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BNDES faz contraproposta para aceitar que Klabin compre Klabin

Dono de 7,5% do capital da empresa, banco gerou debate dentro do bloco de controle da companhia sobre acordo de royalties

Klabin: empresa tenta dar fim a acordo que prevê pagamento de 1,37% da receita aos donos pelo uso da marca (Germano Lüders/Exame)

Klabin: empresa tenta dar fim a acordo que prevê pagamento de 1,37% da receita aos donos pelo uso da marca (Germano Lüders/Exame)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 25 de agosto de 2020 às 12h38.

Última atualização em 25 de agosto de 2020 às 12h54.

A questão dos royalties da família Klabin segue sem um desfecho na companhia fabricante de papel, um mês depois de o conselho de administração aprovar um acordo entre a empresa e os sócios controladores. O BNDES, maior acionista minoritário da Klabin, com 7,54% do capital total, se posicionou contra os termos sugeridos novamente e apresentou uma contraproposta com valores sensivelmente menores — cujas condições exatas seguem guardadas a sete-chaves.

A iniciativa disparou uma discussão entre os controladores. As holdings que controlam a Klabin abrigam diversas famílias. Conforme o EXAME IN apurou, os acionistas mais antigos estão menos dispostos a fazer alterações no que foi aprovado pelo conselho, enquanto as novas gerações estão mais abertas a ajustes. Alguns acreditam que o debate pode de fato levar a uma queda no preço do acordo, em patamar acima do sugerido pelo BNDES e abaixo dos que foi divulgado.

A companhia anunciou estar disposta a pagar 367 milhões de reais aos acionistas controladores, com a emissão de 92,9 milhões de ações ordinárias, para comprar definitivamente sua própria marca (sobrenome da família) e dar fim a um contrato de 25 anos que a obriga a pagar royalties pelo uso do nome — 1,37% da receita líquida das vendas de cartões e papelão ondulado. As ações serão usadas para incorporar a Sogemar, sociedade que detém os direitos, e equivalem a uma diluição de 1,65%.

Em termos absolutos, a proposta atual cresceu sobre sua primeira versão, de fevereiro de 2019, quando era de 344 milhões de reais, pois foi corrigida pelo CDI. Na ocasião, porém, o valor presente da perpetuidade do contrato era pouco superior a 700 milhões e esse total subiu para mais de 900 milhões de reais na atualidade. O que significa que em termos relativos o acordo embutiria um desconto maior. O total de ações a serem emitidas também foi reduzido, tal qual a diluição, que seria de 1,9%.

O BNDES rechaçou a operação em 2019. E agora, se mostra contrário aos termos da segunda. Entre a primeira e a segunda versão, houve alguma evolução. Antes, o banco havia dados sinais de que o contrato não tinha valor — defendia o mero cancelamento — e neste ano indicou que o encerramento poderia sim ter  algum preço. Antes da aprovação da nova operação, o banco sinalizou 140 milhões de reais. Esse montante, contudo, era apenas um indicativo. Agora, após o conselho da Klabin ter aprovado a versão atualizada, o BNDES fez uma contraproposta acima disso.

O banco tem papel importante na discussão não apenas por ser o maior acionista minoritário da Klabin — e um dos maiores financiadores também. O BNDES foi um dos grandes provocadores de toda a discussão em torno do assunto, mostrando-se desde 2016 incomodado com os pagamentos. A questão ganhou relevância também com o restante da base acionária da empresa e tornou-se uma mácula na percepção das práticas de governança corporativa da empresa.

Aos investidores, a Klabin tem transmitido confiança de que o assunto será aprovado pelos acionistas. O tema precisa passar pelo crivo de uma assembleia na qual acionistas ordinaristas e preferencialistas poderão votar — e os controladores beneficiados ficarão de fora da decisão. Descontadas as ações em tesouraria e a participação dos controladores, o peso do BNDES em assembleia sobe para 10,5%. A gestora BlackRock também é acionista relevante, com 4,4% do capital total — o que equivale a uma participação de 6,1% na decisão.

O engajamento do BNDES no tema indica que o banco não deve vender sua fatia na empresa, como tem se mostrado disposto a fazer, antes que a questão esteja resolvida. A percepção de muitos analistas é que o fim dos royalties poderia promover uma melhora na percepção de mercado da empresa e, portanto, destravar valor — ainda que a empresa esteja hoje em sua máxima histórica, avaliada em mais de 29 bilhões de reais na B3.

A ata completa da reunião do conselho de administração em 21 de julho que aprovou — por maioria, não por unanimidade — o acordo atualizado já evidenciava a existência de discrepâncias no debate. Mauro Rodrigues da Cunha, conselheiro independente da empresa, foi contra o contrato e sinalizou como um valor justo um total equivalente a 250 milhões de reais, que seria um montante aproximado ao custo de desenvolver uma nova marca pela empresa, caso decidisse abandonar a atual para evitar os royalties. Em seu voto, ele deixa evidente a falta de entendimento prévio com o BNDES sobre o assunto. E sugere que seja realizada uma mediação — o que não ocorreu e nem está ocorrendo, conforme o EXAME IN apurou. Quem tem se dedicado a buscar o consenso é o próprio presidente da empresa, Cristiano Cardoso Teixeira, empenhado em promover uma evolução no tema da governança.

Rodrigues da Cunha afirma no documento que, entre a primeira tentativa de aprovação do contrato e a segunda, a Klabin pagou 83 milhões de reais em royalties à família. Os valores serão cada vez maiores: isso porque a receita da empresa tem crescido com a alta do dólar e há dois grandes projetos de expansão em andamento.

No primeiro semestre deste ano, os volumes vendidos pela Klabin tiveram aumento de 7% e a receita líquida cresceu 9%, para 5,55 bilhões de reais. Em 2019, os pagamentos totalizaram 59 milhões de reais.

A nova versão do acordo foi aprovada pelos conselheiros independentes Amaury Bier, Pedro Oliva Marcílio, José Luis Freire, Amaury Olsen e Vivian Mikui. Rodrigues da Cunha foi contra. Resultado: 5 x 1.

Pela ata da reunião, Olsen e Mikui acompanharam o voto de Freire, que em sua manifestação defendeu o acordo e afirmou que os valores negociados estavam dentro dos parâmetros avaliados pelo grupo de trabalho que estudou o assunto e “atendem aos melhores interesses da companhia”.

Marcílio acompanhou a manifestação de Bier. Em seu voto, ele escreveu entender que a condição acordada “se afigura razoável”. E aponta que é muito difícil calcular um valor justo para uma marca e que, por conta disso, sua análise considera o custo alternativo de desenvolvimento de uma nova e os riscos associados a isso.

Bier trouxe ao debate uma alternativa para atualização do valor definido na negociação de 2019 e base para o acordo atual. Sugere que se subtraia, dos 344 milhões estabelecidos no ano passado, os royalties pagos desde então e se acrescente os dividendos que seriam devidos. Considerando que a empresa pagou 0,34 real por ação em proventos em 2019 e o valor citado por Cunha, o total final ficaria em torno de 290 milhões, nos cálculos do EXAME IN. “Fiz um apelo aos controladores para que considerem esta alternativa visto que, com ela, a proposta se aproximaria do anseio de minoritários importantes, como o BNDES”, diz o voto do executivo.

 

 

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