Havaianas: queda de 12% nos pares vendidos no Brasil, em função de impacto macro (Kai Hendry/Wikimedia Commons)
Graziella Valenti
Publicado em 9 de fevereiro de 2023 às 19h15.
Última atualização em 9 de fevereiro de 2023 às 19h26.
Custos não programados, despesas extras com baixa de estoques nos Estados Unidos e na China, mais o desafio de acertar a distribuição na Terra do Tio Sam e o cenário doméstico de retração de renda. Para completar, impacto negativo da startup de sapatilhas feitas a partir de PET reciclado, a Rothy’s. Essa combinação está sintetizada na última linha do balanço da Alpargatas (ALPA4), dona da Havainas, no quarto trimestre. A companhia teve prejuízo de R$ 21 milhões no período, ante um lucro líquido de R$ 303 milhões, no mesmo intervalo de 2021. Mesmo considerando só a Havaianas, sem os efeitos da venda da Osklen e da compra da Rothy’s, a foto dos três últimos meses de 2022 está longe de ser a mais bonita do book: o lucro líquido caiu quase pela metade, de R$ 150 milhões para R$ 80,6 milhões.
Roberto Funari, presidente da Alpargatas, contou ao EXAME IN que no Brasil as vendas ainda sentiram o ambiente desafiador de renda, em especial no varejo alimentar, o principal canal do negócio localmente. Houve uma queda de 11% no total de pares vendidos, para 69 milhões, no quarto trimestre, concentrada no Brasil. Ainda assim, a receita líquida do período cresceu 4,7%, para R$ 1,085 bilhão. No Brasil, houve alta de 2,2% na receita líquida, e no mercado internacional, um avanço de 7% — apesar de uma queda de quase 20% nos Estados Unidos e de 37% na China, em função ainda da covid. O mercado europeu, o restante dos países asiáticos e a África avançaram (+1,1%), junto com as vendas via distribuidores (+23%).
Funari contou que, a despeito do quadro desafiador, a companhia começou a ver sinais positivo a partir de dezembro de seus esforços para lidar com a situação. A Alpargatas ampliou os investimentos em mídia e marketing em 24% no quarto trimestre (o valor absoluto não é divulgado), segundo explicou Funari. “Cerca de metade das compras de Havaianas são por impulso. Queremos voltar a estimular esse movimento do consumidor. Em dezembro, vimos expansão de duplo dígito nos canais de venda direta”. O esforço de marketing tem exposição em mídia, mas também investimento no espaço de venda.
O CEO da Alpargatas acredita que 2023 pode mostrar o começo de uma recuperação gradual dos números, apesar de a visibilidade do ano estar complicada.
Funari destacou que a empresa decidiu colocar o foco na conquista de eficiência fabril e no crescimento. “Há um esforço de simplificação grande em andamento, para que possamos colher os frutos dos investimentos em automação e capacidade”, destacou ele. A margem bruta no quarto trimestre caiu de 43,1% para 40,9%, com o impacto causado principalmente pela necessidade de uso incremental de centros de distribuição (foi necessária a contratação de espaço extra) e pela baixa de matérias-primas, em função de prazo de validade. Essas questões comeram 2,6 pontos percentuais da margem no Brasil. No ano, pressionada por custos, a margem caiu de 49,7% para 46,8%.
De acordo com o CEO da empresa, o cenário de pressão de custos está arrefecendo, mas o material utilizado na produção do último trimestre foi com custo elevado de aquisição.
As despesas administrativas totais da companhia aumentaram 26,8%, acima da evolução da receita. Consequência? Queda de 72,3% no Ebitda, que ficou em apenas R$ 47 milhões de outubro a dezembro, com margem de 4,2% — 11,6 pontos percentuais a menos na comparação anual. O quadro trimestral teve uma despesa extraordinária de R$ 67,8 milhões, relacionada à baixa de estoques nos Estados Unidos e na China.
O caminho até o prejuízo do trimestre ainda passa por R$ 17 milhões de efeito negativo da equivalência patrimonial da Rothy’s. A companhia, uma startup dedicada a sapatilhas e com grande foco em ESG e inovação, ainda está em fase de investimento. E, como não poderia faltar, houve um aumento de 168% nas despesas financeiras, que somaram R$ 24 milhões. A companhia não tinha dívida até o fim de 2021 e passou a contar com vencimentos brutos de R$ 1,26 bilhão, após a compra da Rothy’s.
Tudo que o investidor da Alpargatas quer é um ano de colheita. A companhia fez esforços para avançar em seus processos e, ao mesmo tempo, conseguiu ampliar o preço médio por par, o que demonstra a força da marca. Foi isso que permitiu o aumento da receita, apesar da redução no total de pares vendidos. Na média de mercado nacional e internacional, a receita líquida do par teve alta de 15,3%, para R$ 15,9, na comparação entre o quatro trimestre do ano passado e de 2021. Só que essa conquista ainda não foi percebida em todo o balanço. Para que isso chegue na última linha do balanço e, com isso, aos acionistas, é preciso resolver de vez a questão da venda nos Estados Unidos, a reabertura da China, a volta do turismo e redução nos custos.
No acumulado de 2022, a companhia teve receita líquida de R$ 4,12 bilhões, com crescimento de 5,4%. O total de pares comercializados recuou 5%, para 247 milhões. De janeiro a dezembro, o balanço traz lucro líquido de R$ 183,7 milhões. É positivo, mas equivale a uma queda de 72,3%.