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Braskem: perda com problema em Alagoas equivale a 50% do valor na B3

Após fim de laudos, provisões alcançam R$ 8,5 bilhões, 63,5% mais do que o já lançado no balanço até agora

Exploração de sal-gema em Maceió: antes de provisões, riscos de contingências afastaram LyondellBasell da compra do controle (Leo Caldas/Exame)

Exploração de sal-gema em Maceió: antes de provisões, riscos de contingências afastaram LyondellBasell da compra do controle (Leo Caldas/Exame)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 15 de setembro de 2020 às 17h21.

Última atualização em 15 de setembro de 2020 às 17h39.

Os problemas da Braskem em Alagoas, com os afundamentos de bairros da capital Maceió devido à exploração das minas de sal-gema muito próximas à região metropolitana, não terminam de acabar. A redundância é proposital. A companhia anunciou nesta terça-feira, 15, mais um aumento nas provisões para dar conta das consequências ligadas ao assunto, que vão desde a mudança das famílias afetadas até o fechamento das minas — trabalho mais caro e mais demorado de todos.

O adicional foi de 3,3 bilhões de reais ou 63,5% sobre o que já existia, o que eleva o total reservado no balanço para esta causa a 8,5 bilhões de reais — montante equivalente a quase 50% do atual valor de mercado da companhia. Essa contingência quase faz os compromissos da empresa dobrarem, uma fez que o cálculo atualizado equivale a quase 95% da dívida financeira bruta (sem considerar os compromissos da sociedade mexicana Braskem-Idesa)

A Braskem não quer — e não vai — admitir formalmente, mas o EXAME In apurou que o entendimento é que essa seja a melhor estimativa final já obtida pela companhia desde que o assunto veio à tona. Soaria como música aos ouvidos dos investidores, que querem saber quanto, afinal, isso vai custar, e quando a dúvida vai acabar. A petroquímica, porém, não quer correr o risco de dar falsas informações ao mercado. Ainda existem questionamentos judiciais correlatos ao caso e a execução da solução ainda nem começou direito.

No fato relevante, a petroquímica qualificou a informação como “importante evolução na avaliação de potenciais impactos” e anunciou a “conclusão de estudos técnicos especializados independentes”, contratos de entidade reconhecidas internacionalmente no ramo.

Ninguém sabia exatamente o que esperar como total após a conclusão dos estudos, mas alguns analistas de mercado calculavam que a perda poderia alcançar 10 bilhões de reais — quase o dobro das provisões que existiam até então. A diferença entre as piores estimativas e o que foi divulgado ajuda a entender a alta das ações na bolsa diante de notícia tão aparentemente negativa. Há pouco, os papéis tinham alta de 1,59%, para 22,34 reais por PNA.

Ainda falta a Braskem anunciar um plano de execução para o fechamento das minas, conforme a decisão já anunciada e também em relação às moradias. Essas informações são importantes para ajudar a entender como será a saída de caixa. As provisões significam tão somente que a companhia antecipadamente admitiu essa perda potencial e já registrou isso no balanço. Em um primeiro momento, isso afeta o resultado sem afetar tanto o caixa. Ao longo do tempo, haverá o consumo do caixa com a questão, sem novos reflexos sobre o balanço (se não houver mesmo perdas adicionais).

A petroquímica terminou junho com 9,1 bilhões de reais de dívida financeira bruta e 2,7 bilhões de reais em caixa. A relação entre a dívida líquida e o Ebitda acumulado em 12 meses estava em 6,77 vezes ao fim do segundo trimestre. A companhia perdeu a classificação de grau de investimento pelas agências de crédito, em razão do aumento da alavancagem. Principalmente devido ao ciclo de baixa do setor, a queima de caixa nos seis primeiros meses do ano só com a operação já acumula em 1,5 bilhão de reais.

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A Braskem não se arrisca a dizer que tudo está encerrado. Ao contrário, afirma que há ainda assuntos em discussão e que não pode garantir que não haverá novos desdobramentos e eventuais custos associados. A petroquímica fala especificamente em relação à ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre danos socioambientais e que pretende exigir uma compensação de 20 bilhões de reais. No passado, houve iniciativa semelhante a respeito de causas trabalhistas e que solicitava 6,7 bilhões de reais de indenização — houve acordo entre as partes por 40 milhões de reais.

Outro prejuízo no front que pode ocorrer diz respeito a mais uma ação de classe que a Braskem se tornou alvo nos Estados Unidos. Os investidores alegam que não estavam bem informados sobre os riscos de perdas com Alagoas. Falhas de informações são praticamente o único argumento das ações coletivas americanas. Ainda não há uma estimativa, pois não houve sequer a formação da classe. Os escritórios estão nas fases iniciais dos procedimentos no Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ). A petroquímica foi alvo de iniciativa semelhante em razão da Operação Lava-Jato e encerrou a questão por meio de um acordo de 10 milhões de dólares, no início de 2018.

Dar um fim para essa interrogação é determinante, inclusive, para o futuro processo de venda do controle da companhia, que formalmente a controladora Odebrecht já colocou em andamento. Embora tenha anunciado o início dos trabalhos, a expectativa é que uma negociação e venda do controle da petroquímica só serão viáveis após a superação do ciclo de baixa do setor, de acordo com fontes diretamente envolvidas com o tema.

A Odebrecht tinha quase que por obrigação já dar a largada na estruturação desse processo. A Justiça homologou no fim de julho o plano de recuperação judicial da empresa, que reorganizou um total de 55 bilhões de reais em dívidas. Como parte do acordo para o plano, o conglomerado se comprometeu com bancos credores que possuem as ações da Braskem em garantia a acelerar o máximo possível a venda da empresa — Itaú, Bradesco, BNDES, Banco do Brasil e Santander.

A Odebrecht tem 38% do capital da companhia e o controle majoritário das ações votantes. A Petrobras é sócia por meio de acordo de acionistas, com 36% da empresa. As ações cobrem compromissos próximos de 15 bilhões de reais, na soma entre dívida principal e juros, mas o valor atual dos papéis equivale atualmente a menos da metade dos compromissos — 6,8 bilhões de reais.

No laudo do plano, o grupo estimava que precisaria obter 17 bilhões de reais por sua participação para honrar os vencimentos mais os impostos atrelados à transação. Quando negociava com a LyondellBasell a venda da empresa — que foi encerrada justamente devido às incertezas sobre Alagoas —, a Odebrecht espera receber entre 18 bilhões e 20 bilhões de reais pelos 38% da petroquímica. Na prática, equivalia a avaliar a companhia toda por 52,6 bilhões de reais — quase três vezes o valor atual na bolsa.

Ninguém sabe dizer se esse cenário pode um dia voltar e, muito menos, dentro de três anos — período máximo combinado com os bancos para a venda do controle. Hoje, predomina a crença de que a Odebrecht vai conseguir um valor inferior às dívidas pela Braskem e que, com isso, não sobrarão recursos extras nem para a holding do grupo, tampouco para ajudar a servir o restante da dívida reorganizada.

 

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