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Bed Bath and Beyond: sem CEO e CFO, o que será do futuro da companhia?

Do auge em 2013 para a derrocada em 2022 em resultados, somado a tragédia com um dos executivos, dúvida dos analistas é se a companhia ficará sem dinheiro daqui para frente

 (Gabby Jones/Bloomberg/Getty Images)

(Gabby Jones/Bloomberg/Getty Images)

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Karina Souza

Publicado em 5 de setembro de 2022 às 13h50.

Última atualização em 5 de setembro de 2022 às 19h13.

O filme “Click”, lançado em 2006, é um daqueles fenômenos de audiência: beira o impossível encontrar alguém que não tenha uma opinião formada sobre a obra — que arrecadou US$ 240,7 milhões nas bilheterias mundiais e, por aqui, já até passou na famosa Sessão da Tarde. A primeira lembrança que vem à mente é do ator principal e seu controle remoto azul, mas uma memória nem tão óbvia é que a loja na qual ele compra o item é uma Bed Bath & Beyond. Em um fast-forward pelos últimos dezesseis anos, é possível ver que a opinião pública sobre a empresa mudou tanto quanto a vida do personagem de Adam Sandler na trama. Assim como nas partes mais tristes do filme, a companhia enfrenta momentos turbulentos, para dizer o mínimo – sem uma previsão clara de quando eles devem acabar.

Fundada em 1971, a BBBY surgiu quando dois ex-funcionários de uma loja de descontos tiveram a ideia de criar uma varejista especializada em artigos para casa. A aposta inicial foi por duas lojas, cada uma com 660 metros quadrados: uma em Nova York e outra em New Jersey. O negócio foi crescendo e ganhou corpo a partir dos anos 1985, impulsionado principalmente pela redução no volume de artigos para casa dentro dos hipermercados. Nos anos 1990, o ritmo de abertura de lojas atingiu o auge de 45 novas unidades inauguradas em 1999. Além da ampla gama de produtos, o atendimento ao cliente era um ponto forte da companhia – havia até uma medida que, se um cliente não encontrasse um produto na loja, ele seria enviado via delivery sem custo adicional.

Quase vinte anos depois do 'auge', o cenário mudou da água para o vinho. No segundo trimestre deste ano, as vendas caíram 25% na comparação anual e a última linha do balanço da companhia fechou em US$ 358 milhões negativos, um rombo ainda maior do que o prejuízo de US$ 51 milhões do mesmo período do ano passado. De acordo com informações do Financial Times, a projeção de queda, anual, é de 20%. As ações fecharam o último pregão a US$ 8,63, um patamar distante dos US$ 30,06, a máxima das últimas 52 semanas. E são quase um décimo do auge de todos os tempos da companhia: ações cotadas a US$ 80, em 2013.

A queda no preço do papel reflete a própria derrocada da companhia ao longo do tempo. Em 2012, o lucro bruto foi de US$ 4,3 bilhões, com uma margem de 40,2% em relação às vendas líquidas. Olhando a cifra em relação aos três anos anteriores, é possível ver uma trajetória de alta (os lucros foram, respectivamente, US$ 3,9 bilhões em 2011 e US$ 3,6 bilhões em 2010). Em 2021, os resultados não voltaram aos patamares registrados há cerca de dez anos, mas derreteram na comparação: o lucro bruto foi de US$ 2,4 bilhões, com uma margem de 31,6%. Mais do que isso, o cenário se inverteu completamente. Em vez de uma trajetória ascendente, a descendente. O indicador marcou US$ 3,1 bilhões em 2021 e US$ 3,5 bilhões em 2020.

Algumas razões apontadas para os resultados pífios da companhia em olhar mais recente são ressaltados por analistas: falta de eficiência na gestão de estoques e das próprias lojas, em meio a um ambiente no qual o e-commerce ganha cada vez mais protagonismo. No Brasil, não há um paralelo direto para a BBBY, mas é possível ver essa relação, ainda que de forma indireta, nos resultados de super e hipermercados. Apesar de não terem uma queda tão brusca quanto a da companhia norte-americana, fato é que se trata de um modelo com baixa probabilidade de crescimento, com base nos dados disponíveis até aqui – em tempos de restrição de poder de compra, outros formatos como mercados menores e atacarejos ganham protagonismo. Além disso, dá para se lembrar da recente saída do Walmart do país, depois de anos tentando fazer o “preço baixo todo dia” vingar no Brasil.

No caso da Bed Bath and Beyond, algum vestígio de movimento para contornar esse cenário veio em 2019, com a chegada de Mark Tritton (ex-Target) para coordenar a rota da companhia de volta ao crescimento. O executivo trouxe um choque de gestão, trazendo executivos de fora de olho em ‘arrumar a casa’. Em 2020, a companhia reportou um crescimento de 77% nas vendas digitais na comparação anual, com projeção de que excedesse a meta de US$ 3 bilhões até fevereiro do ano seguinte (mês em que o ano fiscal da companhia termina). No mesmo ano, a empresa ganhou sete milhões de consumidores on-line. São resultados importantes, mesmo diante do cenário atual.

