Monitora PIP: ferramenta que ajuda empresas a identificar atividades irregulares já tem resultados (Getty Images/Getty Images)
Karina Souza
Publicado em 17 de outubro de 2022 às 11h21.
Verificar e monitorar atividades de investimentos de colaboradores que têm acesso a informações privilegiadas. Essa é, em uma síntese bastante curta, a premissa da Monitora PIP, ferramenta lançada pela B3 para ajudar empresas a diminuir a incidência de práticas como o front running (uso de informações antecipadas em negociações que podem influenciar a formação de preços de ativos) e o insider trading.
Antes de explicar como a ferramenta funciona com mais detalhes, cabe um adendo importante. a Monitora PIP é foi desenvolvida e é disponibilizada ao mercado pela B3, mas a instituição não faz nenhum tipo de fiscalização sobre a atividade de pessoas físicas na bolsa de valores. O que o software faz, na prática, é mostrar às empresas clientes as informações sobre o que os colaboradores estão fazendo no mercado de ativos listados e balcão. O que cada corporação vai fazer a partir dessas informações varia de acordo com a política delas e não depende de nenhum ponto relacionado à B3. "Nós só apontamos para as empresas o que acontece. O que elas vão fazer a partir disso depende da interpretação delas", diz Felipe Grecco, superintendente de Relacionamento com Clientes da B3, ao EXAME IN.
Os diálogos com o mercado a respeito do interesse nessa oferta começaram a acontecer desde janeiro, mas foi só por volta de julho que a operação começou, efetivamente, a funcionar. A companhia ainda não divulga quantas empresas já fazem uso da ferramenta, mas afirma que, entre os clientes, há quem já tenha identificado fraudes cometidas. A meta daqui para frente, segundo Felipe Grecco, superintendente de Relacionamento com Clientes da B3, e Pablo Lima, superintendente de produtos da B3, é fazer com que mais e mais empresas tenham acesso a esse produto — para colocar um número, os executivos afirmam que há o objetivo de que todas as empresas listadas na bolsa possam usá-la.
Mas afinal, como a coisa toda funciona? Para entender, é necessário voltar a como tudo era feito antes dela. Hoje, empresas listadas têm, cada uma, o livro de ações (que fica no escriturador). Diariamente, as empresas podem acompanhar a posição dos investidores junto a esses profissionais, dessa forma ainda um tanto analógica, para verificarem a diferença entre as posições fechadas a cada dia. Com a ferramenta, além de esse processo ser conduzido de forma digital, é possível ter mais controle sobre pontos que não ficam tão evidentes no livro.
“Antes, era possível ver somente as posições no fim de cada dia, se alguém terminou o pregão com mais ações do que tinha antes ou com menos. Agora, se fosse realizada uma operação de day trade, isso não aparecia no livro. Outras operações com opções, derivativos, também não estariam ali. Isso tudo é refletido na ferramenta, em que monitoramos todo o mercado de ativos listados e balcão”, diz Grecco. Ou seja: com o novo software, empresas podem ter uma visão geral dos investimentos dos próprios funcionários, em todas as instituições financeiras com as quais eles se relacionam.
Fazer com que isso funcione é, na verdade, um processo bastante simples. Basta contratar a Monitora PIP (não é necessário fazer nenhum tipo de integração ou algo similar), criar um login para acessar a plataforma e inserir nela o nome completo e CPF de quem a empresa precisa receber as informações. A partir daí, uma espécie de “extrato” das operações deles poderá ser consultada quando a empresa quiser.
Além das empresas abertas, escritórios de advocacia, bancos e consultorias são alguns dos públicos-alvo estabelecidos pela B3 para aderirem à nova ferramenta. “Ter um funcionário acusado de insider trading é um risco enorme de imagem para uma empresa, esteja ela em qualquer ramo. Acreditamos que esses públicos podem se beneficiar em grande parte desse lançamento”, diz Lima. Os preços para contratação não são divulgados. O que há é uma mensuração que concilia o volume de CPFs a serem monitorados com o custo final para cada cliente, com a premissa de atender empresas de todos os tamanhos.
Em relação a um possível mau uso (por exemplo, a tentativa de consultar dados de uma pessoa que não trabalha na empresa cuja solução foi contratada), a B3 explica que faz auditorias periódicas e que, caso seja identificado algum problema desse tipo, a empresa em questão pode ser penalizada. Além disso, a ferramenta consegue capturar quando duas instituições diferentes inserem um mesmo CPF para consulta.
Questionados a respeito de um possível aceite para que as informações sejam compartilhadas – tendo em mente a LGPD – o que os porta-vozes da B3 explicam é que a finalidade da ferramenta de prevenir fraudes não demanda um 'aceite' específico, mas que o uso da Monitora PIP deve ser avisado e incluído dentro das políticas das empresas que a contratarem.
Tudo na ferramenta foi desenvolvido com a inteligência de dados e análises da própria B3, principalmente. Em relação à recém-adquirida Neoway, startup que desenvolve soluções de big data e inteligência artificial, o que Grecco e Lima explicam é que algum processo ou boa prática da empresa pode ter sido aproveitado na ferramenta, mas que a empresa comprada não tem acesso às informações específicas por questões de confidencialidade. Hoje, a Neoway funciona apenas como um canal de distribuição da Monitora PIP.
"Há outras empresas que criaram soluções semelhantes para esse mesmo serviço, mas a nossa abrangência de mercado é um diferencial. Trabalhamos muito nesse lançamento e compartilhamos todos os avanços com a CVM, que tem total ciência de como o projeto foi desenvolvido e de como funciona", diz Grecco.