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Bolsa: Por que Felipe Miranda acha que agora a inversão de ciclo vem - e será histórica

Semana teve mini rally do Ibovespa com valorização acumulada de 5,5%

Felipe Miranda: há motivos apontando que a queda da taxa de juros está dada (Empiricus/Divulgação)

Felipe Miranda: há motivos apontando que a queda da taxa de juros está dada (Empiricus/Divulgação)

Graziella Valenti
Graziella Valenti

Editora Exame IN

Publicado em 15 de abril de 2023 às 12h38.

Última atualização em 15 de abril de 2023 às 19h59.

Para quem gosta do rendimento de 13,75% que a taxa Selic proporciona ao ano, a semana que passou foi de causar inveja. Só que no mercado de ações. O Índice Bovespa acumulou valorização de quase 5,5% em cinco pregões, entre segunda e sexta-feira, 14. Foi um mini rally, no qual algumas empresas viram suas ações registrarem alta de dois dígitos.

Felipe Miranda, fundador e analista da Empiricus, do grupo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame), acredita que os investidores estão prestes a assistir uma inversão de ciclo histórica nos mercados de ações. O movimento, acredita ele, deve ocorrer tanto no Brasil como nos Estados Unidos. Contudo, vai começar por aqui.

O motivo, claro, é a expectativa de redução na taxa de juros, uma tendência que, segundo ele, já está dada neste momento. Alguns fatores explicam por qual motivo ao menor sinal de otimismo, a reação na bolsa foi tão forte.

Como o EXAME IN demonstrou nessa semana, a alocação de toda indústria de fundos de investimento em ações está próxima do piso da série histórica, que começou a ser medida pela Anbima em 2006. De todo o patrimônio, que está em R$ 5,8trilhões, apenas 9% está aplicado em bolsa – esse percentual só foi abaixo dos 10% no período do Impeachment de Dilma Roussef, entre 2015 e 2017.

Além disso, o mercado carrega ainda um grande estoque de posições em vendidas – em março foi o pico do ano. Na semana passada, alguns investidores foram forçados a fazer cobertura dessas apostas, o que aumentou a força compradora de papéis.

Os sinais positivos recentes vieram tanto de declarações positivas de representantes do mercado, a respeito do novo arabouço fiscal, quanto da divulgação da inflação de março. O IPCA, divulgado pelo IBGE, mostrou em março uma desaceleração. O índice teve alta de 0,71% no mês passado, ante o 0,84% visto em fevereiro. Além disso, o indicador ficou marginalmente abaixo das previsões, que estavam na média em 0,77%.

Confira abaixo as razões do otimismo de Miranda:

 Você tem falado bastante, nos últimos dias, sobre uma inversão de ciclo histórica no Brasil. O que leva você a acreditar nisso?

Felipe Miranda: Está dado que a taxa de juros no Brasil vai começar a cair. Não vai ser maio, mas muito provavelmente será em junho. Mas isso [quando, exatamente] importa menos. Importa mais a direção. E é ainda mais forte porque está ligado a três questões domésticas: porque existem condições para isso, ou seja, a inflação está recuando na margem; porque o arcabouço fiscal não é tão ruim; e, por fim, por causa do fluxo. Quando você tem juro a 13,75%, a pessoa física vende R$ 100 milhões por dia em bolsa e dispara um monte de resgates em fundos.

Estamos numa alocação proporcionalmente muito baixa, só se viu algo semelhante na época do Impeachment da Dilma Roussef. Essa baixa alocação também pode ser considerada um sinal da proximidade da inflexão?

Miranda: Certamente. Você tem tudo isso. O fluxo de notícias, que fica mais positivo, e o fluxo de recursos. Para mudar a direção do dinheiro, porém, é preciso uma justificativa. É preciso ter um trigger e agora tem. O juro vai cair. A posição técnica desse momento também é muito boa. Seja pela baixa alocação, seja pelo short. A posição vendida em bolsa é recorde. Essa semana foi típica desse tipo de cenário. Teve dia que algumas ações subiram mais de 10% em um dia. Isso é cobertura de short.

Sim, mas mesmo quando a taxa de juros começar a cair, o ajuste deve ser gradual. Ou seja, os fatores de pressão sobre a economia e as empresas deve continuar.

