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Brasil ao Cubo: a história da construtech que nasceu como fábrica de obras e vai virar incorporadora

Startup foi de R$ 6 milhões em faturamento em 2018 para R$ 408 milhões em 2022 — e projeta R$ 650 milhões em 2023

Ricardo Mateus, fundador da Brasil ao Cubo: inovação e endosso de grandes empresas ajudaram empresa a crescer  (Leandro Fonseca/Exame)

Ricardo Mateus, fundador da Brasil ao Cubo: inovação e endosso de grandes empresas ajudaram empresa a crescer (Leandro Fonseca/Exame)

Karina Souza
Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 24 de abril de 2023 às 16h56.

Última atualização em 24 de abril de 2023 às 17h56.

"A indústria da construção civil é a única que não acontece dentro de uma fábrica. Por que não desenvolver um modelo capaz de cumprir essa tarefa?". A pergunta, curiosamente, é a resposta de Ricardo Mateus, CEO e fundador da Brasil ao Cubo , startup especializada em construções modulares de aço, ao começar a explicar por que decidiu empreender no setor. É um mix de experiência com conhecimento: o executivo começou como soldador de estruturas metálicas aos 13 anos na empresa de seu pai e, depois, conciliou o trabalho com os estudos, se formando em engenharia (civil e de produção). Em 2013, conseguiu, enfim, resolver essa pergunta com um plano de negócios e, em 2016, nasceu a Brasil ao Cubo, com um investimento de R$ 400 mil por 25% da empresa.

O setor é visto como promissor até mesmo por quem já está há mais tempo nele. Em 2020, a Tenda concluiu a primeira leva de casas pré-fabricadas com a Alea, marca que já existe desde 2013 dentro do grupo, mas que há três anos começou a 'levar obras para dentro da fábrica'. Em 2022, essa marca, sozinha, faturou R$ 30,4 milhões, aumento de 59,4% sobre o ano anterior.

No caso da Brasil ao Cubo, a história também é de crescimento. A receita da empresa aumentou mais de 400% de 2019 a 2022, totalizando R$ 408 milhões no ano passado. Para 2023, a expectativa é de que a primeira linha do balanço chegue aos R$ 650 milhões.

Nesse período, a empresa não só aumentou vendas, mas seguiu com geração positiva de caixa (e crescente) apesar de sustentar um ritmo elevado de expansão. O Ebitda, que era de R$ 10 milhões em 2019, passou para R$ 28 milhões em 2022, com expectativa de R$ 40 milhões em 2023. A história da empresa foi contada na edição deste mês da EXAME, junto com outros cinco cases de startups que fugiram do "inverno" e conseguiram crescer.

Um dos grandes pontos para entender o crescimento da empresa, hoje presente em 13 estados, está na capacidade de adaptação (e da sustentabilidade atrelada aos projetos).  Em 2016, a construtech era apenas uma fábrica de obras. Dois anos depois, trouxe a expertise de sócios de grandes obras industriais para dentro de casa, de olho em se tornar uma construtora especializada em construção modular. Nesse caminho, a empresa também conseguiu agregar mais inovação para a forma como trabalhava, resultando em um diferencial competitivo importante: a pré-construção. 

Pode parecer algo básico, mas é o fato de a companhia conseguir literalmente fabricar a obra de forma virtual e ter todas as dimensões feitas como serão realizadas na obra (em escala) um dos principais fatores para conseguir ganhar tempo em cada projeto, uma vez que esse recurso planejamento permite que a empresa consiga ver antes um problema que apareceria somente na obra.  Além disso, um fator importante é a quantidade de mão de obra empregada em cada obra: são cem engenheiros e arquitetos disponibilizados a cada projeto. Esse é o ponto de virada diante de outras empresas modulares no setor, na visão do fundador. “O produto é fácil de fazer, não é necessário ter maquinário especial. Mas o planejamento bem feito faz toda a diferença”, diz Mateus.

Em relação à concorrência, o CEO afirma que tem, a seu favor, o fato de já ter nascido totalmente digital. "Uma coisa é ter a mentalidade voltadas para inovação e outra é ter que se reinventar. Nós temos 1.000 funcionários, com idade média de 32 anos. Claro, temos alguns 'cabeças brancas' para dar uma equilibrada, mas principalmente uma nova geração que vem com muito gás", diz.

Ao dar impulso aos projetos, usando aço, a companhia consegue produzir dez vezes menos resíduos do que o modo tradicional de construção e levantar projetos até quatro vezes mais rápido. Atributos mais do que valorizados para construir hospitais em tempos de crise -- um projeto em que a companhia mergulhou de cabeça. Na pandemia, a empresa entregou em quatro hospitais (não de campanha, mas fixos) em 115 dias.

Hoje, mesmo depois do período mais crítico da covid-19 ter ficado para trás, a companhia continua sendo procurada pelo setor de saúde. Recentemente, construiu um hospital para o Einstein em 150 dias, um quarto do prazo normal para esse tipo de obra. A velocidade também chamou a atenção de outros setores: a companhia  conseguiu, por exemplo, fechar contratos de construção de fábricas com empresas como Vale Ambev. 

