Pimenta, CEO da Vale: Sem pressão do governo para a compra da Bamin (Vale/Divulgação)
Editora do EXAME IN
Publicado em 20 de fevereiro de 2025 às 17h10.
Última atualização em 20 de fevereiro de 2025 às 17h39.
A Vale fechou 2024 deixando para trás várias das incertezas que pesavam sobre a companhia.
Fechou a repactuação do acordo sobre o acidente em Mariana e trocou o comando garantindo a continuidade com o ex-CFO Gustavo Pimenta, que vem tecendo uma relação mais amistosa com o governo federal.
A venda de R$ 9 bilhões em ações para a saída da Cosan também tirou o peso de uma sobreoferta de papéis que pairava sobre a tese.
O balanço do quarto trimestre, divulgado ontem pela mineradora, trouxe agora boas notícias do lado operacional, animando os investidores e trazendo uma mensagem de uma empresa mais eficiente e mais focada nas entregas em áreas estratégicas, como minério e cobre.
“A Vale está reconstruindo a capacidade de entregar o que promete”, resumiu o vice-presidente de finanças, Marcelo Bacci, que assumiu o cargo há pouco mais de dois meses, depois de uma longa passagem pela Suzano, de papel e celulose.
A retomada da confiança na capacidade da Vale é crucial para trazer de volta o brilho das ações, que operam próximas das mínimas em cinco anos, nos níveis da época da pandemia e com desconto relevante em relação aos pares.
Símbolo da nova fase, o CFO e o CEO receberam alguns jornalistas na sede da Vale, na praia de Botafogo, para comentar o balanço – uma prática que tinha sido abandonada pela companhia já há alguns anos.
Num tom otimista, os executivos asseguraram a continuidade do trabalho interno que vem sendo feito para controle de custos. O custo-caixa por tonelada de minério de ferro caiu cerca de 10% tanto no trimestre contra trimestre quanto na comparação anual, retomando o patamar do começo de 2022.
No ano, o indicador ficou na faixa em US$ 21,8 por tonelada, no ponto mais baixo o guidance para o ano. A indicação para este ano é de um patamar entre US$ 20,5 e US$ 22 por tonelada.
“O negócio de commodity é naturalmente cíclico, por isso é importante garantir que se trabalha da forma mais eficiente possível. E estamos vendo resultado nesse trabalho”, disse Pimenta.
O foco em eficiência também se traduziu numa redução relevante no montante estimado para investimentos em 2025. Sem mexer no escopo dos projetos previstos para o ano, a mineradora cortou a meta para o ano de US$ 6,5 bilhões para US$ 5,9 bilhões.
“Vamos fazer as coisas que já estamos fazendo de maneira mais eficiente”, afirmou Bacci. Como exemplo do pente fino dos processos, ele citou especificações de engenharia que eram “rígidas demais” e envolviam custos mais elevados com fornecedores. Hoje, há soluções de engenharia mais baratas que levam a insumos mais baratos.
O melhor desempenho operacional abriu espaço para o pagamento de dividendos extraordinários de US$ 500 milhões, totalizando uma distribuição de US$ 2 bi, e a aprovação de um programa de recompra de até 3% das ações em circulação.
Esse foi um dos fatores que mais chamaram a atenção dos investidores e explica, em grande parte, a alta de 3% nas ações da companhia após o balanço (um salto hoje no minério de ferro também ajudou).
A meta da companhia, reforçou Bacci, é trazer a dívida expandida, que inclui despesas com reparações, para um patamar de US$ 15 bilhões – hoje, o indicador está em US$ 16 bilhões. Uma geração de caixa mais forte no primeiro trimestre deu segurança para a remuneração extra, apontou o executivo.
“Temos uma perspectiva bastante favorável de que vamos ficar dentro dessa meta dos US$ 15 bilhões”, disse, ponderando que a grande incerteza é sobre a cotação do minério de ferro. “Se a combinação permitir uma geração de caixa que vai nos levar abaixo de US$ 15 bi, naturalmente teremos mais disposição para fazer recompras e dividendos, ou as duas coisas. Vamos ter as duas opções em aberto.”
Com a operação mais azeitada, uma grande incerteza que ainda nubla a previsão é a fraqueza da economia chinesa, principal consumidor de minério de maior destino dos produtos da Vale.
