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Braskem vai cobrar R$ 230 milhões de genro de Emílio Odebrecht na Justiça

Conselho da petroquímica já aprovou que assunto seja levado à assembleia para abertura de ação de responsabilidade civil

Braskem: investigação interna sobre Maurício Ferro começou por denúncia de cunhado, Marcelo Odebrecht (Germano Luders/Exame)

Braskem: investigação interna sobre Maurício Ferro começou por denúncia de cunhado, Marcelo Odebrecht (Germano Luders/Exame)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 29 de setembro de 2020 às 20h51.

Última atualização em 29 de setembro de 2020 às 22h40.

A Braskem vai buscar reaver cerca de 230 milhões de seu ex-diretor jurídico Maurício Ferro, genro de Emílio Odebrecht, o patriarca vivo do conglomerado que leva seu sobrenome. A petroquímica é controlada pelo grupo de origem baiana, que tem 50,1% do capital votante e pouco mais de 38% do total das ações.

O conselho de administração da Braskem já aprovou que uma assembleia deve ser convocada para aprovar a abertura de uma ação de responsabilidade civil contra Ferro, segundo o EXAME IN apurou com fontes próximas ao tema. Ficou estabelecido que a convocação deve ocorrer até o fim deste ano. O objetivo é buscar o ressarcimento de valores que no entendimento da empresa foram desviados pelo seu ex-diretor jurídico, por meio do pagamentos  ao escritório do advogado Nilton Serson por serviços fictícios. Os desembolsos foram pessoalmente aprovados por Ferro entre os anos de 2010 e 2014.

Após investigação interna, a Braskem concluiu que Serson não prestou serviço algum, nem um único à companhia. Não foram localizadas evidências de que o escritório tenha feito qualquer trabalho à petroquímica mesmo após a análise de documentos e e-mails e de entrevistas com funcionários e ex-funcionários. Consultada, a companhia limitou-se a afirmar, por meio de sua assessoria de imprensa, que está buscando as medidas judiciais cabíveis quanto a este assunto.

Ferro é casado com Mônica Odebrecht, irmã de Marcelo Odebrecht — ambos filhos de Emílio. Marcelo e Maurício estão rompidos desde o período de prisão do ex-presidente do conglomerado, por desavenças ocorridas durante a negociação dos acordos de delação e leniência no âmbito da Operação Lava-Jato. Ferro esteve à frente das negociações com as autoridades pelo lado da companhia.

Como já existiam investigações sobre Ferro que nasceram dos desdobramentos da própria Lava-Jato, a Braskem registrou uma representação sobre o caso no Ministério Público Federal (MPF) de Brasília em junho com toda a documentação organizada durante as investigações. Há cerca de 30 dias, o MPF iniciou um inquérito para apurar o assunto, conforme pessoas que acompanham o tema de perto.

Em valores que não prescreveram, foram localizados 60 milhões de reais em pagamentos à Serson realizados naquela época. Atualizado, esse montante é da ordem de 230 milhões de reais. A convocação da assembleia será realizada com base no artigo 159 da Lei das Sociedades por Ações. A legislação diz que compete à empresa a abertura da ação, mas que o tema deve ser antes submetido aos acionistas. O caminho via MPF deu legitimidade para a petroquímica tentar reaver o saldo que entende ter sido indevidamente retirado de seu caixa até 2014. A Petrobras é sócia da Odebrecht no controle da Braskem, embora sem posição de controle.

Consultado, o advogado de Maurício Ferro, Gustavo Badaro, afirmou que haverá agora oportunidade para que dentro do inquérito sejam apresentados os argumentos que ex-executivo não conseguiu levar à empresa. Ele alega que a Braskem não deu oportunidade de defesa à Ferro e que há justificativa para todos os pagamentos, ainda que não existam documentos sobre os serviços. De acordo com Badaro, Serson prestava consultoria à petroquímica. Na avaliação dele, a Braskem está adotando essa postura porque seus conselheiros de administração têm medo de serem responsabilizados caso não façam nada sobre o assunto, mas que a investigação foi realizada às pressas e sem os devidos cuidados.

