Exame IN

BeFly: crise da covid abriu apetite para modelo one-stop-shop e levou à receita de R$ 8 bi

Empresa se tornou holding dentro do segmento, com 36 aquisições realizadas de 2020 para cá; faturamento cresceu 17 vezes desde então

BeFly: cross-selling é citado por CEO como diferencial para companhia crescer no país (Getty Images/Getty Images)

BeFly: cross-selling é citado por CEO como diferencial para companhia crescer no país (Getty Images/Getty Images)

Karina Souza
Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 18 de abril de 2023 às 21h49.

Última atualização em 19 de abril de 2023 às 14h22.

Uma empresa brasileira de turismo alcançou um feito incomum: multiplicou a receita bruta por 17 vezes da pandemia para cá: A BeFly. A companhia, que só perde em tamanho para a Decolar e a CVC, é uma exceção em um setor que ainda não se recuperou totalmente do baque gerado pela covid-19. De acordo com dados da Fecomercio, o segmento de Turismo faturou R$ 208 bilhões em 2022 -- cifra maior do que a de 2021, mas ainda ainda 12% abaixo da registrada em 2019. No meio do caos, a empresa arregaçou as mangas e resolveu conduzir uma estratégia de consolidação, com o intuito de se tornar um ecossistema de negócios para o setor. Trinta e seis aquisições depois, a visão do CEO, Marcelo Cohen, é de que o plano deu certo. "Compramos empresas rentáveis e estamos gerando caixa", diz, em entrevista ao EXAME IN, diz, sem revelar números. A única cifra disponibilizada pela empresa é a receita bruta: estimativa de R$ 10 bilhões para 2023, crescimento de 20% em relação ao ano anterior. Em 2019, antes de todo esse processo começar, era de R$ 600 milhões.

Para continuar crescendo, o plano de consolidação segue a todo vapor.  A empresa analisa, mensalmente, de 10 a 15 oportunidades de compra. Uma delas foi concluída nesta semana, a aquisição da Jazz Side, empresa especializada em ativações personalizadas para marcas e eventos corporativos. O valor da transação não foi revelado, apenas foi divulgada a informação de que a empresa faturou R$ 100 milhões em 2022. Aliás, das 36 aquisições feitas até agora, só uma teve a cifra divulgada: a primeira, da Flytour, maior agência de viagens corporativas do Brasil, realizada ainda em 2020, por R$ 500 milhões.

Inclusive, foi essa compra que deu o nome atual da companhia: BeFly é a união de Flytour com Belvitur, a empresa fundada pelo pai do atual CEO, David Cohen, em 1963, e que se tornou uma das maiores agências de viagens de Belo Horizonte. Ao assumir a cadeira do pai em 2020, Cohen (filho) aproveitou o período de baixa no setor -- e de bolso cheio da companhia -- para expandir a atuação da empresa a todo o Brasil.

Mais do que olhar para o potencial de receita agregada com as novas empresas, a companhia trabalha desde já no potencial a ser explorado ao oferecer o serviço para outros clientes da casa. É o tal cross-selling o primeiro fator citado pelo CEO como diferencial da companhia para sobreviver em meio a um mercado que ainda traz desafios. Hoje, o grupo atende pequenas e médias empresas, realiza eventos e viagens a lazer, atua como consolidadora (uma espécie de 'broker' para agências de turismo menores) com mais de 5 mil agências conveniadas e ainda tem serviços de câmbio, prestados em parceria com o banco Daycoval. "Vou dar um exemplo. Temos dentro da Flytour uma grande montadora de carros, que fazia viagens conosco, mas não eventos. Fomos lá com a Queensberry, nossa empresa do grupo especializada nisso e, depois, passamos a realizar todos os eventos para essa empresa”, diz Cohen.

A estratégia de oferecer diferentes serviços não é incomum no setor. A CVC, por exemplo, tem a marca de agências de viagens e serviços, além de uma agência de intercâmbio estudantil, portal de venda online de passagens aéreas, consolidadora, empresa especializada em viagens personalizadas e uma marca de locação e administração de residências. Isso sem falar na CVC Corp, maior agência de turismo da América Latina.

