Capital: plataforma fundada por brasileiros se coloca como ponte entre países, startups e investidores (Jason Lee/Reuters)
Graziella Valenti
Publicado em 31 de janeiro de 2021 às 17h48.
Enquanto vê suas primeiras investidas germinarem e de olho no agito total no mercado capital semente e de risco, a gestora Capital Lab vai acelerar neste ano seu projeto de ser, mais que um fundo, uma plataforma de fomento ao empreendedorismo e à inovação. Neste formato, é também uma ponte direta entre Brasil, América Latina, Londres e Israel. E o objetivo é que nessa via transitem conhecimento e oportunidades de negócios para empresas, além de apenas recursos.
Fundada em 2016 pela dupla Paulo Mattos e Luigi Cosenza, a casa, que até agora estava mais dedicada ao capital proprietário — e aquilo que o mercado chama de family and friends, ou seja, o dinheiro de conhecidos — está na rua definitivamente aberta a investidores que queiram participar do ecossistema que aprenderam a desvendar ao longo desses quatro anos.
Ser global é uma vocação natural, uma vez que entre os fundadores está Paulo Mattos, que rapidamente também está transformando a iG4 em uma gestora de private equity com atuação e presença em diversos países — e continentes.
Foi para colocar o pé no acelerador que Vanessa Viana, desde 2018 na Inglaterra, chegou na Capital Lab no finzinho do ano passado, depois de atuar como co-fundadora da Bradesco Private Equity. Com 18 anos de experiência em fundos de participações, Vanessa foi para uma temporada de estudos na London School of Economics e por lá ficou.
Em um dos epicentros da inovação e do capital de risco, Vanessa é o entusiasmo em pessoa com as maravilhas da economia de escala vertical que a era da tecnologia proporciona e com a nova forma de avaliar oportunidades. “Não dá para analisar esses novos negócios da mesma forma que avaliámos empresas de tijolos”, comenta, em conversa com o EXAME IN.
A escolha pela terra da Rainha como ponto de partida também tem uma justificativa prática. O capital de risco tem incentivo real por lá. A busca por inovação conta com a participação de um fundo específico do governo britânico, que dá suporte, inclusive, para parte dos prejuízos no caso dos investimentos em inovação. Esse incentivo, além de oportunidades pontuais, cria um ambiente ativo e profícuo.
Entre os objetivos da Capital Lab está a ideia de democratizar o acesso às oportunidades de investimento nesse efervescente mercado. Mas o principal objetivo é a formação de uma comunidade, rica em trocas. A casa também quer, com isso, gerar caminhos para as investidas, quando brasileiras, crescerem fora do país e, quando internacionais, encontrarem formas de atuar no Brasil e na América Latina.
O fundo original Capital Lab Venture I tem atualmente US$ 3,5 milhões sob gestão, o equivalente a quase R$ 20 milhões, investidos em nove negócios, com o décimo a caminho. Mas o céu é o limite nessa nova fase. “O que não muda é que nosso negócio é deep tech, tecnologia vinda da inteligência e da ciência. Esse é nosso DNA. Não é o digital de unir pontas, os match-makers”, explica Vanessa.
A Capital Lab elegeu sete áreas de negócios para buscar oportunidades. O objetivo é estar permanentemente em contato com empreendedores e investidores. Quando surgir um negócio em potencial, ele será oferecido nesse hub aos investidores próximos para que decidam se querem participar da empreitada. Quem colocar dinheiro vai ter flexibilidade para escolher se quer aplicar em uma oportunidade única ou em todas daquele setor. Cada caso, na largada, terá um veículo dedicado de investimento.
No futuro, de acordo com a Vanessa, está planejada a possível migração — voluntária — de todos para o fundo original da casa. Todas as vezes que gerir um aporte, a Capital Lab vai comprometer 2% do total em capital próprio também. Mas a “beleza” dessa estrutura é que não nem um limite para as captações, nem um patrimônio mínimo.
Nesse mundo novo, as definições de setores quase não guardam relação com a antiga forma de organizar e repartir a economia. “Hoje um banco pode muito bem virar uma varejista e uma varejista pode facilmente virar um banco. Essas fronteiras estão borradas”, comenta Vanessa, antes de listar em que setores estão de olho.
A frentes que interessam para negócios envolvem: o futuro da educação; o futuro da mobilidade e das cidades; o futuro do trabalho; e operações que acelerem e modifique varejo e indústria; saúde e biotecnologia; fintechs e ainda oportunidades em segurança e privacidade de dados. Apesar de ter chegado oficialmente na Capital Lab no ano passado, Vanessa vem mapeando oportunidades e conhecimento nesse mercado ao longo dos últimos dois anos — além de contatos, claro. Para cada segmento eleito, já olhou mais de 100 startups.
Na perspectiva da Capital Lab, dados são a nova moeda. E o objetivo é encontrar os negócios e as tecnologias que vão levar o mundo até esse futuro, a essa economia.
Para tornar mais concreta a variedade do espectro da casa vale um “tour” pelo que já está na carteira do fundo original, quase uma maquete do futuro. Lá estão a Founderbeam, uma plataforma semelhante a uma bolsa de negociação de participações em empresas privadas, em fase pré-IPO; a I4sea, de um grupo de brasileiros que desenvolveu um software de gestão portuária com um algoritmo de previsão de marés; a Clorent, um clube de aluguel de roupas; a cada vez mais badalada fintech de crédito pessoal Geru; a fazenda vertical urbana Pink Farm; a Rubicon, uma espécie de Uber do lixo, que conecta origem e destino de resíduos; a SwissDecode, que realiza testes de DNA in-loco para verificação da integridade da cadeia de abastecimento; a Atomic, plataforma que ajuda o produtor rural no planejamento de safra; e por fim uma outra gestora, já bem conhecida, a Valor Capital, que investe em companhias em estágio inicial e também nas já mais maduras.
Vanessa acha quase desnecessário dizer que fatores ESG estão entre os valores casa, pois na verdade permeiam o próprio propósito de cada uma dessas novas companhias que surgem. Mas, sim, essa é uma questão. Aliás, tão importante que, em sua visão, essa nova era da tecnologia e da inovação será capaz de proporcionar mudanças relevantes no futuro da economia do país — e de outras nações em desenvolvimento. “O Brasil pode dar um salto quântico”.