jatahy foi clara: “não”. O foco, segundo eles, será reforçar uma relação de confiança com esses parceiros e com os canais multimarcas também.

Diante da experiência inédita com franqueados, o Grupo Soma pretende trazer o modelo para outra marca do grupo, a Foxton. Segundo Jatahy, a empresa que teve inaugurações de loja postergadas por causa da pandemia, deve contar a partir deste ano com este novo modelo de expansão “híbrida”. “O Thiago queria acelerar isso desde um primeiro momento, por causa da relação que a Hering tem com franqueados, e nós seguramos. Agora, estamos no momento certo de fazer esse movimento”, afirma.

Demais marcas e futuro

Todas as marcas do grupo ocuparam seu espaços na apresentações ao longo do dia. A NV, nativa digital, está em uma fase de “exponencialização do crescimento”, Animale está em “ganho de share e crescimento sustentável” e as demais — Maria Filó, Cris Barros, Foxton e Fábula ainda vivem um momento de aceleração, uma vez que que têm menos de R$ 30 milhões de Ebitda cada.

Em relação à NV, adquirida pelo grupo recentemente, a fundadora Natália Vozza também falou pessoalmente dos planos e deixou no ar uma possibilidade de internacionalização. “Ela identifica uma necessidade de atender vários fãs que estão fora do Brasil com produtos. É um primeiro movimento de internacionalização que, eventualmente, pode se tornar algo mais amplo”, afirma Roberto.

A Animale, primeira marca co-fundada por Roberto Jatahy, passou por um processo de revitalização em 2019, que foi freado pela pandemia, mas já retomado com força. Com uma reformulação completa, a marca tem uma nova diretora executiva, Isabel Del Priori, e reformulou toda a estrutura de criativos dentro. O resultado foi uma receita 30% maior em 2021, na comparação com 2020. “Daqui para frente, um ecossistema mais maduro trará um novo universo de marca e produtos. Nada mais natural que a criação de novas lojas, valorizando nossos produtos e experiências. Essas iniciativas preparam a Animale para ser a marca número 1 de acesso ao luxo no Brasil”, afirmou Isabel. 

Novas marcas

Para o futuro, a meta de Roberto é uma só: continuar procurando por ativos que possam trazer valor para a companhia. “O setor passou por um momento muito delicado desde 2014 e, hoje, não há ativos para os quais estejamos olhando e que valham a pena comprar. Ativos menores não estão na nossa estratégia porque destroem valor. Mas, nossos olhos não estão fechados. Vamos procurar por algo a partir de 2024, para garantir a expansão do Grupo em um ritmo saudável”, afirma. É a essência do grupo: atenção para ousar, sem destruir valor.

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