Azul: seu fundador e controlador David Neeleman vendeu a maioria de suas ações preferenciais (Paulo Whitaker/Reuters)
Graziella Valenti
Publicado em 18 de abril de 2020 às 09h20.
“Não quero falar a cada hora uma coisa. Quero chegar com uma solução clara sobre o que dá para pagar e quando.” É assim que o vice-presidente financeiro e de relações com investidores da Azul, Alexandre Malfitani, explicou ao EXAME IN o mutirão de especialistas que a companhia contratou para lidar com as consequências da paralisação das atividades.
As empresas aéreas brasileiras estão operando com menos de 10% de sua capacidade, neste momento, para voos domésticos. Os internacionais estão totalmente suspensos. “Estamos no auge da incerteza. Só sabemos que em algum momento do curto prazo voltaremos a operar. Mas ninguém sabe exatamente quando e nem com que velocidade as coisas vão voltar à normalidade”, afirmou.
Por isso, disse ele na entrevista, a companhia quer estar preparada para tudo. “Nosso dever, nesse momento, é colocar a companhia para hibernar.” A Azul anunciou na quinta pela manhã a contratação de dois grandes escritórios de advocacia - Thomaz Bastos, Waisberg, Kurzweil (TWK) Advogados e Pinheiro Neto - para lidar com compromissos e vencimentos, mais a Galeazzi & Associados para reorganizar o negócio e ainda a Plane View Partners, especializada no relacionamento com fabricantes e empresas de arrendamento de aeronaves.
O objetivo é, assim que houver alguma clareza de cenário, desenvolver um plano para ser levado aos credores, com um cronograma “realista” de pagamentos, explicou o executivo. Entre as medidas mais drásticas adotadas pela empresa também está colocar boa parte dos funcionários em licença não remunerada. Por enquanto, de acordo com o vice-presidente financeiro, não é possível dizer que tamanho o negócio ficará e quais os objetivos finais da Azul.
Malfitani contou que, assim como outras empresas do setor, suspendeu os pagamentos dos contratos de arrendamento de aeronaves. O balanço da companhia de dezembro registrava 15 bilhões de reais em compromissos, sendo 11,1 bilhões de reais relacionados à leasing. A Azul tinha, então, 6 bilhões em caixa – dos quase 3,1 bilhões de reais livres de fato para uso.
O executivo afirmou que a situação atingiu todo setor e não há temor de perder aviões para os arrendadores, os “lessores”, como são chamados no jargão do setor. “Não há um temor específico em relação à Azul. O lessor vai tirar a aeronave de mim e entregar para quem operar? Onde tem alguém operando hoje? Ele prefere deixar comigo, para quando o mercado retomar.”
A Azul, assim como Gol e Latam, aguarda a definição de um pacote de auxílio ao setor, que está sendo desenvolvido pelo BNDES e contará com atuação em parceria dos grandes bancos comerciais, Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil, e fundos especializados. O plano do governo é organizar um mecanismo que coloque 3 bilhões de reais à disposição de cada uma das companhias em instrumentos de dívida (debêntures) e ações (bônus de subscrição).
A meta, ressaltou o executivo, é preparar a Azul, com todas as frentes que estiverem disponíveis, para o novo cenário de forma que possa voltar a gerar caixa. Quando questionado a respeito da execução de garantias de um empréstimo do fundador e controlador David Neeleman, que resultou na venda da maioria de suas ações preferenciais, Malfitani afirmou que o compromisso do empresário não mudou. “O melhor que ele pode fazer, que todos nós podemos fazer, é tornar a Azul rentável novamente. A empresa é muito mais do que um emprego para nós que estamos desde a fundação.”
Sem dar detalhes, Malfitani disse que a Azul será capaz de ajustar seu tamanho ao que for necessário de acordo com a realidade do mercado e com o equilíbrio de suas contas. “Continuamos acreditando no potencial do mercado brasileiro. Aqui, enquanto o PIB cresceu 1,5%, o setor teve expansão de 7,5%. A alavancagem com a economia é muito alta.”
A pandemia do coronavírus que colocou os aviões no chão e trancou em casa metade do planeta, atingiu a companhia em fase de expansão. A receita subiu 26% no ano passado e passou de 11,4 bilhões de reais, quando consolidada a operação de cargas – passando pela primeira vez da dezena de bilhão. A Azul recebeu 13 novos aviões no último trimestre de 2019, acreditando na expansão do setor neste ano. Não houve tempo sequer de iniciar a retorno desse investimento.