Pimenta mostrou uma visão sóbria. “Houve uma mudança no mix, com crescimento que era forte em mercado imobiliário caindo substancialmente, mas compensado em parte pelo aumento da demanda por manufatura.”
Ele afirmou que outros mercados estão acelerando, como os do Sudeste Asiático e a Índia. “O mundo segue em crescimento. E o mundo em crescimento é bom para o minério de ferro.”
Olhando mais para o ano, ele acredita que os preços do minério de ferro atuais parecem estar em ‘equilíbrio’. Ciclones que estão afetando a produção na Austrália, onde estão grandes concorrentes, podem trazer uma pressão de curto prazo, mas não devem trazer mudanças estruturais.
O piso, diz, é um patamar de US$ 90 por tonelada, abaixo do qual mais de 150 milhões de toneladas de produção no mundo deixam de ser viáveis economicamente, puxando de volta o preço pelo lado da restrição de oferta.
Com um cenário internacional mais nebuloso por conta das tarifas de Trump, Pimenta adota um tom mais cauteloso. “É preciso entender o que ele vai fazer, quais realmente vão ser as tarifas”, ponderou, lembrando que os Estados Unidos são um país autossuficiente em minério.
A principal questão é em relação ao níquel, que a Vale produz via minas no Canadá. “É um produto crítico para a indústria de defesa americana, por exemplo, e os Estados Unidos dependem de importação”, diz. “Se houve algum ajuste, será repasse de preços, mas a demanda provavelmente seguirá.”
O novo CEO da Vale também vem promovendo uma agenda de maior aproximação com o governo – que ficou mais clara publicamente na semana passada com o lançamento do Projeto Novo Carajás, que prevê a expansão da produção na maior mina de ferro da companhia, no Pará.
O projeto, que pode somar até R$ 70 bilhões em investimento ao longo dos anos, foi lançado em conjunto com o presidente Luís Inácio Lula da Silva, num evento de tom mais conciliatório.
Nesse sentido, Pimenta descartou uma pressão do governo para que a companhia assuma a compra da Bamin, uma mineradora de ferro na Bahia que vem produzindo abaixo do esperado e tem compromissos de contração logística na região.
“Não teve nenhuma discussão. A gente sabe que é um projeto estruturante, de país, mas avaliação independe disso. Precisa percorrer processos internos”, afirmou.
“É um projeto de minério de ferro com potencial relevante. Estamos estudando, mas é cedo para dizer se é um processo que a gente vai seguir adiante.”
Sobre M&As de maneira geral, o executivo destacou que a prioridade da Vale é desenvolver os projetos próprios, alavancando a grande dotação minerária que tem em suas reservas e seu custo competitivo.
“Os projetos que estamos desenvolvendo de minério de ferro tem um custo de capital de cerca de um terço de qualquer outra jurisdição do mundo. Esse é um dos nossos principais diferenciais.”
Na área de metais básicos, o turnaround já está se traduzindo com a melhora na produção de cobre – segmento em que a empresa deve focar, dado seu grande papel na transição energética.
“Tivemos a melhor performance histórica de Base Metals, com um modelo de operação mais focado, trazendo gente dessa área”, afirmou.
A grande mudança é o foco nas operações específicas para efetivamente tirá-las do papel. “Em cobre, tem vários projetos que já estavam há 10 anos no pipeline da companhia, mas não conseguíamos ter sucesso no desenvolvimento. Com esse novo modelo, acredito que vamos conseguir avançar de fato nessa agenda.”
O mesmo vale para o projeto de Novo Carajás. “O crescimento de Carajás sempre foi importante, mas nuna tivemos um foco dedicado ao crescimento. Agora estamos criando uma diretoria só para Novo Carajás, com time 100% dedicado. Eu pessoalmente acredito nesse modelo.”
Na área de metais básicos, a empresa está tirando o pé de níquel – metal cujas cotações vêm sendo pressionadas por uma ampla sobreoferta da Indonésia. Isso deve impactar principalmente as operações do Canadá, onde o projeto de Thompson, em Manitoba, já foi colocado sob revisão, gerando uma baixa contábil relevante no balanço do quarto trimestre.
“Estamos olhando a base de ativos para otimizá-la para trazer esse negócio para um nível de rentabilidade melhor do que ele tem hoje”, aponta. Para a operação brasileira de Onça Puma, no Pará, não são previstas mudanças. “Continua sendo estratégico, com um custo que faz sentido dentro desse cenário.”