Xavier, da SPX: "Os bancos centrais estão morrendo de medo de fazer besteira" (SPX/Divulgação)
Editora do EXAME IN
Publicado em 20 de agosto de 2024 às 19h54.
Última atualização em 21 de agosto de 2024 às 15h58.
Num ano marcado por um humor ciclotímico com as taxas de juros dos EUA e seu reflexo sobre todos os ativos globais, o debate que reúne anualmente a tríade de titãs da gestão brasileira no Macro Day do BTG (do mesmo grupo de controle da Exame), o tema não poderia ser outro.
Enquanto André Jakurski, da JGP, e Luis Stulhberger, do Verde, estão mais construtivos com a economia americana, prevendo alguma desaceleração, mas ainda num patamar elevado de atividade, Rogério Xavier, da SPX, fez o seu costumeiro papel de ‘urubu’, como ele mesmo já se autointitulou em outras edições do evento.
Para ele, a economia mundial e a dos Estados Unidos estão em franca desaceleração e o Fed pode se ver obrigado a reduzir os juros de maneira mais agressiva que o esperado para segurar a maior economia do mundo.
“O mundo, de maneira geral, está num processo de desaceleração, e achar que a economia americana vai ficar no mesmo patamar que estava com o mundo desacelerando é uma hipótese de trabalho otimista”, afirma, acrescentando que outras economias desenvolvidas como o Canadá, já cortaram os juros e estão falando em levá-los para abaixo da taxa neutra.
“Escreve aí: logo logo o mercado vai começar a colocar na tela um juro negativo na Suíça. Se eles vão fazer mesmo, eu não sei, mas o mercado vai precificar.”
No mesmo sentido, argumenta, a China deve seguir crescendo pouco e “exportando deflação”.
Na dinâmica do mercado interno americano, Xavier pontua que a inflação vem caindo consistentemente nos Estados Unidos e que, apesar de os resultados das empresas no segundo trimestre não terem vindo ruins, os guidances fornecidos por elas para frente “não são animadores”.
Nesse sentido, a indefinição nas eleições americanas é outro fator de “paralisia” na economia dos Estados Unidos.
“Eu não tenho a menor ideia de quem vai ganhar, é um grande 50-50, e não estou considerando isso nas minhas análises para tomar risco. Mas, para mim, o grande efeito nas eleições dos Estados Unidos é a paralisia. Eu prefiro ter certeza de que fulano ou beltrano vai ganhar do que não ter a menor ideia, porque isso faz restringir meus investimentos.
"Se o Trump ganhar, vai ter mais tarifa [de importação]. Se a Kamala ganhar, vai ter mais imposto [de renda]. Como um empresário vai tomar a decisão de investimento se não sei qual imposto vou pagar, qual produto vai ser taxado? Essa incerteza diminui a expectativa de investimento da economia. E o consumo está ok, está andando perto de seus 2,5%, mas os investimentos também estavam fortes nos Estados Unidos e eram um dos motores da economia.”
Para Jakurski, a vitória de Kamala é o melhor cenário. “Prefiro um bêbado conhecido do que um alcóolatra anônimo”, disse, tirando risos da plateia.
O bêbado conhecido, no caso, é a candidata democrata.
“Eu sei o que vai acontecer com a Kamala: menos capitalismo, mais socialismo, mais distributivismo, mais governo. E do outro lado, você tem o Trump, que é um cara desgovernado, imprevisível.
Eu prefiro a Kamala, apesar de achar que é um desastre para a economia ocidental, para o capitalismo, para os mercados”, afirmou, em alusão às propostas de aumento de imposto de renda para 28% e um provável aumento no imposto sobre ganho de capital de pessoas físicas.
“Talvez isso até provoque uma venda maciça de ações em dezembro deste ano, para fugir deste aumento”, alerta.
O chairman e sócio do BTG Pactual, André Esteves, que mediava o debate, adicionou que está menos preocupado com uma vitória de Trump. "Seis meses atrás acreditava que, depois do 6 de janeiro, muitas pessoas boas e técnicas que estavam perto dele poderiam se afastar num novo mandato. Não tenho mais essa preocupação. Eu subestimei o poder da cadeira de presidente dos Estados Unidos."
Diante das incertezas, Xavier acredita que os mercados em globais em vertigem neste ano têm muito a ver com uma postura mais vacilante dos BCs, em especial do Fed.
“Esse processo de nervosismo que está sendo colocado no mercado foi estimulado pelos próprios bancos centrais, que estão com medo de errar”, afirmou. “Eles estão morrendo de medo de fazer besteira.”
Segundo ele, Jerome Powell telegrafou a expectativa de corte de 175 pontos que o mercado estimava nas taxas básicas de juros no começo do ano, dando a entender que os cortes começariam em março e não em junho – apenas para se assustar com os dados do mercado de trabalho e voltar atrás.
Da mesma forma, membros do Federal Reserve chegaram a dizer que discutiram queda de juros em julho, o que alimentou a expectativa de cortes mais agressivos e, de certa forma, o pânico verificado há duas semanas, na segunda sangrenta quando um conjunto de dados do mercado de trabalho surpreenderam para baixo.
“Ficou aquela sensação de que o Fed pudesse já estar behind the curve [atrás da curva]”, disse.
O mesmo vale para o Brasil, onde discussões políticas sobre a condução do Banco Central trouxeram bastante volatilidade para as curvas. (A oportunidade agora, diz ele, é única para Galípolo aumentar os juros e ancorar a credibilidade dos quatro anos de seu mandato.)
Olhando de maneira mais estrutural, Jakurski afirmou que uma das razões para a volatilidade exacerbada dos mercados é um vício na injeção brutal de liquidez que os bancos centrais fizeram ao longo da última década e meia.
“O mercado financeiro foi viciado pelo QE, foi a pior coisa que aconteceu no mundo nos últimos 20 anos. Eu lembro que há cinco anos atrás, nesse mesmo painel, eu falei que não eram os ativos que estavam subindo, era o dinheiro que estava caindo. Eu vou te dizer: não imaginava o que viria depois da economia. O dinheiro está despencando, não está caindo, estamos vivendo uma ilusão monetária.”
Stulhberger pondera ainda que os fundos quantitativos, operados via algoritmos, que tiveram um papel relevante na segunda sangrenta das últimas duas semanas, quando uma combinação de dados de trabalhos ruins nos Estados Unidos com alta de juros no Japão trouxe um dia de pânico nos mercados globais.
“Você não sabe quantos trilhões de dólares tem nesses fundos. E o maior blow-up de quant foi no trade que todo mundo tinha, que era long México e short Yen. Isso aqui é um problema muito mais da maneira que os mercados operam hoje alavancados, você não tem uma pessoa pilotando aquilo no fundamento”, diz.
Ao que tudo indica, a volatilidade exacerbada – dos mercados e de opiniões – não tem data para acabar.