A questão, além de ser sensível para a Braskem, é também para a família Odebrecht, que saiu esfacelada da Operação Lava-Jato. Marcelo Odebrecht, sua esposa e filhas não falam mais com Emilio Odebrecht. Pior: brigam judicialmente, de forma indireta. Apesar de não mais estar na companhia, Emilio ainda é o mandatário da família à frente dos negócios (o sucessor será Maurício Odebrecht, irmão de Mônica e Marcelo).

O conglomerado iniciou no fim do ano passado uma cruzada para reaver de Marcelo pagamentos que foram realizados como parte de uma negociação para que ele aceitasse assinar sua colaboração premiada e, com isso,  tornar o acordo de leniência da empresa viável. O grupo agora alega que foi chantageado por Marcelo, que presidiu a empresa até a sua prisão, em junho de 2015. Com esses acontecimentos, o racha na família foi completo. Marcelo, que foi condenado por corrupção e uma série de crimes correlatos e cumpre prisão domiciliar, seguia tentando manter sua influência sobre o grupo, mesmo sendo impedido pela Justiça a participar da gestão do negócio. Além disso, também solicitava recursos e indenizações complementares ao grupo com ameaças veladas.

Efeito colateral dessa briga entre pai e filho, Marcelo acusa Maurício de ter atuado na negociação da leniência com a intenção única de se preservar e não se tornar alvo das investigações. E que essa conduta teria concentrado a culpa dos malfeitos nele, Marcelo — a despeito de a delação do grupo envolver 77 executivos da época.

Os pagamentos de Ferro à Serson, embora tenham sido descobertos em razão da Lava-Jato, não têm relação com a operação, até onde se sabe. O genro de Emílio de fato ficou de fora do acordo de colaboração, mas depois foi denunciado pelo MPF por corrupção, porque teria atuado na negociação de duas medidas provisórias (470 e 472) favoráveis ao conglomerado (uma especialmente importante para a Braskem). Ele já apresentou defesa quanto a essas acusações.

As investigações sobre os suspostos desvios na Braskem tiveram início após Marcelo Odebrecht ter dito ao MPF que havia encontrado uma remessa de 8 milhões de dólares de Ferro à Suíça e que não teria relação com os pagamentos autorizados pelo grupo e nem mesmo com depósito de bônus (era uma prática comum da Odebrecht transferir os prêmios aos executivos em contas fora do país). Houve, então, um aditamento da acusação do MPF. A partir daí, uma sequência de investigações teve início na Braskem e do MPF. Os trabalhos inclusive resultaram no atraso da documentação da Braskem à Securities and Exchangem Commission (SEC), relativas a 2017 e 2018, e à deslitagem automática da empresa da bolsa americana por descumprimento de regras.

Confira abaixo a íntegra da nota de Ferro ao EXAME IN:

"A defesa de Maurício Ferro não teve acesso à representação e seus termos. Ressalta que os serviços jurídicos prestados por Maurício Ferro à Braskem sempre foram pautados pela técnica e defesa dos interesses da companhia, relação que se encerrou há mais de 7 anos, tendo saído da companhia promovido para nova função de direção na holding do grupo Odebrecht. Nilton Serson foi contratado pela Braskem para diversas atuações de natureza jurídica, tendo efetivamente prestados os serviços com êxito para a companhia. É injustificável, sob a ótica do devido processo legal e da ampla defesa, o fato de Maurício sequer ter sido convidado para prestar esclarecimentos sobre os fatos de sua alçada. O Supremo Tribunal Federal possui farta jurisprudência apontando a nulidade e imprestabilidade de relatórios internos em que investigados sequer foram ouvidos. Foram seguidas todas as orientações e diretrizes da companhia para contratação de prestadores de serviço, que passaram pelos controles internos e externos da Braskem. Os pagamentos dos honorários seguiram estritamente o que foi previsto no contrato."

 

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