Belmiro Gomes: disciplina na gestão de custos para avançar no Brasil (Assaí/Divulgação)
Karina Souza
Publicado em 30 de agosto de 2022 às 19h32.
Última atualização em 30 de agosto de 2022 às 19h32.
O Assaí, que fatura R$ 60 bilhões anualmente e tem mais de 220 lojas no Brasil, estuda abrir uma seção especial no relatório do terceiro trimestre deste ano para explicar os custos pré-operacionais de abertura de lojas, segundo Belmiro Gomes, CEO da companhia. A declaração foi feita em um evento à imprensa nesta terça-feira (30), no qual executivos apresentaram o novo modelo desses estabelecimentos, com foco em mais serviços aos consumidores. O local escolhido foi a loja da Anhanguera, em São Paulo, ponto de venda que pertencia ao Extra — incluído no ‘pacote’ de 71 lojas adquiridas da rede de hipermercados por R$ 5,2 bilhões em outubro do ano passado. O plano é que as inaugurações contribuam para o guidance da companhia, de chegar a R$ 100 bilhões de faturamento em 2024.
A intenção de apresentar os dados separadamente não vem sem razão. O Assaí tem a meta de inaugurar 40 das lojas adquiridas (ou seja, 60%) até o fim deste ano, o que traz um peso relevante ao balanço quando o assunto é despesa. Hoje, a companhia tem oito mil funcionários contratados para estabelecimentos que ainda não entraram em operação. É um número que representa mais do que o tamanho da companhia inteira em 2011 — e aproximadamente 13% do quadro total de funcionários do Assaí atualmente. Esse gasto com pessoal, somado às reformas, traz custos pré-operacionais 2,5 vezes maiores em relação ao mesmo período do ano passado, por uma razão simples: em 2021, nesse período, eram cinco lojas em fase de construção e, hoje, são 30 só do Extra. Ao todo, a empresa tem 53 obras em andamento.
Olhando principalmente para o efeito das lojas convertidas, o segundo semestre deste ano é o período mais pesado em investimentos. Entre as demais, 21 estão planejadas para começarem a operar a partir do ano que vem e as remanescentes ainda aguardam negociações com proprietários ou licenças fornecidas por órgãos públicos. Questionado a respeito da probabilidade de essas lojas não virem pro portfólio do Assaí, Gomes explica que é baixíssima. O projeto das lojas do Extra, de modo geral, deve durar até o primeiro trimestre do ano que vem.
Até lá, o intuito do disclaimer no relatório é o de trazer ainda mais transparência e clareza para os resultados da companhia, uma vez que as despesas maiores também devem impactar a margem da companhia no curto prazo. No segundo trimestre, pouco desse efeito já apareceu: a margem bruta teve queda de 0,7 ponto percentual e a margem Ebitda ficou estável (queda de 0,1 ponto percentual), para 7,4%, mesmo com a expansão do Ebitda em 29,9%, para R$ 978 milhões.
Para o terceiro trimestre, a conta fica mais pesada porque, além da concentração da aberturas de lojas (que já têm como característica terem preços menores na inauguração) e reformas, o mês de setembro é marcado por promoções de aniversário do Assaí. Tudo isso já estava previsto pela empresa, que chegou a anunciar um guidance para 2022 de uma margem Ebitda 0,5 ponto percentual menor do que a registrada em 2021, o que daria algo em torno de 7% no fim deste ano.
Mesmo com tudo já comunicado, dentro do possível, o CEO repetiu várias vezes aos jornalistas o compromisso de manter a rentabilidade e o crescimento da companhia, olhando para o futuro. Hoje, as despesas gerais e administrativas da companhia representam 9,5% da receita, um patamar estável nos últimos dez anos, de acordo com os resultados da empresa — e que deve se manter assim ao longo dos próximos anos. “Existe um benchmarking da CostCo, de chegar a 9%, mas o que se tem de levar em consideração é que a companhia norte-americana usa esse fator para lojas já maduras, com mais de cinco anos em funcionamento”, diz.
Tomando esse fator como base e o intuito do Assaí de não parar de expandir tão cedo, a perspectiva de que a margem se mantenha nos patamares já observados persiste. Para exemplificá-lo, Gomes explica que a companhia continua de olho em terrenos em grandes cidades e regiões metropolitanas. Aquisições de pontos de venda do Makro, de concessionárias e fábricas já foram realizadas pela companhia, num esforço de expansão. Um outro ponto que destrava esse crescimento, na visão do executivo, é o fato de o Assaí hoje atuar de forma separada do GPA — uma vez que, quando estavam sob o mesmo guarda-chuva, os pontos de venda eram selecionados pensando no todo.