Miranda: É verdade, a realidade ainda é dura. Não estou pintando um Brasil mágico. É sempre a comparação entre preço e valor intrínseco. É como se o valor estivesse nota 5 e o preço, dois. O que acreditamos é que deve ocorrer essa convergência. Mesmo com as altas desses últimos dias, a gente negocia ainda em torno de 7 vezes o lucro. Esse juro real que temos é só no Brasil. O dólar justo, para acompanhar peso mexicano ou peso chileno, deveria ser R$ 4,70. Então, tem muito espaço para correções.

Mas essa relação preço lucro que você citou considera a situação atual das empresas, em que os lucros estão menores e pressionados pelas despesas financeiras e pelo ambiente macro?

Miranda: Talvez você tenha um lucro baixo ainda neste ano, mas roubado justamente pela despesa financeira. Então, o mercado vai começar já a fazer conta para 2024. Mercado vive de antecipação. A leitura vai ser de que estamos saindo desse cenário negativo. Então, é como se o ano de 2023 sujasse a base. O que vai acontecer é uma expansão dos múltiplos, fazendo o valor intrínseco aumentar. Vai ser um duplo efeito. Lembre-se que existem empresas que perderam 80% do valor. Se algo que, antes custava R$ 10, está em R$ 2 hoje e for para R$ 4 amanhã, vai dobrar de preço e ainda assim vai acumular um ajuste negativo de 60%. E existem empresas em que o fundamento melhorou.

Existe uma diferença de setores entre os que mais se beneficiam e os que menos ganham com o ajuste?

Miranda: Aqui a discussão é sobre a combinação entre risco e retorno. O que está muito amassado são as empresas alavancadas, com dívida alta, e aquelas com e-commerce e negócios ainda para se rentabilizar. Essas, caso o cenário bom se confirme, vão liderar o rally. Por outro lado, o risco aqui é altíssimo. Vale lembrar que as coisas no Brasil são dinâmicas e há um mês o [presidente] Lula estava brigando com o Roberto Campos Neto [presidente do Banco Central]. O maior retorno potencial estar nessas empresas não significa que elas são a melhor combinação entre risco e retorno. O cenário ainda é de guerra. Nesse contexto, prefiro os generais, porque são os últimos a cair. Isso quer dizer as empresas líderes setoriais, geradoras de caixa, com marcas reconhecidas e que são sensíveis aos juros sem estar excessivamente alavancadas. Estou falando de Cosan, Equatorial, Iguatemi, do próprio BTG Pactual, para citar alguns.

Considerando que os fundos estão pouco investidos em bolsa e que existem ainda muitos vendidos, o que vai acontecer quando o humor virar?

Miranda: O [Nassim] Taleb tem a melhor metáfora para isso: o mercado é um teatro grande com uma porta pequena. Então, talvez quando o investidor pensar em entrar, se ele quiser maior segurança, o preço já não estará tão atrativo. Porque vai corrigir em um susto. Tudo é uma questão de decidir quanto risco o investidor quer correr.

O que você está dizendo é que pode ficar tarde, é isso?

Miranda: Sim. Mas depende da disposição de risco. Se o investidor quiser esperar para saber qual Lula vai predominar, se o que briga com o Campos Neto ou aquele que elogia o arcabouço fiscal, talvez fique tarde mesmo. Nessa semana, o Ruy Costa [ministro da Casa Civil] disse que o mercado pode colaborar para o Brasil entrar em um ciclo virtuoso com a queda do câmbio. É emblemático isso. A queda do dólar ajuda a segurar a inflação, que ajuda a derrubar os juros.

Quem olhar só para os fundos pode perder timing, correto?

Miranda: Sim. É precisa tomar cuidado com duas coisas. Se estivermos falando de fundos multimercados, é possível dizer: eles também erram. Nossa indústria de fundos de multimercados é formada por especialistas macro. Os grandes gestores não têm origem em equity, ações. São especialistas em juros, câmbio, commodities. Quem realmente entende de bolsa, são poucas casas.

Mas, de maneira resumida, sobre tudo que falamos, é possível concluir que para o mercado é mais importante a expectativa do que juro caia, do que ele baixo de fato?

Miranda: Mercado antecipa. É muito eficiente. Não importa mais se vai cair em junho ou agosto. O que importa é que a direção está dada. A inflação no Brasil já deu sinais, como nessa semana, de queda. E também nos Estados Unidos. O juro, é preciso que se fale, é destruidor para bolsa. Ele reduz custo financeiro das empresas, o fluxo de recursos migra, a economia expande e os negócios vendem mais. Passaremos a competir de uma forma diferente com os ativos no mundo.

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