Os acordos foram impulsionados pela proposta de inovação, é claro, mas também pelos sócios de peso que a startup conseguiu trazer para dentro de casa ao longo do tempo, como GerdauDexco (antiga Duratex). "Tudo que é novo gera incerteza e medo, e para combater isso, precisamos de endosso e reputação, algo que conquistamos com nossos sócios", afirma Mateus. Hoje, a Gerdau é a sócia majoritária do negócio, com 44% da empresa — o primeiro aporte veio em 2020, por um terço do negócio. Em 2022,  a Dexco também se associou à construtech, com um aporte de R$ 74 milhões por 13% do negócio. Mais uma vez, o percentual cresceu ao longo do tempo e, hoje, já está em 19%. O fundador, Ricardo Mateus, tem outros 19% e o restante está distribuído entre sócios minoritários, predominantemente funcionários da empresa. 

O ‘namoro’ com a principal sócia da empresa começou ainda em 2018, por meio de um programa de aceleração conduzido pela empresa de aço, chamado Gerdau Builders. O projeto, conduzido em parceria com a Endeavor, buscava empreendedores dedicados ao setor de construção civil e moradia. Sob um olhar mais amplo, fez parte da estratégia traçada pela empresa ao longo dos últimos dez anos em busca de inovação. E culminou, anos depois (em 2020, para ser exata) na criação da Gerdau Next, braço de novos negócios que tem como missão diversificar globalmente o portfólio.

“Hoje, você olha para a Gerdau e diz que é uma empresa de siderurgia e mineração. O objetivo final, com a Gerdau Next, é que possa dizer, no futuro, que é uma empresa de ‘siderurgia, mineração, energia e logística’, por exemplo”, diz Juliano Prado, vice-presidente da Gerdau e líder da Gerdau Next, em entrevista ao EXAME In. No caminho para esse objetivo, a Gerdau Next foi estruturada de olho em três verticais: construtech, logística e sustentabilidade.

A sequência de aportes na vertical de construtechs foi iniciada pela Brasil ao Cubo, no fim de 2020. Além dela, a Gerdau tem como case a norte-americana Plant Prefab, cuja atividade final também é construção de pré-fabricados, mas focada no segmento residencial. A empresa de aço investiu na empresa via venture capital, em 2020, com um aporte de US$ 80 milhões. Passando para as demais verticais da Next, se destaca, em logística, o investimento realizado no operador logístico G2L, empresa que já fatura R$ 1,3 bilhão. E, em sustentabilidade, o investimento mais recente foi realizado na Newave energia, com um aporte inicial de R$ 500 milhões ao longo de 2023 e mais R$ 1 bilhão condicionado a metas de desempenho. 

A companhia segue comprometida em apoiar o desenvolvimento de todas as startups. No caso da Brasil ao Cubo, mesmo depois do porte que a startup já chegou, a companhia ainda não abre planos de uma eventual venda de participação — por meio de um IPO, por exemplo. O foco está em desenvolver tudo 'dentro de casa' e procurar novas oportunidades. “Falamos com cerca de 1.560 startups por ano. E não digo só e-mail, mas reunião, interagimos de fato tanto com empresas no Brasil quanto no Vale do Silício”, diz Prado. 

O crescimento em conjunto, da construtech com a Gerdau, também é visto com bons olhos pelo fundador da Brasil ao Cubo. Para continuar crescendo daqui pela frente, Mateus não vê, em meio ao custo de capital mais caro, a realização de novas rodadas de captação, nem de uma eventual abertura de capital. A companhia segue trabalhando em estratégias de crescimento orgânico.

Depois de se transformar de fábrica de construção em construtora, o passo estudado a partir de agora é se transformar em uma incorporadora. Este ano, a empresa dará seu primeiro passo em direção a esse teste, com um empreendimento inédito de prédio residencial de 15 andares. O edifício de alto padrão, com laje de 430 metros quadrados, estará localizado na cidade-sede da empresa e deve ficar pronto até o fim de 2023. 

Apesar de ser o primeiro edifício para morar construído pela Brasil ao Cubo, a empresa já construiu cinco casas de alto padrão, no Brasil e no México. A experiência fora do país foi positiva, com a residência sendo construída em pouco mais de 50 dias. “Nossa engenharia fez todo o projeto e teve um funcionário da Brasil ao Cubo lá. O restante da operação foi toda mexicana. Isso nos deu uma visão de escala. O centro de serviços compartilhados entrega e uma pessoa da empresa pode fazer todo o projeto junto com mão de obra local”, afirma Mateus. 

Depois de tanto crescimento ao longo dos últimos anos, Gerdau e Brasil ao Cubo seguem de olho no ecossistema de construtechs. Inclusive, deram um passo na direção desse setor recentemente, ao integrarem o Construliving, iniciativa do Cubo Itaú que aproxima construtoras de startups do setor. É um novo modelo de negócio, de olho em um futuro mais sustentável e em meio a uma demanda cada vez maior por eficiência. Para a Brasil ao Cubo, é apenas o começo. Para a Gerdau, um caminho para uma das companhias mais tradicionais do país se manter jovem. 

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