Ao se tornar uma one-stop-shop para o setor, a companhia ganhou escala para conseguir praticar preços baixos. Mensalmente, a BeFly emite 800 mil passagens aéreas, um montante que permite à empresa ter negociações melhores com companhias aéreas. Uma estratégia similar é seguida para o serviço de câmbio: ao praticar spreads menores, diante de uma demanda grande, o grupo convence clientes com condições mais atrativas de conversão da moeda. Em tempos de consumidor de baixa renda com o bolso ainda mais apertado, a companhia também também tem caprichado nas promoções da Vai Voando, empresa voltada para as classes C e D, com tarifas especiais e formas de pagamento diferenciadas.

Isso sem esquecer do atendimento para dar conta das 5 mil agências conveniadas. “É um relacionamento super saudável, tem sistema, atendimento 24 horas. Incentivamos o agente de viagem a ter as melhores ferramentas”, diz o CEO. O 'incentivo', no caso, vem também na forma financeira: a empresa não cobra nada ao fornecer o sistema de broker, mas ganha receita a cada venda realizada pelo agente. 

Além de ganhar escala, a companhia também buscou, de forma inorgânica, construir capacidade de tecnologia. Das 36 aquisições, mais de 10 foram de plataformas ligadas ao turismo: sistemas de back office, de venda de passagens online e até mesmo a criação de uma inteligência artificial para vendas vieram daí. A IA, apelidada pela companhia de "Bel", está no ar há oito meses. E já fatura, sozinha, três vezes mais do que o maior agente de viagens ligado à empresa. Os números são, respectivamente, R$ 3 milhões e R$ 1 milhão mensais.

“É um recurso disponível 24 horas por dia, automatizado, só passa para o vendedor na hora de passar o cartão na maquininha", diz Cohen. Apesar dos avanços, o executivo é enfático no papel que os agentes exercem na empresa. "Faz 30 anos que eu escuto que o agente de viagem vai acabar e cada vez mais esse mercado cresce. É um profissional que merece respeito”.

Daqui para frente, a empresa quer trabalhar nas sinergias entre as empresas adquiridas e analisa, continuamente, novas oportunidades. Os times de M&A olham desde empresas do setor de turismo propriamente dito até startups e fintechs. Hoje, a companhia tem mais duas a três conversas avançadas para compras a serem finalizadas em breve. Todas as aquisições são financiadas com o caixa da companhia, tendo o banco Master como advisor. Em tempos de juro alto, a companhia não vê a necessidade de contrair dívida para continuar crescendo. 

Diante de tamanha procura para possíveis aquisições, e de uma necessidade cada vez maior de serviços de tecnologia, a empresa começou um projeto de aceleração recentemente. Hoje, já existe a oportunidade de empresas serem colocadas dentro do ecossistema da companhia e receberem mentoria, um programa pelo qual cinco startups já passaram. 

Dentro de casa, o foco para o ano está em aproveitar ao máximo as sinergias entre as empresas adquiridas, de olho em rentabilidade. Back-office, tecnologia e cross-selling constroem os quatro pilares de trabalho para a companhia ao longo de 2023, de acordo com o CEO.

De geração em geração, a BeFly mostra que tem apetite para crescer, sem deixar de lado a confiança no setor e o foco em lucratividade. Em 60 anos, a companhia foi do zero para líder em Minas Gerais, e, agora, mira o primeiro lugar em todo o país.

Acompanhe tudo sobre:Viagens

Mais de Exame IN

Renner vem bem no terceiro trimestre – mas não tão bem quanto se esperava

Vinci compra controle do Outback no Brasil em operação de R$ 2 bi

Magazine Luiza lucra R$ 70 milhões no 3º tri e bate (de longe) consenso

Para lidar com juros altos, Assaí reduz alavancagem e fica menos promocional no 3º tri