A loja da Anhanguera tem capacidade para 10.500 produtos, ante a média de 8.500 da companhia em geral. Como reflexo da maior área e do maior mix de produtos, as novas lojas devem faturar mais. A estimativa é de R$ 500 milhões por ano, em comparação aos R$ 400 milhões de lojas localizadas em grandes centros urbanos e com porte similar. A venda bruta por metro quadrado é estimada em R$ 5,3 mil, ante R$ 4,5 mil na média da companhia.
A adaptação de um formato de loja de hipermercado para o atacarejo levou 150 dias, segundo José Leon, diretor de expansão e obras do Assaí, e foi feito seguindo todos os protocolos ESG. Entre os principais pontos para transformar um ponto de venda em outro está a adaptação para receber caminhões — hoje, 80% da mercadoria vendida no local é entregue ali, enquanto só os 20% restantes vêm do CD — e a transformação do piso de loja: o de um hipermercado aguenta aproximadamente 800 quilos por metro quadrado e o da loja, atualmente, aguenta quatro toneladas.
O foco do discurso do executivo é mostrar que o esforço da companhia vai compensar. A razão está principalmente na ‘raridade’ dos ativos sob a gestão da companhia no momento: grandes espaços que já eram de área construída e estão em pontos de grande circulação em centros urbanos. Para ter uma ideia do que isso significa em custo, o executivo afirma que construir uma loja como a que será inaugurada amanhã, do zero, levaria um investimento de R$ 100 milhões, enquanto o custo total de colocá-la de pé foi de metade disso.
Para fornecer alguma projeção de ganhos futuros, o executivo aponta um ‘case de sucesso’ da loja de Carapicuíba, que triplicou vendas em relação ao faturamento do Extra no 18º mês em funcionamento. Essa é a segunda loja em faturamento pra o grupo, ficando atrás somente da do shopping Aricanduva. Em um horizonte da companhia como um todo, o aumento de vendas de três vezes em relação ao Extra deve ser mantido, com três meses para atingir o potencial de vendas, break even no primeiro ano e maturação total no segundo ano. Ao todo, as lojas do Extra devem adicionar 400 mil metros quadrados à área de venda da companhia, principalmente em capitais, regiões metropolitanas ou cidades grandes.
Como um dos principais pontos para avançar e chegar até o horizonte desejado, Gomes ressalta o fato de que o atacarejo consegue ser competitivo no comércio de alimentos, um ponto a favor em relação aos hipermercados, no varejo físico, e ao próprio e-commerce. Tomando como base as 23 lojas convertidas de hipermercados enquanto a companhia ainda estava dentro do GPA, a companhia afirma que a venda bruta das lojas transformadas em atacarejos é três vezes maior: passou de R$ 2,1 bilhões para R$ 6 bilhões.
Além disso, as lojas convertidas são mais rentáveis do que a média das lojas do Assaí. A margem bruta fica em 17,6% (ante 16,7%), os custos gerais e administrativos são de 8,9% (ante 9,5%) e a margem Ebitda é de 9%, ante 7,5%.
“O que derrubou os hipermercados não foram os supermercados. Foram as vendas on-line, que trouxeram maior venda de categorias como linha branca, que eram usualmente vendidas por esses estabelecimentos e ajudam a balancear o ganho de margem das empresas. Com a migração desse consumo para o e-commerce, o aumento de preços se tornou uma realidade e daí o atacarejo ganhou mais espaço”, diz Gomes.
Com base em dados da Nielsen apresentados pela companhia, o atacarejo tem uma participação de mercado de 46,4% — em relação ao total de empresas analisadas pela companhia de análises, e não em relação ao Brasil como um todo — enquanto o supermercado tem 25,5%, o hipermercado tem 19,7% e os comércios de vizinhança têm 8,4%.
Dentro dessa análise, considerando o patamar histórico desde janeiro de 2020, o atacarejo foi o único a crescer. A participação de mercado da categoria era de 37,7% na data, o que dá um ganho de 9 pontos percentuais em dois anos e meio. O impulso, é claro, considera benefícios do próprio modelo em relação ao cenário macroeconômico e o avanço das próprias redes.
Em uma outra análise com base em dados da Nielsen, hoje o modelo de atacarejo representa menos de 20% dos gastos mensais dos brasileiros (mais precisamente, 19,7%). A categoria de bares aparece logo atrás, com 17,9%, e em terceiro lugar, está o supermercado, com 11,2%. Importante destacar que mais de um terço (38,7%) da amostra da Nielsen está em “outros”, ou seja, cujo consumo não foi mapeado pela empresa de pesquisas.
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