A união das máquinas de varejo ao software: combinação Stone e Linx tem adesão de parte relevante do mercado (Neuwald/Reprodução)
Graziella Valenti
Publicado em 14 de novembro de 2020 às 00h41.
Última atualização em 14 de novembro de 2020 às 01h13.
Só acaba quando termina. Verdade engraçada que ninguém arrisca se opor. Mas, também é fato que a decisão do colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) desta sexta-feira, dia 13, deixou a Stone mais próxima de seu objetivo de conseguir comprar a Linx, por meio de uma incorporação.
Depois de muita polêmica, os sócios fundadores da Linx, Nércio Fernandes, Alberto Menache e Alan Dayon, poderão votar na assembleia de terça-feira sobre a oferta de incorporação da Stone. Os diretores da CVM, por maioria, decidiram que os três podem participar e votar no encontro. Juntos, eles têm 14,3% do capital total da empresa e, mesmo minoritários, fazem — sim! — diferença no resultado.
Com os três, pelas informações conhecidas até agora, a Stone tem detentores de 61,4 milhões de ações a favor de sua oferta — 24,9 milhões de votos à distância, 9,4 milhões da própria Stone e 27,7 milhões dos fundadores da Linx. A proposta da companhia equivalia a 36,54 reais por ação da Linx, no fechamento de sexta-feira — ou 6,54 bilhões de reais por toda a empresa.
Para assegurar a vitória na operação, a Stone precisa garantir pouco mais de 87 milhões de votos favoráveis. Faltam, portanto, 25,6 milhões — o equivalente 13,5% do capital total da companhia de software. Conhecendo também parte dos votos contrários e das abstenções, é possível dizer que a Stone depende que 29% dos votos desconhecidos sejam a favor da operação. Embora todos os envolvidos ainda estejam roendo as unhas, 29% é algo (bastante?) possível considerando que dos boletins de voto à distância, 51% estavam a favor do negócio.
Além das surpresas possíveis da própria votação, o prazo até a assembleia tem 3 dias inteiros. A Totvs — que tenta competir com a Stone pela Linx — pode fazer nesse intervalo quase tudo que não fez até o momento: o que inclui elevar sua proposta até um ponto que deixe os investidores da companhia de software desconfortáveis de aceitar a oferta da empresa de maquininhas fundada por André Street.
A proposta da Totvs estava em 34,4 reais por ação da Linx no fechamento de sexta-feira, o equivalente a 6,16 bilhões de reais. Quando os sócios da Linx levaram a oferta da Stone para ser apreciada em reunião do conselho de administração, em 10 de agosto, não informaram aos membros independentes do colegiado, João Cox e Roger Ingold, que a rival do setor de software também tinha iniciado conversas para fazer sua oferta, após diversas aproximações ao longo de anos.
A proposta, contudo, nem teve tempo de chegar a ser avaliada, pois o trio de fundadores aprovou um acordo de exclusividade com a Stone. A Totvs sequer entregou seu envelope. Toda essa circunstância gerou uma cirânda de mal-estar com o negócio, ainda que logo de cara os investidores tenham gostado bastante do valor estratégico de uma união entre Stone e Linx — e criticado a governança da transação.
A área técnica da CVM havia impedido o trio de sócios fundadores da Linx de votar na assembleia do próximo dia 17. A superintendência do regulador apontou que o contrato de não competição que esses sócios firmaram com a Stone, pelo qual podem receber cerca de 185 milhões de reais, deve ser entendido como um benefício particular — situação na qual a legislação proíbe o voto. Esse extra equivale a um adicional de 20% sobre o que eles podem receber com a venda das ações da companhia.
Os acionistas, porém, recorreram ao colegiado da CVM, que se reuniu ontem extraordinariamente para avaliar o assunto. No encontro, a diretoria decidiu rever o entendimento da área técnica.
O colegiado da CVM não deu muita pinta, em sua decisão, a respeito de como avalia toda a operação e as circunstâncias da transação entre Stone e Linx, ou seja, o conjunto da obra. Mas, foi claro na questão da compreensão sobre benefício particular e conflito de interesses.
O grupo entendeu “não tratar o caso concreto de hipótese de benefício particular (...) e tampouco restar demonstrado, neste momento, conflito de interesses apto a gerar impedimento de voto por parte dos acionistas fundadores da companhia em decorrência da celebração dos contratos de indenização por não concorrência e da proposta de contratação de Menache".
O colegiado não quis nem interferir na operação, nem dar salvo conduto para toda ela. Por isso, no breve resumo de sua decisão acrescentou que não isenta o trio de uma avaliação posterior da CVM sobre a conduta no caso: permitiu o voto, mas "sem prejuízo da verificação a posteriori quanto à regularidade do exercício do direito de voto pelos referidos acionistas, inclusive quanto a se os referidos acionistas, ao exercerem seu direito de voto, teriam privilegiado interesses pessoais em detrimento do interesse social".