Hoje, as vendas digitais ainda estão longe de representar a maior parte da receita. Em junho deste ano, cerca de 27% das vendas da Bed Bath and Beyond foram realizadas de forma on-line – uma evolução, é claro, em relação aos 15% que representavam no mesmo mês de 2019. De lá para cá, a companhia fez parcerias com diferentes empresas como Instacart Shipt e DoorDash, de olho em melhorar a eficiência de entregas dos produtos. Um ponto relevante é que, mesmo com o e-commerce representando uma pequena parte das compras, os consumidores que compram online gastam mais, como mostra uma análise da Bloomberg. Em junho deste ano, os compradores digitais tiveram um tíquete médio de US$ 116, enquanto o das lojas físicas foi de US$ 80.

Há uma expectativa de que a transformação nos canais digitais continue para a companhia daqui para frente, mas a forma como isso será feito ainda permanece uma incógnita. Após os resultados do segundo trimestre – o segundo consecutivo de baixas – o recém-chegado CEO foi demitido.  “Depois de uma decisão difícil, o conselho determinou que era hora de mudanças na liderança”, afirmou Harriet Edelmen, presidente independente do board da companhia. Enquanto isso, Sue Gove, membro independente do conselho, assume a companhia como presidente interina. 

Ao mesmo tempo, nas lojas físicas, a situação da empresa ficou tão complicada que a companhia passou a desligar o ar-condicionado nas lojas e reduzir a carga horária de funcionários, como apontou relatório do Bank of America. O fato ganhou a mídia norte-americana e, em entrevista à CNN, a companhia afirmou que as mudanças não vêm de uma diretriz corporativa.

Como reflexo de todo esse cenário, um relatório publicado pelo Bank of America em junho apontou que a companhia poderia estar caminhando para a extinção, em meio aos problemas para aumentar vendas e rentabilidade. “A liquidez é nossa principal preocupação depois que a empresa queimou mais de US$ 500 milhões no primeiro trimestre”, afirmou o analista Jason Haas, em um relatório divulgado em junho. A queima de caixa no segundo trimestre já diminuiu, para US$ 325 milhões.

Pouco depois da divulgação dos resultados dos últimos três meses, analistas também ressaltaram o aumento de promoções na loja. Algumas, até mesmo com descontos superiores a 50%. Ainda em entrevista à CNN, a Riley Securities afirmou que, apesar do esforço de preços menores para atrair a população, o tráfego nas lojas não havia aumentado. É uma situação similar à do Walmart e da Target no país – mas estes conseguiram manter o volume de clientes, enquanto a varejista de produtos para casa tem uma queda de 20% a 30% ano a ano em relação a isso.

De olho em melhorar a estrutura financeira da empresa, o então CFO da companhia, Gustavo Arnal, realizou uma reunião com investidores no dia 31 de agosto em que anunciou uma série de medidas para melhorar a estrutura financeira da BBBY: um empréstimo de US$ 500 milhões, melhorias na marca BuyBuyBaby, fechamento de 150 lojas e redução de pessoal, além de uma possível venda de 12 milhões de ações, de olho em uma estrutura de capital mais eficiente.

As mudanças, de acordo com a apresentação, vão permitir que a companhia tenha uma despesa de capital no fim do ano de US$ 250 milhões, ante os US$ 400 milhões previstos. Para trazer o que isso significa hoje, a dívida total da companhia sobre o Ebitda está em 7,15 vezes. Considerando a dívida de longo prazo apresentada no último relatório, está em US$ 1,1 bilhão, com um caixa de US$ 400 milhões.

Em meio ao turbilhão de dificuldades que a companhia enfrenta, uma tragédia se somou. A morte de Arnal, na última sexta-feira, no que o relatório policial de Nova York definiu como um possível suicídio. Ele, que também chegou à companhia após a reestruturação do alto escalão, enfrentava acusações de um esquema de “pump and dump” (definido como uma fraude para aumentar artificialmente o valor de mercado da companhia). Além dele, Ryan Cohen (da GameStop) também foi acusado de participar do esquema, lucrando mais de US$ 60 milhões com a operação. A class action foi protocolada recentemente, em 23 de agosto.

Agora, sem o CEO e o CFO, a visão de Wall Street sobre o assunto é a de que a empresa tem de ocupar ambos os cargos rapidamente e de forma efetiva. Na última quarta-feira, a CEO interina, Sue Gove – que tem experiência de mais de 30 anos no varejo – promoveu dois outros executivos para colaborarem nesse processo de reestruturação, para assumirem as frentes da BBBY e da BuyBuyBaby. Enquanto isso, entre os indicados para um possível cargo de COO, estão Anu Gupta, o chefe de crescimento da companhia, ou Mark Cassebaum, vice-presidente sênior de finanças, segundo o WSJ. De acordo com analistas ouvidos pelo jornal, a busca por um novo CFO deve demorar pelo menos três meses, em meio às expectativas de crescimento por parte do mercado e à busca por um novo CEO. 

Em meio à reinvenção da forma como as pessoas compram e aos desafios de logística globais, a Bed Bath and Beyond terá de provar que consegue se reinventar de volta ao crescimento. Os desafios estão longe de serem poucos ou fáceis de serem cumpridos – incluindo o cenário macroeconômico, um fator que a companhia não pode influenciar diretamente. Por enquanto, a estrutura do balanço causa uma dúvida pertinente em Wall Street: "será que a empresa ficará sem dinheiro?". Ainda não é possível ter essa resposta com certeza. Mas, no olhar mais otimista de todos, a expectativa é a de que, assim como no icônico filme de Adam Sandler, a empresa possa, no fim das contas, encontrar um final feliz em tempo hábil. 

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